Um projeto que integra atividades culturais com alfabetização ecológica em um Barco Escola, no rio Gravataí, tem como objetivo ressaltar sobre a importância do mesmo para a comunidade de que dele se abastece. Trata-se do Canções para um Rio Vivo, que teve início no dia 12 de outubro e seque até o final de novembro. As viagens contam com uma intérprete de libras, Dully Gunter, e as apresentações são de artistas locais.
Promovido pela Associação de Preservação da Natureza do Vale do Gravataí (APN-VG), o passeio é gratuito para a comunidade de Gravataí (RS), na região metropolitana de Porto Alegre. Escolas, vizinhos, quilombolas, cooperativa de catadores, são alguns dos públicos alvos do projeto, que conta com uma atração musical em cada passeio.
“O projeto busca aproximar ainda mais pessoas do rio, para ampliar a consciência de sua preservação e contribuir para que a população de Gravataí se orgulhe de sua porção preservada e faça disso um valor e um direito inalienável de todos os seres. A gente só cuida quando aprende a amar e só ama quando conhece”, pontua a professora, cantora e ambientalista Jéssica Nucci, responsável pela direção do projeto.
Já foram feitas quatro viagens com uma boa receptividade tanto pelos participantes quanto pelos artistas e equipe técnica de viagem, comenta a diretora. “A procura tem sido grande e por conta de as viagens serem para público direcionado, muitas vezes não podemos atender a todos. Fica a vontade de ampliar e fazer uma segunda edição”.
Para Jéssica, o mais impactante, na viagem com o barco escola, é sentir cair por terra a visão negativa construída sobre o rio, seja pelas imagens e notícias veiculadas, que colocam bastante peso na porção degradada e na poluição, seja por ignorância e falta de contato. “O rio é lindo. E ele é vivo. Enquanto canto nele, canto PARA ELE, em forma de agradecimento à toda vida que ele sustenta. A começar pela água que a população de Gravataí recebe na torneira (uma das melhores águas captadas e que necessita de muito pouco tratamento). Enfim, cantemos para o rio e para toda natureza”.
Início do projeto
Conforme conta Jéssica a ideia começou a ganhar vida quando ela e seu companheiro Vicente Guindani se mudaram para Gravataí, em 2020, quando se aproximaram da APN-VG, ONG que, este ano, completou 45 anos. “Através do Sérgio Cardoso e do Barco Escola, tivemos a oportunidade de conhecer a história de lutas dessa entidade,. Seu enraizamento na região e além disso, conhecer melhor o rio Gravataí, que tem fama de ser um dos mais poluídos do estado, mas que possui 70% do seu curso e da qualidade de sua água ainda preservados”, diz Jéssica.
O rio passa atrás do sítio do casal, uma área que estão reflorestando e cultivando alimentos através de sistemas agroflorestais. “Fizemos algumas viagens no catamarã da APN-VG (que foi adquirido com patrocínio da Petrobras) e como somos músicos, cantamos nossas canções nessas viagens. Foi muito bom tocar no barco, em meio à natureza, falando sobre regeneração e meio ambiente”, afirma Jéssica.
Segundo explica a ambientalista, quando surgiu o edital municipal da lei Paulo Gustavo, em Gravataí, eles inscreveram o projeto Não tínhamos dúvidas de que era a oportunidade para expandir a ideia, convidando outros músicos para fazer o mesmo, e proporcionar uma viagem diferenciada a um público escolhido a dedo - comunidades vizinhas do rio, quilombolas, cooperativa de catadoras, e quem desejar fazer o passeio”.
Morador de Gravataí há 30 anos, o músico Luiz Inácio de Oliveira, conhecido como Lula Oliveira, participou com algumas formatações na escrita do projeto e também na parte artística. “Fiquei muito feliz do projeto ter passado e ter tido alguma colaboração para que isso tenha acontecido. Fiz uma apresentação juntamente com o cantor Marcos Delfino, a qual nós temos alguns trabalhos, tributo a Cazuza, a Secos e Molhados. E foi minha primeira experiência à beira de um rio, tocando num barco escola”.
Lula espera que o projeto tenha continuidade. “Este projeto vem ao encontro do projeto Rio Limpo, de 2017. É um projeto deveria ter outra edições devido a sua importância, por envolver música e natureza, e pessoas querendo conhecer o rio, o rio Gravataí, a bacia do rio Gravataí, que muitos não conhecem”.
Rio Vivo
O rio Gravataí corta a Região Metropolitana de Porto Alegre, banhando com seus 39 km de curso nove municípios com alto adensamento populacional. Teve parte do seu curso natural canalizado no final da década de 1960 para represamento de água para uso de arrozeiros e é responsável pelo abastecimento de cerca de 600 mil pessoas. É classificado como o quinto rio mais poluído do Brasil pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em lista publicada em 2012, principalmente por conta do esgotamento sanitário lançado no seu trecho final.
Apesar da posição no ranking, tem 70% de suas águas ainda limpas, próximas à região em que é formado, a Área de Proteção Ambiental (APP) do Banhado Grande entre Glorinha, Gravataí, Viamão e Santo Antônio da Patrulha.
Ele abastece metade da população de Gravataí, sem contar os cultivares agrícolas e todo parque industrial sustentado por ele. Também é o meio de vida - em termos de reprodução cultural - de comunidades ribeirinhas, quilombolas e indígenas.
“Ele compõe o imaginário da população e seus movimentos (cheias e secas) dão ritmo à vida de muitos que convivem com ele. E se os rios são o sangue da terra, também são o nosso sangue. Assim como uma medicação na veia, quem sabe, homeopaticamente, viajando de barco, cantando e vibrando pela cura e pela saúde da Terra, possamos nos curar também”, finaliza Jéssica .
“Ele é poluído pela ação do homem em uma determinada região. Se pegasse aquela região e tirasse o que está contaminando, acabaria esta poluição. Mas ali, onde se navega, meu Deus, é um rio muito vivo. É um rio que, quando ele é contemplado, a pessoa sai do passeio de outra forma”, conclui Lula.
O agendamento para o passeio pode ser feito através do WhatsApp da coordenadora do Projeto Jéssica Nucci, 51 9360-9755.
Edição: Vivian Virissimo