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Deputado Marcel Van Hattem será investigado pelo Supremo após chamar delegado da PF de ‘bandido’ na Câmara Federal

Parlamentar bolsonarista tem histórico de votações a favor de projetos da extrema-direita

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Marcel Van Hattem - Vinicius Loures / Câmara dos Deputados

O deputado federal da extrema-direita gaúcha Marcel Van Hattem (Novo) sempre falou demais, sempre agrediu demais, tem a língua destravada quando se trata de xingar a esquerda ou alguém que pense diferente. Chegou a chorar no plenário da Câmara Federal nas discussões sobre a enchente do Rio Grande do Sul, afirmando que ninguém estava ajudando as vítimas e pessoas desabrigadas. Uma hora a conta chega e parece que a hora é agora: ele passou a ser investigado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) após declarar que um delegado da Polícia Federal era "bandido". O inquérito, sob relatoria do ministro da Flávio Dino, tramita em sigilo.

Alguns políticos gaúchos o criticam com veemência. Dizem que ele age por impulso ou por premeditação e pura maldade. Mas esta investigação em andamento foi baseada em discurso no plenário da Câmara no dia 14 de agosto, quando ele atacou de todas as formas possíveis o delegado da PF, Fábio Alvarez Shor. O parlamentar diz que o policial atuou ilegalmente para manter preso o ex-assessor internacional de Jair Bolsonaro, Filipe Martins.

Ferrenho bolsonarista e negacionista, Van Hattem acha que os progressistas estão aí só para prejudicar o Brasil e atrasar o país. Agora, ele afirmou que Dino citou em seu relatório a tese de que o deputado teria ultrapassado “as fronteiras da imunidade parlamentar” ao investigá-lo. "A defesa do deputado federal Marcel Van Hattem repudia toda e qualquer tentativa de violação à imunidade parlamentar, que é garantia constitucional. Trata-se de garantia do Estado de Direito e não apenas de direito do parlamentar. A tribuna livre e soberana é a expressão mais sincera de um mandato", diz o advogado do parlamentar, Alexandre Wunderlich, em nota.

"Estabelecer limites a essa garantia constitucional é tentar calar o parlamento, é sobrepor o arbítrio à expressão livre e democrática, não raras vezes por mera conveniência política", acrescentou em reportagem publicada pelo O Globo. Na matéria, Van Hattem acrescenta:

"O ministro diz que estaria cometendo crime contra a honra ao chamar um covarde de covarde. Um bandido de bandido. Porque é isso o que o policial é ao atuar à margem da lei; Fábio Alvarez Shor, que cria, sim, relatórios fraudulentos para manter preso Filipe Martins ilegalmente". 

Filipe Martins foi preso na operação Tempus Veritatis, deflagrada pela PF no dia 8 de fevereiro e teve como um dos alvos o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O nome da ação é do latim e significa “tempo da verdade”. Segundo a corporação, faz “alusão ao esclarecimento de fatos que vieram à luz no decorrer das investigações” sobre a suposta tentativa de golpe de Estado. Ainda de acordo com a PF, o nome da operação também é em referência à suposta tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito com o objetivo de “obter vantagem de natureza política com a manutenção do então presidente da República no poder”. 

A prisão foi revogada em 9 de agosto pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF. Ele foi ex-assessor para assuntos internacionais de Jair Bolsonaro. A soltura havia sido pedida pela Procuradoria-Geral da União (PGR), que apontou a inexistência de motivos para a manutenção da prisão. 

Carreira

Agora, é esperar o que vai acontecer com o destempero verbal frequente do deputado. Ele exerce atualmente o seu segundo mandato de deputado federal pelo RS. Marcel Van Hattem é aliado e alinhado radicalmente com qualquer coisa que Bolsonaro diga. Pode ser o maior absurdo. Com 38 anos, ele se diz jornalista, mas não sabe que qualquer informação tem dois lados. Para ele, o único lado é o lado bolsonarista, conservador, moralista, retrógrado. Também consta no seu currículo o título de cientista social.

Ele nasceu em Dois Irmãos em 8 de novembro de 1985. Tem formação na Universidade de Leiden da Holanda, Universidade de Aarhus da Dinamarca e Universidade Federal do Rio Grande do Sul em Porto Alegre. Os pais são de origem holandesa/alemã, Rintje van Hattem e Denise Marx Flor van Hattem. Exerce o seu segundo mandato federal, com votações extraordinárias: 349.855 em 2018 e 256.913 em 2022. Perdeu quase 100 mil votos de uma eleição para outra.

Originário da Serra Gaúcha, onde faz sempre boas votações, Van Hattem obteve, por exemplo, 10 mil votos só na cidade turística de Gramado, que tem um colégio eleitoral de 35 mil pessoas. Um absurdo. Antes de ser deputado federal, ele foi vereador em Dois Irmãos e três vezes deputado estadual. Foi do PP e depois entrou no Novo, onde ganhou apoio de empresários, liberais e da classe dominante em geral. Seguidamente é convidado para palestrar em eventos empresariais, onde prega políticas conservadoras, estado mínimo, fim de certos benefícios sociais e espalha fakes sobre coisas que o governo Lula jamais pensou em fazer.

