Rio Grande do Sul

Crise Climática

Enchente RS: crise governamental ou climática? 

'Os atingidos precisam não apenas de unidades habitacionais, mas de reassentamentos com moradias seguras'

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Para os moradores do bairro das Indústrias, a melhor alternativa foi abandonar a casa em que viviam - Foto: Theo Tajes

Desde junho do ano passado o território gaúcho vem sendo afetado por intensos eventos climáticos, como os ciclones extratropicais e as enchentes de setembro e novembro, que atingiram a região do Vale do Taquari. Quatro meses se passaram e o estado voltou a ser atingido, desta vez superando a enchente de 1941, tornando-se o maior desastre ambiental e socioeconômico já registrado na história. 

A atingida climática Kelly Borba, 30 anos, opina sobre o que possivelmente poderia ter causado as grandes enchentes: “A culpa é da natureza, né? Porque antigamente dava essas enchentes, mas não que nem agora”, comenta a moradora de Arroio do Meio, que precisou deixar a casa em que vivia por conta dos riscos de novas inundações. Ela morava há 12 anos no bairro Navegantes, uma comunidade ribeirinha conhecida pelos festejos da Igreja Nossa Senhora dos Navegantes e pela Casa do Peixe, um restaurante local. Ambos os espaços foram duramente destruídos. 


Kelly e Marcelo dentro da moradia provisória que atualmente ocupam / Foto:Theo Tajes

Outra arroionense que tem pensado algo parecido em relação ao assunto é Giovanna Scheeren, de 21 anos. “Eu acho que a culpa é um pouco de cada um... Deus, a natureza, o governo. Acho que vai parelho a divisão de culpa”, diz ela que apesar de morar em um ponto alto da cidade, no bairro Aimoré, ficou uma noite ilhada no celeiro com os três filhos pequenos.

O que Giovanna e Kelly atrelam a natureza está diretamente ligado à proporção que o ocorrido tomou, fazendo o rio Taquari chegar a cota de 31,2 metros. A natureza não pegou leve nessa última enchente, dando inclusive a impressão de que nada e nem ninguém poderia escapar da cheia. Segundo o doutor em Ciências na área de Ecologia de Paisagem e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Rualdo Menegat, uma das explicações para o desastre climático também está no aumento da temperatura média global. 


Criando três filhos, Giovanna revela que desde a enchente de maio tem passado por situações de insegurança alimentar / Foto: Theo Tajes

O aquecimento global, deixa de ser apenas aquilo que vimos nas séries do Discovery Planet ou pelos demais programas de aventura e passa a ser levado para os noticiários e a ser discutido na mesa de casa. “A indústria, principalmente aquelas que são sustentadas pela queima do carvão, tem colocado gases na atmosfera que contribui para o aquecimento do planeta.”

Aprofundando no tema, Rualdo revela alguns dados: “O planeta está aquecido hoje em 1,5°C a mais do que em 1875, data de referência, também início da revolução industrial. O IPCC calcula para os próximos 30 anos que haverá um aumento de até 20% da frequência e intensidade. Isso quer dizer que lá por 2050 e 2070, esperamos o aumento da frequência desses eventos e de sua intensidade. Quanto mais quente ficar o planeta, mais evapora as águas e mais atmosfera também dilata e acaba acumulando água e mais intensa serão as chuvas”, explica o geólogo.


Interessado pelo território gaúcho, o professor de Geologia Rualdo Menegat foi quem criou o Atlas Ambiental de Porto Alegre, no final da década de 80 / Foto: Jenifer Tainá

O professor conta que as grandes chuvas de 2023 nas cabeceiras do Taquari-Antas aumentaram o nível de todo o rio. Nessas duas enchentes do ano passado, a qualidade da água era mais leve, fazendo com que a água contornasse as casas. Bem diferente de maio. Era tanta água que não cabia dentro do espaço que o rio sempre ocupou. “No evento de 2024 houve uma importante modificação. A quantidade de chuva foi muito maior na região. E com essa quantidade de chuva, ao mesmo tempo que a água escoou, subindo o nível do rio, houve uma grande quantidade de deslizamento de terra e erosão do solo. Isso densificou a água, a água ficou muito pesada”, explica Menegat. 

