Rio Grande do Sul

ELEIÇÕES 2024

Dezessete vereadores que extinguiram o Departamento de Esgotos Pluviais (DEP) estão pedindo votos nas eleições 2024

Maioria na Câmara Municipal, eles selaram o fim do departamento que protegia a cidade contra as inundações em 2017

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Rio Grande do Sul registrou a maior tragédia com enchentes em termos de extensão já ocorrida no país - Jorge Leão / Brasil de Fato

Dezessete vereadores e vereadoras que votaram pela extinção do Departamento de Esgotos Pluviais (DEP), decisão que, segundo especialistas, teria agravado o colapso de Porto Alegre na enchente de maio, são candidatos em 2024. Deles, 15 concorrem à reeleição, enquanto dois buscam as cadeiras de prefeito e vice-prefeito.

Os que ambicionam postos mais altos são Felipe Camozzato, que concorre a prefeito pelo Novo, e Thiago Duarte, do União Brasil, que disputa como vice-prefeito na chapa de Juliana Brizola (PDT), composição que também conta com o PSDB do governador Eduardo Leite

Perseguindo a reeleição para a Câmara de Vereadores estão Paulo Brum (PODE), Professor Wambert (PRD), Luciano Marcantônio (PODE), José Freitas (Republicanos), Marília Fidell (PODE), Airto Ferronato (PSB) Paulinho Motorista (União Brasil), Idenir Cecchin (MDB), Matheus Ayres (PP), Cassiá Carpes (Cidadania), Monica Leal (PP), Mendes Ribeiro (MDB), Mauro Pinheiro (PP) e Cláudio Janta (Solidariedade).  

Votos para acabar com o DEP vieram de apoiadores de Marchezan e Melo 

Daqueles que votaram pelo fim do DEP, deixaram de concorrer Álvaro Araújo (PSDB), Rodrigo Maroni (PR), Reginaldo Pujol (DEM), José Carlos Nedel (PP), Alvoni Medina (Republicanos), André Carus (MDB), Cássio Trogildo (PTB) e Válter Nagelstein (MDB). Este último não compete mas indicou sua esposa, Déia Nagelstein (Republicanos), em seu lugar. 

Dois vereadores, Tarcísio Flecha Negra (PSD) e Mauro Zacher (PDT), faleceram. Ao todo, a desaparição do departamento recebeu 27 votos favoráveis. 

O DEP foi extinto em 2017 na gestão de Nelson Marchezan (PSDB) contando com os votos dos partidos e vereadores que, na gestão seguinte, a de Sebastião Melo (MDB), passaram a apoiá-lo. 

As funções do departamento foram repassadas ao Departamento Municipal de Água e Esgotos (DMAE).  Como o DMAE – hoje sob risco de privatização - não tinha condições de assumir plenamente os novos encargos, parte deles foi terceirizada. A manutenção do sistema anticheias, por exemplo, acabou entregue à uma empresa privada, a Bombas Sinos. 

“Garantir a limpeza dos bueiros”

Até então, cabia ao DEP a operação e manutenção do sistema de proteção contra inundações, ou seja, diques, comportas e casas de bombas, a reconstrução das redes pluviais avariadas, o hidrojateamento que desentope as redes em caso de assoreamento, a solução de problemas de drenagem, a recuperação das 75 mil bocas-de-lobo, cruciais para o escoamento da água da chuva, a limpeza das galerias pluviais com remoção da sedimentação e retirada de lixo e de outros resíduos, a dragagem dos 27 arroios do município de Porto Alegre que, somados, atingem 60 quilômetros, e que devem ser dragados a cada dois anos.

O baluarte tecnológico da capital contra as cheias deixou de existir no dia 12 de julho de 2017, quando foi votado e aprovado o PLC 05-017 . Na sessão da Câmara de Vereadores que selou a sorte do DEP, quem mais falou em favor do desenlace foram o diretor-geral do DMAE, Maurício Loss, e seu diretor-adjunto, Darcy Nunes dos Santos. Os vereadores da situação pouco se manifestaram.

As bancadas mais ativas contra a desaparição do DEP foram as do PT e do PSOL. A então vereadora Fernanda Melchionna, do PSOL, reclamou: “Estão extinguindo o DEP, gente, o DEP! Que tem que funcionar, obviamente, para resolver o problema da cidade, garantir a limpeza dos bueiros, etc. Tem que ter investimento!”. Engenheiro Comassetto, do PT, acompanhou: “Nós concordamos em tornar eficiente a estrutura pública, mas o DEP é uma das menores estruturas existentes no município de Porto Alegre, que trabalha na ponta e faz um trabalho fundamental”. 

“Um retrocesso técnico que tenderá à deteriorização dos serviços”

Roberto Robaina, do PSOL, advertiu que o DEP já estava sendo sucateado “e com a sua extinção – na prática é disso que nós estamos falando: a extinção formal e real do departamento – nós vamos ter uma precarização e uma desorganização ainda maior do serviço”. 

Sofia Cavedon, do PT, avisou que “estamos cada vez mais afrouxando, retrocedendo em marcos históricos, em marcos que são da nossa cidade, que inscreveram a cidade no mundo. A democracia não merece isso e a capital dos gaúchos também não”.

Na semana seguinte à erradicação do DEP, o professor do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da UFRGS, Carlos Tucci, deixou seu prognóstico registrado em texto publicado na internet. 

Com doutorado em recursos hídricos no exterior, recordou que se tratava de “uma das primeiras instituições de drenagem urbana do mundo”. Definiu a extinção como “um retrocesso técnico que provavelmente tenderá à deteriorização destes serviços ao longo do tempo ou a prejuízos já que tudo tem um preço em serviços”.   

DEP pode ressurgir

O DEP foi muito lembrado em maio deste ano quando as águas afogaram o Centro Histórico e bairros como Sarandi, Humaitá, Guarujá, Ipanema, Cidade Baixa, Navegantes e Menino Deus. Agora, na campanha eleitoral, o DEP retornou ao debate. A candidata Maria do Rosário (PT) afirmou diversas vezes que pretende recriar o DEP ou uma estrutura semelhante para fazer frente à ameaça das cheias. 

Através de e-mail, Brasil de Fato RS procurou anteriormente todos os vereadores citados e que hoje disputam a eleição ou outro cargo. Pediu-lhes para avaliar sobre a correção ou não de seu voto após a catástrofe que se abateu sobre Porto Alegre.

De todos, apenas um, Airto Ferronato, respondeu. Disse que sempre foi um defensor do DEP e que considerava seu trabalho relevante e necessário mas que acabou votando pela extinção devido ao fato de que o PLC 05-017 – que determinava a absorção do DEP pelo DMAE – estava inserido em uma “ampla reforma administrativa” do governo que iniciava e que visava, segundo o prefeito, “desburocratizar e facilitar o acesso do cidadão ao serviço público”.

Adeli Sell, do PT, se equivocou na hora do “Sim” ou “Não” e tentou trocar o voto. Mas o presidente da Câmara, Cassio Trogildo, do PTB, negou-lhe essa possibilidade, permitindo-lhe apenas deixar registrada sua manifestação contrária. É o que consta da ata da sessão de 12 de julho de 2017.


Edição: Vivian Virissimo