O Rio Grande do Sul ainda está se recuperando do volume extraordinário de estragos das enchentes/alagamentos de maio/junho. Algumas obras continuam em andamento. Rapidamente ou lentamente, dependendo das necessidades dos locais a serem beneficiados. Na periferia de Porto Alegre é devagar, as obras em bueiros e de contenção de chuvas fortes vão demorar muito tempo. Até agora, por exemplo, foram gastos perto de R$ 45 bilhões de recursos municipais, estaduais e federais para recuperar escolas, hospitais e rodovias, além de ajudas emergenciais à população e a empresas. O dinheiro continua pingando.
A reabertura parcial do Aeroporto Salgado Filho na semana passada em Porto Alegre foi um alívio para a economia do Estado e para quem quer viajar. Houve forte comemoração do setor turístico. Mas a reabertura total acontecerá só no dia 24 de dezembro. Em compensação, o lixo que aflige parte da população das zonas alagadas no norte e sul da cidade, continuará sendo um dilema por muito tempo. Completando quase seis meses após a primeira das 182 mortes pelas chuvas que afetaram a vida de mais de dois milhões de moradores gaúchos, ainda há muitas queixas do atraso de obras.
Ainda há pessoas sem casa e os sistemas contra enchentes não foram sanados. Há muita gente nas ruas. E não só pessoas: milhares de pets estão sem um lar porque não foram adotados, os recursos e os voluntários diminuíram e o prazo de permanência nos atuais abrigos está terminando. Pouca gente está se importando com isso, apenas alguns abnegados. As autoridades estão se afastando, não querem passar por estes locais. As eleições já passaram.
O governo estadual está pagando aluguel social para 8.345 famílias em 52 cidades, e 1.810 pessoas vivem em 40 abrigos de 23 municípios. Mas o total de moradores que nunca voltou para suas casas vai muito além, já que a maioria recorreu a lares de parentes ou se mudou. A prefeitura de Porto Alegre calcula que serão necessárias 20.781 novas casas para quem foi afetado pela elevação das águas do Rio Guaíba, conforme mostra extensa reportagem divulgada pelo O Globo. Nesta terça-feira (29), por exemplo, começaram a ser entregues novas casas pelo governo federal para a população que perdeu tudo em Montenegro.
Dinheiro
Dos quase R$ 100 bilhões de recursos prometidos pela União, já foram pagos R$ 42,3 bilhões. O Estado gastou em obras um total de R$ 2,2 bilhões e Porto Alegre quase R$ 500 milhões. Conforme levantamento do jornal, o governo federal entregou 367 casas, e 224 imóveis foram escolhidos por famílias beneficiárias de um programa de compra assistida dos imóveis. Além disso, há 2.310 apartamentos do Minha Casa, Minha Vida disponíveis para seleção. A meta é a construção de 24,8 mil moradias, inclusive 17,5 mil gratuitas. Prefeituras apontam lentidão no processo, mas a União alega que municípios precisam agilizar laudos e documentações que viabilizam as entregas.
O coordenador do Centro de Apoio Operacional da Ordem Urbanística e Questões Fundiárias do Ministério Público do RS, promotor Claudio Ari Mello, diz que a falta de clareza e definição das responsabilidades do governo federal, do estado e dos municípios estão causando transtornos.
"Foi feito muito pouco. Não existe um sistema interfederativo para enfrentamento a desastres no Brasil, e o Rio Grande do Sul se ressentiu disso", explica.
A comprovação de que há muita lerdeza é destacada pelo fato da falta de harmonia nos projetos entre prefeituras, governo e União. Mello frisa que projetos do Minha Casa, Minha Vida levam em média de três a quatro anos até a entrega. A compra assistida, outra estratégia federal, exige o planejamento e iniciativa das prefeituras, o que tem atrasado as aquisições. Enquanto isso, módulos temporários têm sido uma tentativa de solução por parte do governo estadual.
Prevenção
Nas obras de contenção de chuvas pouca coisa está sendo efetivamente realizada na região metropolitana de Porto Alegre. Toda a região continua dependendo não só da reforma do sistema já existente, mas de novas estruturas em outras cidades, como Eldorado do Sul, que teve 80% do seu território alagado, conforme relata O Globo. No Vale do Taquari, a dificuldade é definir se a geografia local permite um sistema de diques e muros. O governo federal encomendou estudos para essa análise, diz o promotor, que também recomenda a redefinição da responsabilidade por essas proteções:
Doutor em Engenharia Ambiental pelo Instituto de Pesquisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (IPH-Ufrgs), Tiago Luis Gomes explica que fortes chuvas poderiam causar grandes estragos de novo, diante da situação atual dos sistemas de contenção:
"Porto Alegre estaria um pouco mais preparada, mas não imune. Em regiões como o Vale do Taquari, a melhor medida é as pessoas não voltarem para suas casas", disse ao O Globo.
O estudo dos holandeses – especialistas em sistemas de contenção de enchentes – ainda não está totalmente concluído.
Prefeitura da capital espera novos relatórios e os holandeses aguardam ‘comandos’ para agir – ou seja, mais informações e recursos.
O Mercado Público de Porto Alegre – marco histórico da cidade – está no final das obras internas. Outros prédios históricos do centro tocam obras em ritmo lento. O prédio matriz dos Correios e Telégrafos continua fechado. Enfim, nem tudo anda conforme o esperado. Nas ilhas, a aparência ainda é de caos. Nem o Trensurb que continua ainda dependendo de muita coisa para andar do início ao fim da linha.
Edição: Vivian Virissimo