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Documentário sobre a Ilha do Presídio descomemora os 60 anos do golpe militar no Brasil

Filme mostra local no lago Guaíba que serviu para a ditadura prender, torturar e até matar opositores do regime militar

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Viagem à Ilha do Presídio - Reprodução

O Museu das Memórias (In)Possíveis realiza na segunda-feira (4), às 20h30min, a estreia do documentário Viagem à Ilha do Presídio: Ilhas da Memória, Pontos de Luz. É um evento para descomemorar os 60 anos do golpe empresarial-militar-midiático de 1964. A apresentação faz parte de uma série de iniciativas do Museu para deixar marcada o início dos anos de chumbo brasileiros, em que um grande conjunto da sociedade da época obscureceu os rumos do país, tornando-o ditatorial ao extremo, com mortes, prisões aleatórias, perseguições e o fim das liberdades individuais.

O documentário é de Vanessa Solis Pereira, mestra em Educação pela Universidade Federal de Santa Maria, psicanalista membra da Associação Psicanalítica de Porto Alegre (APPOA) e do Instituto APPOA, do Museu das Memórias (In)Possíveis, do Coletivo de Psicanálise de Santa Maria e do Coletivo Testemunhos da Pandemia. Paulo de Tarso Carneiro e Raul Pont, ex-presos políticos, vão conversar com os internautas após a projeção do filme. 

O documentário conta uma incursão planejada pelo Museu das Memórias (𝘐𝘯)Possíveis da Associação Psicanalítica de Porto Alegre (APPOA) à Ilha das Pedras Brancas, também conhecida como Ilha do Presídio, no Guaíba, em setembro de 2022. No período de uma hora até a ilha e no ‘passeio’ pelas ruínas do presídio, Carneiro e Pont contarão sobre as suas amargas experiências de prisão nos anos 70. 

São testemunhos emocionantes sobre o período da ditadura militar brasileira e os dramas e traumas futuros que causaram. A artista Manoela Cavalinho realiza também seu trabalho dos Epigramas, marcando com palavras autocolantes estes mesmos locais tão ricos de memórias. O filme trata, acima de tudo, de um registro histórico/testemunhal sobre tempos muito complicados do Brasil, que, assim como os Epigramas de Manoela, precisam ficar para sempre na memória.

Veja o trailer:

O Museu das Memórias (In)Possíveis promove encontros em todas as primeiras segundas-feiras de cada mês, às 21hs, no formato online. São atividades abertas e gratuitas mediante inscrição. Neste mês de novembro, o encontro será excepcionalmente às 20h30min. Transmissão online pelo site Zoom. As inscrições podem ser feitas pelo e-mail [email protected].

O que é o Museu

O Museu das Memórias (In)Possíveis tem o compromisso ético de furar a história oficial do país que é forjada a partir de uma política do esquecimento. A falta de julgamento dos crimes perpetrados pelos militares na época da ditadura civil-militar faz com que os que sofreram seus crimes (torturas, mortes, desaparecimentos, estupros, sequestro de bebês e crianças de ativistas contrários ao regime) nunca saiam do horror vivido. Ao mesmo tempo em que é como se esses horrores nunca tivessem ocorrido, já que não há inscrição suficiente no espaço público para dar materialidade a tais crimes. Este documentário vem como uma aposta na palavra e na memória. Uma aposta na memória é fazer com que não haja repetições no futuro do que vivemos no passado. Mas é também uma forma de não abandonarmos os que sofreram os crimes hediondos pelas mãos dos militares. Uma forma de dizer que nunca esqueceremos o que sofreram.

A ilha dos horrores

Torturas, fome, frio, ameaças e até mortes caracterizaram a Ilha do Presídio. Ela também é conhecida como a Ilha das Pedras Brancas ou Ilha da Pólvora.  Ela abrigou a quarta casa da pólvora de Porto Alegre. Sua construção teve início em 1857 e foi concluída em 1860. O paiol ali erigido atendia às demandas da cidade e da província e foi utilizado até a década de 1930 pelos militares. Em 1940, o espaço passa a ser administrado pelo Estado, que ali instalou um laboratório de pesquisa animal entre os anos de 1947 e 1948. 

Localizada no lago Guaíba, nos anos 1950 a Ilha foi adaptada para funcionar como um presídio de segurança máxima, recebendo jovens acusados de pequenos delitos, menores de idade e doentes mentais. Com o golpe civil-militar, em 1964, a Ilha foi transformada em um centro de detenção do aparato repressivo, para onde foram enviados dezenas de opositores do regime, os sempre chamados de ‘comunistas’.

Na década de 1970, dezenas de jovens militantes de movimentos estudantis e de organizações clandestinas de resistência à ditadura foram detidos na Ilha do Presídio. Entre os anos de 1965 e 1973, mais de cem cidadãos aí estiveram presos por motivos políticos. A Ilha também foi chamada de Ilha de Alcatraz, para recordar a prisão de segurança máxima que existia na baía de São Francisco, Califórnia, Estados Unidos.

A Ilha possui características ambientais e paisagísticas singulares. Ela diferencia-se das demais ilhas do lago Guaíba, fazendo parte de um conjunto de terrenos cristalinos que testemunham a evolução geológica desta região do Estado, a hidrografia e seu relevo atual. Sua beleza natural contrasta com a solidez da arquitetura de seus prédios, relacionada ao uso militar e à exclusão social.

O conjunto arquitetônico da Ilha do Presídio possui duas edificações principais: o Prédio da Guarda e o Prédio do Presídio. As edificações da Ilha, que passaram por processos construtivos e destrutivos, bem como os vestígios das diferentes ocupações em subsolo, possuem significativo valor arqueológico. Além disso, é possível que o espaço tenha sido ocupado por populações pré-coloniais. Por conta deste relevante potencial arqueológico, a Ilha do Presídio foi registrada como Sítio Arqueológico Histórico junto ao IPHAN. No IPHAE, a Ilha do Presídio está inscrita no Livro Tombo Histórico e também no Livro Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, segundo informações do site POA FilmComission.

Alcatraz

As semelhanças da Ilha do Presídio com a Ilha de Alcatraz são muitas. Só que lá nos EUA cuidaram do espaço e o tornaram turístico. Aqui, o local está jogado, sem preservação e mínimos cuidados, o que é uma grande lástima em razão do seu histórico passado. Alcatraz foi utilizada, no passado, como base militar. Só mais tarde foi convertida em uma prisão de segurança máxima. Atualmente, é um ponto turístico operado pelo National Park Service junto com a Área de Recreação Golden Gate.

Alcatraz foi uma base militar de 1850 a 1930. Posteriormente, foi adquirida pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos, em 12 de outubro de 1933, quando sofreu a conversão. Em 1º de janeiro de 1934, foi reinaugurada como uma Prisão Federal. Durante seus 29 anos de existência, a prisão alojou alguns dos piores criminosos norte-americanos. 

A prisão foi fechada em 21 de março de 1963, menos de um ano após a primeira fuga realizada na prisão. O governo alegou que o complexo foi fechado devido ao seu alto custo de manutenção, e ao fato de que não garantia uma total segurança, em relação às prisões mais modernas. Era mais fácil e mais barato construir uma prisão nova do que melhorar as condições de Alcatraz, segundo conta o site Wikipedia.


Edição: Vivian Virissimo