Na sua atuação como deputado estadual, apresentou e apoiou projetos que obrigam presos a pagar a sua estadia no sistema prisional; escola sem partido; transparência em anúncios e editais de executivos e estatais; proibição de criação de novas estatais, entre outros. 

Como deputado federal, foi líder do Novo em 2019 e vice-líder em 2021. Desde 2019, Van Hattem é vice-presidente da Frente Parlamentar em Defesa da Prisão após Condenação em Segunda Instância. Em 2019, junto com o PSL, o Partido Novo era o que mais votava de acordo com as orientação de Bolsonaro. Van Hattem, à época, havia se aproximado da base do governo através de Eduardo Bolsonaro, filho do presidente e também deputado federal. Depois de um churrasco com o colega, Van Hattem declarou ter "muito em comum" com Bolsonaro e era encarado com um "líder informal" do governo. 

Em seu mandato na Câmara, Marcel cronologicamente votou a favor da MP 867 que altera o Código Florestal e anistia desmatadores; contra criminalizar responsáveis por rompimento de barragens; a favor da PEC da Reforma da Previdência e contra excluir os professores nas regras da Previdência; a favor da MP da Liberdade Econômica; contra Alteração no Fundo Eleitoral; contra aumento do Fundo Partidário; a favor de cobrança de bagagem por companhias aéreas; a favor do PL 3723 que regulamenta a prática de atiradores e caçadores; a favor do "Pacote Anti-crime" de Sérgio Moro; a favor do Novo Marco Legal do Saneamento; contra redução do Fundo Eleitoral; contra a ajuda financeira aos estados durante a pandemia de Covid-19; contra o Contrato Verde e Amarelo; a favor da MP 910 (conhecida como MP da Grilagem); a favor da flexibilização de regras trabalhistas durante a pandemia; a favor do congelamento do salário dos servidores; contra a anistia da dívida das igrejas; contra a convocação de uma Convenção Interamericana contra o Racismo; duas vezes a favor de destinar verbas do novo Fundeb para escolas ligadas às igrejas; a favor da autonomia do Banco Central; contra a manutenção da prisão do deputado bolsonarista Daniel Silveira (PSL/RJ); contra a validação da PEC da Imunidade Parlamentar; a favor da PEC Emergencial (que trata do retorno do auxílio emergencial por mais três meses e com valor mais baixo); a favor que empresas possam comprar vacinas da Covid-19 sem doar ao SUS; a favor de classificar a educação como "serviço essencial" (possibilitando o retorno das aulas presenciais durante a pandemia); a favor de acabar com o Licenciamento Ambiental para diversas atividades. Marcel esteve ausente na votação sobre suspensão do mandato do deputado Wilson Santiago (PTB/PB), acusado de corrupção, entre tantos outros. 

Atualmente, o deputado é um dos maiores defensores do impeachment do ministro do STF, Alexandre de Moraes.

Controvérsias

Em setembro de 2014, Van Hattem fazia campanha para deputado estadual no Parque da Redenção, em Porto Alegre, quando viu a candidata a deputada federal Maria do Rosário, também em campanha e, com um megafone, passou a atacá-la, aos gritos, acusando-a de "defender bandidos". Maria se afastou, enquanto alguns apoiadores seus discutiram com Marcel, que depois registrou um boletim de ocorrência na Polícia Civil alegando ter sido chamado de "gurizote mimado", "fascista" e "filhote da ditadura". O vídeo do incidente foi gravado por um assessor do candidato e depois compartilhado em redes sociais. 

Acidente de trânsito

Marcel van Hattem responde processo em virtude de ter sido autor de um atropelamento ocorrido em 9 de outubro de 2006, que resultou na morte do chapeador Adair Wiest sobre a BR 116, no município de Ivoti. A vítima não morreu no local, porém faleceu após sete meses em estado de coma no hospital em virtude do atropelamento. A ação em questão visa o recebimento de uma indenização por parte da família do falecido, e tramita sob o número 0023131-54.2008.8.21.0166 no site do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul.

De acordo com o advogado da família, caso o processo seja julgado procedente o montante indenizatório poderia ser milionário. Na ocasião do atropelamento, como não houve óbito imediato, o inquérito policial enquadrou o motorista por lesões corporais leves. Antes da morte de Adair, o Ministério Público chegou a ingressar com uma ação criminal contra Van Hattem no Juizado Especial Criminal, entretanto a ação acabou prescrevendo após um prazo de cinco anos sem que houvesse julgamento de mérito e o caso foi arquivado. 

O tema voltou a público no ano de 2015, quando o deputado Marcel passou a integrar a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do RS. Naquela oportunidade a família da vítima procurou aquela comissão para queixar-se de um suposto descaso policial que teria levado à prescrição do processo criminal. O advogado da família afirma que, diante do fato de Adair Wiest ter passado sete meses em coma antes do óbito, o inquérito enquadrou o motorista apenas por lesão corporal resultando em um prazo prescricional bastante reduzido, ao passo que se o enquadramento fosse por homicídio, a prescrição ocorreria somente após 20 anos.

* Eugênio Bortolon é jornalista.

** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.


Edição: Vivian Virissimo