Seis de 26 capitais brasileiras terão prefeitos autodeclarados negros, todos homens e pardos, todos de direita. Entre eles está Sebastião Melo de Porto Alegre, considerado pardo como se definiu no registro feito no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) antes das eleições. O estranho do prefeito gaúcho é que Melo se apresentou como branco em todas as eleições anteriores de que participou. A pergunta que não quer calar: branco até um ano atrás e agora pardo? A Folha de S. Paulo deu destaque ao prefeito reeleito de Porto Alegre, considerando-o “negro”.
Por ocasião do registro desta definição racial de Melo, houve críticas da comunidade negra e da Bancada Negra na Assembleia Legislativa. Na época, a deputada estadual Laura Sito (PT), achou um absurdo a alteração da sua identificação autorracial. “Foi incoerência no seu processo histórico”, disse. O deputado estadual Matheus Gomes (PSol) condenou o gesto de Melo, na época, ao afirmar que Melo só destinou “R$ 11 mil para políticas de combate ao racismo. No passado eram R$ 380 mil”, disse.
Também integrante da Bancada Negra, Bruna Rodrigues (PCdoB), autora do projeto Selo de Igualdade Racial, para dar mais oportunidades de emprego na iniciativa privada aos afrodescendentes, criticou a situação. “Incrível tudo isso”, afirmou.
Nas capitais no primeiro turno foram eleitos Tião Bocalom (PL) em Rio Branco, Arthur Henrique (MDB) em Boa Vista e João Henrique Caldas (PL) em Maceió. No segundo turno, venceram Cícero Lucena (PP) em João Pessoa, Sebastião Melo (MDB) em Porto Alegre e David Almeida (Avante) em Manaus. Ou seja, a vitória do negro foi a vitória da direita. O número de seis eleitos é inferior ao da última eleição, quando eram oito negros.
No primeiro turno das eleições municipais 2024, de cada 10 prefeitos que foram eleitos no Brasil, três se autodeclaram negros. De acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) 1.841 candidatos negros foram escolhidos para assumir a cadeira nas prefeituras, sendo 127 pretos e 1.714 pardos.
Conforme a Folha de S. Paulo, o TSE começou a coletar a informação sobre a declaração racial dos candidatos em 2016. Nas eleições municipais de 2024 o triunfo dos prefeitos negros eleitos é fato inédito em mais de 480 cidades. Em 2016, os prefeitos negros eleitos no 1º turno representavam 29% do total. Em 2020 a proporção oscilou três pontos porcentuais para cima. O número voltou a crescer dois pontos nas eleições municipais neste ano.
Mesmo com o avanço das eleições de chefes do executivo local negros, os prefeitos brancos seguem sendo a maioria, representando 65,7% do total. Indígenas e amarelos correspondem por 0,2%, cada um, das vagas.
Direita e extrema direita
Em termos de gênero, homens negros representam 29,1% dos prefeitos eleitos, enquanto mulheres negras ocupam apenas 4,4% das prefeituras. A maioria dos prefeitos negros é afiliada a partidos de “centro” (49,3%), com uma menor presença em partidos de direita (33,8%) e esquerda (16,9%). Ou seja, o identitarismo mostra sua independência total da esquerda. A esmagadora maioria dos negros, 83,9% são da direita ou da extrema direita. Sua vitória apenas fortalece o aparato de repressão que oprime os negros em todo o País.
Este ano também marcou a segunda eleição consecutiva em que candidatos pretos e pardos superaram em número os brancos, representando 52,7% das candidaturas, segundo dados do TSE. Foi também o ano da maior vitória da extrema direita na história das eleições municipais.
Rio Grande do Sul
Mesmo representando 21% da população do RS, segundo o último censo do IBGE, pretos e pardos são minoria muito mais acentuada entre os 492 prefeitos eleitos no estado em 6 de outubro: somente 1,4% dos municípios serão governados por eles a partir de 2025. Duas cidades gaúchas, Vale do Sol e Capela de Santana, terão prefeitos que se autodeclararam pretos no registro de suas candidaturas na Justiça Eleitoral. São, respectivamente, José Valtair dos Santos “Nego”, e Oziel Rangel, ambos do PP.
Candidatos autodeclarados pardos venceram em cinco municípios: em Boqueirão do Leão, foi eleito Paulo Joel Ferreira (MDB); em Dois Irmãos das Missões, Mauro Procópio de Quadros (MDB) venceu em candidatura única; em Machadinho, Sidinei Lopes de Lima, o Sid (PP); em Mariano Moro, Valdecir Mariano Pinto, o Kinkinha (PDT); e em Pinhal, Luiz Carlos Pinto Ribeiro (MDB).
Apesar de pequeno, os números são um pouco maiores que na eleição de 2020, quando candidatos pardos foram eleitos em 0,5% dos municípios e não houve a eleição de nenhum candidato negro. Naquele ano, ainda, um único candidato autodeclarado indígena foi eleito, representando 0,07% dos municípios gaúchos.
Já entre as candidaturas eleitas para o cargo de vereador, a presença de negros e pardos é um pouco maior entre os 4.893 candidatos que assumirão em 2025: 124 deles são pretos, representando 2,53% do total, e 245 são pardos, 5% do total.
Edição: Vivian Virissimo