Rio Grande do Sul

Coluna

Que saudades do velho Briza

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Exibição do filme 'Brizola, anotações para uma história' - Leonardo Melgarejo
É um desafio comentar um assunto por semana, sem perder o rumo do grande escândalo do momento

Neste país é um desafio e tanto a tentativa de comentar um assunto por semana, sem perder o rumo do grande escândalo do momento.

Como escolher, por exemplo, o que seria relevante de tratar hoje, se antes de concluída avaliação daquele caso inédito, envolvendo o bolsonarista trapalhão kamikaze, que se explodiu em Brasília, e ainda durante as atividades de dimensão global, delineadas no encontro do G20 – com os avanços espetaculares ali anunciados – e de ver declaração oficial, tivemos a escandalosa confirmação do plano para assassinar (por agentes de elite da forças armadas nacionais, com participação de ministros de estado) o então presidente eleito e seu vice, com detalhamento de tocaia preparada para um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) que na ocasião presidia o Supremo Tribunal Eleitoral (STE)?

 E o que pensar das manifestações associadas?

Como deixar passar sem alarde os argumentos de cumplicidade explícita trazidos à tona pela incontinência do filho zero-1 e do próprio Bolsonaro ou antecipados no início deste ano, pelo ex-vice presidente da República?

Eles são legião, eles têm acesso a armas de todo o tipo, e sem dúvida eles estão com medo.

Por isso, diante da certeza de que em tempos de normalidade não escaparão da justiça, eles tendem a se fazer mais e mais perigosos. E nós, dada a lentidão dos tão esperados e sempre protelados indiciamentos e prisões, ficamos amedrontados a tal ponto que, hoje, já somos quase cúmplices. Por baixo, na onda de apatia que nos arrasta, estamos contribuindo para o esvaziamento de conteúdos que deveriam levar milhões às ruas, em atividades de fortalecimento ao governo Lula que, do jeito que pode, está viabilizando a contenção do fascismo.

Assim, diante do empalidecimento das notícias positivas e observando que se reforçam - entre todos - os temores quanto ao que poderá acontecer a seguir, está difícil alinhavar aqui uma visão otimista sobre os acontecimentos. Afinal, os analistas políticos “de peso” estão anunciando que o golpe não acabou (por que o General Braga Neto ainda não foi preso?), que o governo Lula se enfraquece deixando passar oportunidades de ampliar forças e hesitando em reafirmar sua legitima autoridade. Por que Lula não anunciou, em meio àquele belo discurso no encerramento da cúpula do G20, as evidentes conexões entre o bloqueio parlamentar a seu governo e o fato de que seu envenenamento teria sido programado na casa de general candidato a vice-presidente e ex ministro de Bolsonaro?

Especula-se que “em breve” o Procurador Geral da República (PGR) finalmente oferecerá denúncia de crimes da cúpula golpista e que o mito, sendo quem é, derreterá arrastando para a cadeia a coluna vertebral do movimento antidemocrático. Mas também se especula que a tradição fascistóide das forças armadas será preservada, e que com isso, se não agora, em breve, o golpe virá. A limitação dos criminosos imputados a meia dúzia de bois de piranha, que aguentariam no osso confiando que em poucos anos estarão anistiados, garantiria isso.

Nesta moldura, sendo evidente que a sustentação do mecanismo exige a preservação do discurso, parece óbvio que o líder covarde terá que ser silenciado, transformado em mártir, o que nos faz temer por ele. Todos sabem que a imagem dele ajuda tanto quanto sua pessoa atrapalha. Como entre eles não há escrúpulo, será descartado.

Com esta perspectiva creio que, enquanto não for preso, Bolsonaro pai corre risco de morrer de forma esquisita, por acidente, bala ou veneno, como parece já ter ocorrido com Teori Zavascki, Adriano da Nóbrega, Gustavo Bebianno, e sabe-se lá que outros.

E com esta pulga na orelha, de olho na polarização que não para de se agravar no congresso e nas ruas, resta crer que a proteção da democracia, exige a prisão urgente, preventiva que seja, do triplo-i, e seus principais assessores.

É com essa interpretação da realidade, por saber que tanto a covardia como a coragem, contagiam, que precisamos, sem descuidar do que já vivemos, do que já sabemos, olhar para a frente e ir às ruas.

Fazer isso encarando o passado, mas sem se fixar nele, sem fugir das responsabilidades para com a necessidade de construir as alianças e compromissos que permitirão levar o país adiante, em apoio à emancipação humana, à justiça, à paz em vida.

Trago este ponto, com esperança de estar contribuindo para o que precisamos fazer, o filme Brizola, anotações para uma história. Assisti em pré-estreia esta semana (segunda-feira dia, 18), no Theatro São Pedro, e lá decidi que este seria o tema desta coluna que, como se vê, mudou de rumo sem abandonar os princípios.

O filme, mais uma obra da arte de Silvio Tendler, expõe a trajetória de vida que de um gaúcho que veio descalço, ainda guri, de Carazinho, e quase mudou o destino deste país. Fez muito e só não fez mais porque não ajudamos o bastante. Tendler nos  mostra que Leonel passou a vida dando exemplos a respeito da importância de construir avanços, sempre, da forma possível e apesar das circunstâncias.

Por isso, mas não apenas por isso, acredito que aquele documentário ainda será utilizado como elemento de apoio à compreensão da realidade brasileira, naqueles tempos, nos dias atuais e inclusive em piores momentos que virão, se assim o permitirmos.

Nisso aquele filho do Bolsonaro tinha razão. Não se trata mais de “se”, mas sim de “quando” e “como” ocorrerá o enfrentamento. Por hora, e esperamos que assim continue, as definições se darão com respeito à constituição, no Judiciário. Mas se não formos às ruas, isto será permitido até quando?

Uma música? Vou propor um jingle do Leonel Brizola, torcendo que o PDT acorde de vez, expulse os golpistas do seu reduto trabalhista e retome o caminho que ele apontou:

Concluída a coluna desta semana, saiu (agora) a grande notícia, aquela que ofusca as demais: Bolsonaro e mais 36 acabam de ser indiciados pela Polícia Federal. Se a Procuradoria Geral da República (PGR) vai fazer sua parte e quando o fará, passa a ser o tema de amanhã. Hoje, cresce na alma dos brasileiros que acompanharam e entendem a luta de pessoas como Brizola, Arraes, Lula e tanto outros, um mesmo desejo: que estes golpistas sejam recolhidos e aguardem julgamento em cana, protegidos dos bandidos que os cercam e que agora já não precisam mais deles vivos.

Sem anistia. Todos para a rua!!!

* Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.
 

Edição: Vivian Virissimo