Na última segunda-feira (28), lideranças religiosas de matriz africana se reuniram no Largo do Mercado Público de Pelotas para realizar o 'Alupô Bará', um ato de gratidão e resistência, em resposta à 'virada de chave' no resultado das eleições do último domingo (27). As homenagens começaram na Esquina do Axé, ao lado da prefeitura. O local foi palco para fala de lideranças religiosas e figuras políticas, como a vice-prefeita eleita, Daniela Brizolara (Psol). O ato continuou com uma procissão que foi até a imagem de Bará, no centro do mercado.
O Alupô Bará teve início às 18h, quando diferentes representações dos povos de terreiro se reuniram junto à imagem de Bará. Além de agradecer, a reunião se posicionou como um ato de resistência contra o racismo e a intolerância. As diferentes lideranças religiosas que estiveram presentes realizaram falas em agradecimento ao Orixá. Elas atribuíram à Bará a vitória conquistada no domingo por Fernando Marroni (PT) e sua vice Daniela, que também participou do agradecimento.
Juliano de Oxum, idealizador do desenho que homenageia a entidade, destacou que a reunião se tratava de um ato de “política do povo de terreiro”. Ele também ressaltou que a mudança de governo representa um avanço na conquista de espaço por pessoas negras e periféricas na cidade, representadas por Daniela, a primeira vice-prefeita negra eleita de Pelotas.
Presente no evento, Daniela afirmou que “o respeito é uma necessidade para podermos viver todos em comunhão e com paz”. Ela também reforçou o compromisso do governo em lutar por uma cidade acolhedora e que respeite todas as diferenças, além de lutar pela liberdade religiosa. “Nós queremos uma cidade que faça uma gestão que cuide de todos. Nós queremos poder viver a nossa religião da forma que aprendemos e da forma que nós entendemos que ela é benéfica para todos.”
Outras lideranças religiosas também fizeram suas manifestações. Reinaldo Tillmann, representando a Pastoral Afro, afirmou que o que torna momentos como aquele tão belos é o amor que une as diferentes formas de manifestar a religião. “O amor não é igual. Mas quando a gente une essas diferenças, como estamos fazendo hoje e como fizemos tão belamente na quinta-feira, quando a gente une essas diferenças num ato amoroso, não tem religião melhor do que esse momento. Portanto, isso é sagrado”, encerrou.
O atual presidente do Conselho Municipal do Povo de Terreiro, Pai Rodrigo de Oxum, destacou que a reunião se deu pelo chamado de Bará, a quem foi o grande responsável tanto pela união dos povos que lá estavam, quanto pelo resultado das urnas. Rodrigo também disse que, "independente da chapa que tivesse ganhado, nós estaríamos aqui hoje lutando e brigando contra a intolerância e contra o racismo a favor do nosso Bará, do Bará que é de Pelotas", como reafirmação de que o ato não tinha como motivação questões partidárias. Embora o ato tenha ocorrido após a vitória de Fernando Marroni e Daniela Brizolara, as lideranças afirmaram que ele se pautou em uma tradição de resistência e defesa da liberdade religiosa, e não em questões partidárias.
Após cada um se manifestar, a procissão caminhou pelo largo do mercado e foi até o assentamento do Orixá Bará, quando Mãe Gisa de Oxalá realizou uma chamada invocando o Orixá Bará e pediu licença para que todos entrassem no mercado. Junto ao símbolo, as representações reforçaram mais uma vez a defesa das tradições e da história do povo de terreiro umbandista da cidade. Por fim, Rodrigo ressaltou a importância de ter representantes na Câmara de Vereadores, para formar Políticas Públicas voltadas às religiões de matriz africana.
Como forma de protesto ao ato de intolerância religiosa cometido pelo candidato derrotado Marciano Perondi (PL), uma intensa manifestação tomou o Mercado Público de Pelotas na última quinta-feira (24). Lideranças religiosas acusaram a equipe do bolsonarista de ter removido os redutores de velocidade que protegem o símbolo e categorizaram como uma afronta. Perondi também foi flagrado pisando sobre a homenagem. O ato, apesar de movido pela atitude de um candidato à prefeitura ao final da corrida eleitoral, não tinha objetivos nem influências partidárias, afirmou o Babalorixá Juliano de Oxum.
“O Alupô Bará consolidou-se como um marco na luta contra a intolerância e o racismo, unindo lideranças religiosas e políticas em torno da valorização das religiões de matriz africana em Pelotas.”
Edição: Katia Marko