Rio Grande do Sul

Eleições 2024

Descrença na política está entre as razões de quem não votou no primeiro turno 

Candidatos apelam para eleitores para evitar alta abstenção no segundo turno

Brasil De Fato | Porto Alegre (RS) |
Rosário e Melo vão se enfrentar novamente em 27 de outubro - Foto: Divulgação

Os candidatos do segundo turno em Porto Alegre, Maria do Rosário e Sebastião Melo, estão preocupados com as alianças e os apoios para ganhar a eleição. Mas, bem mais que isso, não cansam de apelar para o voto de quem não votou no primeiro turno, ou votou em branco ou nulo. Aí pode estar a luz no fim do túnel para uma vitória e para o comando da Capital nos próximos quatro anos: a soma destes três itens eleitorais chegou a 401.935, bem mais que os 345.420 votos obtidos por Sebastião Melo. Mesmo fenômeno aconteceu em Pelotas e Canoas. Mais gente não votou em ninguém ou nem apareceu do que os candidatos com mais votos.

Em Canoas, o primeiro lugar ficou com o candidato Airton (PL), que fez 51.472 votos. O segundo lugar, com Jairo Jorge (PSD), que obteve 43.442 votos. A soma do primeiro e do segundo lugar ficou em 94.014 e o número de "não votos" (abstenção, brancos e nulos) foi maior que o total de votos recebido pelos dois candidatos que estão no segundo turno, totalizando 113.599 pessoas que não destinaram o voto a nenhum dos candidatos. Em Pelotas, Fernando Marroni (PT) pontuou 68.443 votos e os pelotenses que não destinaram voto a nenhum candidato somam 75.786 pessoas.

A cientista social Elis Radmann, em artigo no ColetivaNet, pontuou que há muito desinteresse pela política e também muita decepção com os políticos, “que só atuam em causa própria”. Ela cita também o APP da Justiça Eleitoral, um facilitador para os descrentes da política. “Afinal é mais fácil justificar a ausência, basta ter o e-título e estar em outra cidade no dia votação”. Ela cita também as candidaturas que não animam os eleitores, as figurinhas repetidas e as mudanças das seções eleitorais.

Falta de confiança

No prédio onde moro, duas pessoas que não foram votar justificaram com desculpas esfarrapadas. “Não tenho saco. Os candidatos são uma porcaria”, me disse um eles. O outro alegou que está decepcionado e prefere ficar em casa a referendar alguém para ser prefeito. “São todos vinhos da mesma pipa. Sem nenhum ingrediente positivo, muito mentirosos, prometem mais do que podem fazer”, afirmou outro.

Porto Alegre foi a maior entre as capitais brasileiras a segunda maior na história da cidade. Ficou apenas atrás do índice de 2020, quando o país cogitou adiar o pleito em razão da pandemia da covid-19. Sem o isolamento social imposto pelo coronavírus, os 31,51% registrados no primeiro turno de 2024 ficaram muito próximos dos 33,08% de 2020, e muito acima do índice verificado em todo o Brasil, de 21,7%.

O jornal eletrônico Matinal consultou, por exemplo, várias pessoas no Centro Histórico e constatou que a enchente aparece pouco como fator decisivo entre os que não foram votar e formam o exército da abstenção. A grande maioria disse que há um desencanto geral com a política. Igor Felipe Lessa Saldanha, 34 anos, disse que deixou de votar pela primeira vez no dia 6 de outubro. Ex-candidato a vereador pelo Solidariedade, em 2020, se diz decepcionado com a política após a crise vivida na capital gaúcha. Mesmo assim, afirmou que vai votar no segundo turno.

Descrença

Luísa Franco, vendedora, também disse para o Matinal que está descrente com a política. Mora no Sarandi, uma das áreas mais afetadas pelas águas, votou apenas uma vez, gesto que não pretende repetir por não acreditar nos candidatos. As falas bem construídas na televisão, nos jornais e nas campanhas são “lindas”, diz, o que nem sempre é refletido nos resultados após o período eleitoral. “Na hora do ‘vamos ver’, o que eles fazem?”, questiona.

Ao Brasil de Fato, Luís Gonçalves, que vive nas ruas de Porto Alegre, ficou em abrigo durante quase dois meses na enchente de maio e pensou em votar, já que está com o título em ordem. “Fui bombardeado por muita gente, me pressionando ou ameaçando com corte de ajuda se votasse em A ou B. Resolvi não ir para não desagradar. Não é fácil matar um leão por dia e ainda sofrer para ir votar neste ou naquele. Na verdade, não acredito em ninguém.”

Carlos Paes, também em situação de rua, morador na esquina Cristóvão Colombo com Benjamin Constant, disse ao Brasil de Fato que não vota porque até hoje já lhe prometeram mundos e fundos e ninguém, depois das eleições, o procurou para ajudá-lo a sair da rua. “Nem aluguel social consegui”, disse.


Edição: Vivian Virissimo