Primeiros momentos do governo Trump parecem estar enunciando o início do fim dos tempos
Como as bombas em Gaza, os primeiros momentos do governo Trump parecem estar enunciando o início do fim dos tempos. Parece haver ali uma espécie de demarcação radical, de violenta inflexão para pior, na trajetória de vida que conhecemos.
Exagero? Talvez.
Mas faz lembrar que há algum tempo, a Beatriz Fagundes, da Rádio web Manawa (“a voz da resistência”) já dizia que o calendário Maia poderia, de fato, estar correto, ao apontar 2012 como o fim dos tempos. Naquela leitura o 21/12/2012 não indicaria propriamente o apocalipse, nem apenas o fim do espaço na pedra do calendário maia, mas sim o início imperceptível de uma transição orientada para o caos.
Algo como aquele rufar das asas de um inseto no Brasil (o efeito borboleta) dando origem a uma sucessão de eventos destinados a provocar um furacão terrível, no Texas.
Não sei o que aconteceu na geopolítica internacional no ano de 2012, mas já em 2021 tivemos a consciência sobre o aquecimento global, a invasão do Capitólio nos Estados Unidos (EUA), as mortes da covid (a falta de oxigênio em Manaus) e o Bolsonaro defendendo cloroquina na Organização das Nações Unidas (ONU). E lá em 2022? A Rússia invadiu a Ucrânia, e foram anunciadas aquelas centenas (milhares?) de mortes pelo calor, na Europa e na China, a direita ganhou espaço inusitado na Europa, e por muito pouco não tivemos mais um golpe de estado no Brasil. Seriam sinais?
O fato é que as mudanças seguiram no mesmo rumo e apesar de algumas boas notícias, como as eleições no México, Brasil e Uruguai, entramos em 2025 amassados pelos primeiros atos do presidente psicopata que assumiu controle sobre o exército mais poderoso do planeta.
E precisamos lidar com isso.
As análises, na medida que o comparam a Hitler e a Idi Amim Dadá, sugerem o início de uma espécie de salve-se-quem-puder, onde os abusos permitidos pela generalização da lei do mais forte, poderão levar à normalização do ódio, validando o descaso à ciência e a anulação dos direitos humanos universais.
Como isso repercutirá entre nós? Depende de nós.
Lembrando que alguns golpistas brasileiros se apressaram em convidar Trump, que não reconhece o aquecimento global, para a COP30, vale ler seu discurso de posse. Aliás, cabe destacar aqui alguns dos primeiros anúncios e decretos assinados nos primeiros dias do governo Trump: os migrantes que estão nos EUA, inclusive aqueles nascidos lá, foram ameaçados de expulsão; os bloqueios e a violência nas fronteiras foram ampliados.
Os 1.500 golpistas que invadiram o Capitólio (janeiro 2021) para impedir a posse de Biden foram perdoados.
Os EUA se retiraram do Acordo de Paris, desmontando o mecanismo internacional orientado ao enfrentamento do aquecimento global; além disso, foi anunciada ampliação nos investimentos voltados à exploração e expansão no uso de combustíveis fósseis. Os EUA também anunciaram suspensão de seu apoio financeiro à Organização Mundial da Saúde (OMS) e o cancelamento de todas medidas de apoio e proteção às minorias.
A Rússia foi ameaçada de retaliação, caso mantenha ações militares na Ucrânia.
E além de anunciar interesse em assumir o controle (e até mudar o nome) do Golfo do México, Trump explicitou sua vontade de tomar conta do Panamá, do Canadá e da Groenlândia.
Parece pouco para uma só semana?
O que pensar então de Cuba, da Venezuela e de um Brasil soberano, levando em conta a importância (e o simbolismo) dos papéis ali contidos ou das riquezas da Amazônia e do golfo do México? Afinal, sabemos do poder da indústria das guerras, e não podemos ignorar o anúncio de bilhões de dólares para mecanismos de inteligência artificial destinados a vigiar, a controlar e a capturar corações e mentes de todos os ingênuos e corruptíveis que habitam nesta parte do planeta.
O enredo é tão assustador que já na posse do psicopata, em cerimônia religiosa oficial, a bispa Mariann Edgar Budde, da Diocese Episcopal de Washington, se atreveu a pedir que ele deixasse de ser ele mesmo e que afrouxasse as medidas de terror recém anunciadas. Que se humanizasse, se preocupasse com os desvalidos e passasse a orientar o país em direção à construção de uma era de paz.
Por isso, ela agora está sendo acusada de comunista, com toda a carga que isso carrega naquele ambiente ensandecido.
Corajosa, mesmo sabendo que seria perseguida por isso, ela se posicionou em defesa da vida. E sua atitude brilhou como um farol no escuro.
Ela apontou que a saída do caos, a construção da paz, o bloqueio ao avanço do terror dependerá de nós, e se fará de baixo para cima. Com o protagonismo das mulheres.
Percebo, na linha das conexões que aquele instante se associa, hoje, ao anúncio das indicações oscarizadas do filme Ainda Estamos Aqui, a importância dos pequenos e grandes gestos, do rufar das asas aos chamados à razão. No filme, mais do que a tragédia de Rubens Paiva e do Brasil sob o domínio da ditadura militar, se relata a trajetória heroica de Eunice Paiva. Ali, também a performance de Fernanda Torres toca em almas, merecendo além do Globo de Ouro já recebido, a indicação/premiação do Oscar.
A meu entendimento, estes fatos não deixam espaço para dúvidas.
O amanhã dependerá da reconstrução da amorosidade, em uma luta que se haverá de fazer de baixo para cima, envolvendo todos os tipos de família, na ética do acolhimento. E se vem aí uma espécie de guerra, que descobrirá um período para além do imaginado no calendário asteca ou na ambição imperialista, ele não poderá ser construído apenas pelas mulheres. Afinal, e como anunciam as místicas do MST (e este é o momento em que todxs devemos atentar para isso, em que todxs devemos nos comprometer com isso): quando as mulheres se erguem, homem algum, que se preze, poderá permanecer sentado/calado/acomodado.
Uma música? Rita Lee e Cássia Eller. Hoje, amanhã e sempre: Luz del Fuego.
* Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.
Edição: Vivian Virissimo