O acesso da população negra aos bancos universitários tem crescido nos últimos anos, mas ainda não chegou à sala dos professores. É o que revelam dados do último Censo da Educação Superior, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), analisados pela Fiquem Sabendonesta semana em que o Dia da Consciência Negra – próxima quarta-feira – será feriado nacional pela primeira vez.
As políticas públicas de inclusão, como a reserva de vagas, que ampliaram a presença de estudantes negros no ensino superior, não se reflete de forma significativa no corpo docente. Apenas um em cada cinco professores universitários em exercício se declara preto ou pardo (21%), uma proporção muito baixa quando comparada aos 55,5% de brasileiros que se declaram como pardos ou pretos, conforme o Censo 2022, realizado pelo IBGE.
Especialistas destacam que a falta de professores negros nas universidades reflete a ausência de representatividade em posições de liderança acadêmica, afetando o senso de pertencimento de alunos negros ao dificultar que se identifiquem nesses espaços. A situação é ainda mais grave entre os estudantes autodeclarados pretos: apenas um em cada 24 professores universitários (2,9%) se identifica como preto, conforme o Censo da Educação Superior de 2023, divulgado em outubro. Esse percentual corresponde a menos de um terço da proporção de pretos na população brasileira (10,2%).
O estudo dos resultados do censo pela Fiquem Sabendo expõe um padrão nacional de contratações de professores. Com exceção da região Norte, os quadros docentes no Brasil são majoritariamente formados por autodeclarados brancos, como indica o mapa abaixo.
Os dados do Censo sobre raça e cor dos docentes em exercício em 2023 foram organizados pela Fiquem Sabendo nesta planilha, permitindo desdobramentos das consultas por unidade federativa e município, além de buscas, por exemplo, por tipo de instituição de ensino superior (IES) – universidade, faculdade, instituto ou centro universitário – ou até mesmo pelo nome das IES. Para compreender as siglas do Inep usadas na planilha, recomendamos a leitura do dicionário de variáveis do censo, assim como o leia-me do levantamento.
Um dos recortes possíveis a partir da síntese que disponibilizamos é por tipo de rede de ensino: pública ou privada. Embora se acredite que as instituições federais, por exemplo, apresentam números mais representativos, as distorções permanecem igualmente desafiadoras – e a diferença em relação às instituições privadas ainda é pouco significativa.
Apesar da Lei 12.990/2014 estabelecer a reserva de 20% em concursos públicos federais para candidatos negros, por exemplo, atualmente 3,4% dos professores se autodeclaram pretos e 18,2%, pardos. O quadro docente nas instituições privadas não é muito diferente: 2,4% dos professores se autodeclaram pretos e 18%, pardos. Em outras palavras, docentes que se declaram brancos ainda são maioria, representando mais da metade do magistério em ambas as redes, mesmo considerando os indígenas, orientais (cor amarela) e os casos de raça e cor não informada, como podemos observar no gráfico a seguir.
Os microdados do Censo da Educação Superior, disponibilizados no site do Inep, ainda permitem investigações que abordam questões de gênero, regionalidades e assimetrias entre as estruturas de ensino, evidenciando a importância da divulgação ativa de informações públicas. A escolha por essa base aberta para tratar do tema, portanto, não foi feita por acaso. Hoje, celebramos os 13 anos da sanção da Lei de Acesso à Informação, por Dilma Rousseff, que reforça a transparência ativa como regra. Saiba mais sobre a história da LAI na WikiLAI.
Apesar disso, passada mais de uma década, ainda há resistências e retrocessos na publicidade dos dados – como demonstram algumas decisões recentes do próprio Inep –, que obrigaram a Fiquem Sabendo a recorrer a instâncias judiciais e legislativas desde sua fundação. Na última semana, como destacamos também nesta edição, uma nova lei sancionada por Lula reafirmou a transparência em dados educacionais.
* Fiquem Sabendo é uma organização sem fins lucrativos especializada em transparência publica.
Edição: Taís Seibt