A saúde de José Pepe Mujica não está nada bem. Principal político do Uruguai e um dos democratas mais respeitados em todo o mundo, ele está internado desde sexta-feira (6) pela quarta vez nas últimas semanas. O câncer no esôfago, anunciado no final de abril, não dá trégua e vem consumindo as energias do velho ex-presidente de 89 anos e um dos principais patrimônios intelectuais, morais e éticos da Frente Ampla, principal articulação política para vencer as eleições presidenciais de 27 de outubro no país.
Ele está fraco, não consegue mais realizar movimentos básicos e nem se alimentar direito. Mujica estava em um hospital de Montevidéu neste fim de semana para ser hidratado por via intravenosa, já que não estava conseguindo ingerir líquidos em condições ideais para reagir. Segundo a médica pessoal de Mujica, Raquel Pannone, o ex-presidente tem fibrose no esôfago como resultado do tratamento de radioterapia que está realizando, complicando a sua alimentação normal.
Nos exames realizados no dia 27 de agosto, Pannone chegou a afirmar “que temos fortes convicções de que o câncer foi curado porque os exames não mostraram evidências do tumor, o que sugere que ele está evoluindo positivamente ao tratamento”. A médica, naquela oportunidade, havia ressaltado que a fragilidade de Mujica era evidente, a recuperação é lenta, mas animadora, apesar da insuficiência renal e de uma vasculite. Mas as coisas não são bem assim quando se trata de um tumor maligno em região delicada. O que está bom hoje, pode piorar repentinamente.
Naquele 27 de agosto, Mujica – também um ex-guerrilheiro tupamaro e que, por suas convicções políticas ficou preso quase 15 anos, dos quais sete incomunicável – saiu do hospital e foi logo para um evento político de ingresso de Blanca Rodríguez na Frente Ampla. Jornalista há 34 anos e apresentadora de um dos noticiosos mais importantes do Uruguai, além de professora de literatura, Blanca será uma das candidatas ao Senado da lista 609 (ala da Frente Ampla que reúne ex-tupamaros).
Ele falou, no ato, com voz arrastada e lentidão, sobre a oportunidade de Rodríguez ingressar na Frente Ampla. “Essa chance que se dá, nós buscamos. Procuramos para a Frente, buscamos para o tempo que está por vir. Tenho consciência de que pertenço a uma geração que está partindo. Pertenço ao adeus. A luta continua, tem que sobreviver. Blanca servirá para enriquecer o Senado, de que tanto necessita, com a sua linguagem limpa e polida, com o seu feminismo autêntico e sem grosserias – afirmou na ocasião.
Agora, segundo a médica informou no final de semana, a situação é de estagnação. Ela destacou que Mujica perdeu peso e teve uma diminuição na massa muscular. “O ex-presidente está confiante, acredita na vida, está perfeitamente lúcido, mas sempre nos lembra que ‘está raspando a ficha’”. Em declarações em agosto ao jornal americano The New York Times, o ex-presidente, que governou o Uruguai de 2010 a 2015, disse que a radioterapia contra o câncer de esôfago foi considerada um sucesso, mas que também se sente “destruído” e “perdendo” a vida.
Disputa presidencial
As eleições terão três candidatos para substituir Luís Lacalle, atual presidente: Álvaro Delgado, Yamandú Orsi e Andrés Ojeda. Delgado, do Partido Nacional (Blanco), é o candidato que representa a continuidade do governo atual. Do lado da oposição, Yamandú Orsi, candidato da Frente Ampla e membro do Movimento de Participação Popular (MPP) de Mujica, é professor de história e firmou sua posição como dirigente ao ser eleito Intendente de Canelones em 2015 e reafirmou sua liderança ao ser reeleito em 2020. Andrés Ojeda, do Partido Colorado, representa uma nova geração de políticos. Advogado e figura midiática, busca revitalizar o partido, embora careça de experiência política significativa.
O primeiro turno das eleições será no dia 27 de outubro. Nesta data serão eleitos o presidente e o vice-presidente, além das 30 cadeiras no Senado e 99 na Câmara dos Deputados. Se nenhuma chapa presidencial obtiver mais de 50% dos votos expressos, haverá segundo turno em 24 de novembro. Em ambos os casos o voto é secreto e obrigatório para os uruguaios maiores de 18 anos.
Questões ambientais, sociais, econômicas e de segurança estão no centro dos debates. O Uruguai, com sua forte tradição democrática e de defesa dos direitos humanos, mesmo com os erros do passado, tem forte orgulho de manter conquistas sociais, mesmo diante das divergências ideológicas e mudanças de governo.
Nas últimas pesquisas, a disputa se mostra emparelhada entre dois candidatos. Orsi lidera com 50% das intenções de voto, seguido por Delgado com 46%. O candidato colorado não tem mais chances, mas segue na luta para reinventar o partido.
Se eleita, a Frente Ampla pode reposicionar o Uruguai como um líder regional em direitos humanos e políticas progressistas, consolidando o país como um exemplo de democracia sólida e inovadora na América do Sul.
* Com informações da AFP, La Nacion, El País e Focus.
Edição: Katia Marko