Conforme aponta o geólogo, a água, nesses casos, pode aumentar seu peso de 300 kg a 500 kg por metro cúbico. “É uma água pesada, invade e empurra as casas e leva embora ao mesmo tempo todos os detritos que se geram por esse abalo estrutural. Nós vimos isso de forma muito clara em várias regiões das cidades de Arroio do Meio, Cruzeiro do Sul, outras cidades ali também do Vale do Taquari, como Estrela”, exemplifica Rualdo, tornando fácil entender porque bairros e cidades inteiras ou não existem mais ou estão completamente abandonadas. 

Área de risco 


Em maio a chuva caiu diferente. A água parecia mais lodasa, com isso, boa parte dos móveis que foram molhados não puderam ser recuperados / Foto: Fabiana Reinholz

De acordo com Menegat, as áreas de inundação fluvial são áreas vulneráveis e morar ali significa risco. No Vale do Taquari, pontua, não há uma planície de inundação larga. Em razão dessa falsa sensação de segurança, as pessoas acham que podem ocupar o local, tranquilamente. Contudo, ao mesmo tempo que o rio é formado por vales profundos, ele também é estreito como um cânion, enchendo rapidamente com a chuva.

Além de ser socialmente aceitável, as moradias às margens dos rios não estão lá por acaso. Na visão de Rualdo, a expansão do agronegócio em solos estáveis tem empurrado o crescimento urbano para a margem. “Para onde a cidade se expande? Adivinhe, para os estoques ambientais. Onde estão os estoques ambientais? Nas margens dos rios! E o que tem ali? Planícies de inundação, áreas de vulnerabilidade. Então os planos diretores foram abrindo suas prerrogativas e permitindo a ocupação de áreas de alto risco, expondo as populações.”

Para Menegat há como prever os lugares em que há risco de um evento acontecer. “Quando nós consideramos um sistema fluvial, nós sabemos onde delimitar com muita clareza onde é a planície de inundação, quais são as áreas propensas a inundar. Nós temos todo histórico de variação do nível das águas. Sabemos onde as vulnerabilidades são maiores ou menores. Ao ocuparem essas áreas sem que os governantes delimitem claramente e restrinjam as áreas que têm muita probabilidade de ocorrer eventos, ou seja, as áreas muito vulneráveis, na medida em que isso se torna possível, está se expondo a população ao risco.”

Prevenir é sempre melhor

Para Menegat, houve uma perda da inteligência social do lugar. “Precisamos construir uma inteligência social do lugar. Isso significa ter consciência do lugar em que a gente habita. É possível estabelecer zonas de vulnerabilidade, estabelecer zonas de risco. Em algumas é proibitivo, em outras é possível ‘desde que’ implique uma série de compromissos políticos, institucionais e sociais que é a disposição dos moradores do local a se moverem diante de alertas, a realizarem uma série de protocolos e ações a partir de um alerta. Quem é que está disposto a isso? Se não está disposto a isso, não pode morar ali.”


"Quando nós consideramos um sistema fluvial, nós sabemos onde delimitar com muita clareza onde é a planície de inundação, quais são as áreas propensas a inundar" / Foto: Fabiana Reinholz

Ele reforça que não se trata assim de uma remoção total. Se trata de sentar, conversar e estabelecer padrões, protocolos, sistemas de prevenção e sistemas de alertas. “Podemos morar num local mais ou menos vulnerável? Sim, podemos. Mas atenção, tem que ser muito rígido o sistema de alertas.”

Conforme afirma, será preciso desenvolver uma governança participativa, com diálogo, com base no conhecimento popular, científico e no desenvolvimento de tecnologias sociais, para lidar com os problemas que as comunidades em área de risco enfrentam. 

“Nós temos que melhorar a nossa capacidade de governança. O que vimos recentemente é uma perda da capacidade da mesma. O negacionismo é uma maneira de interditar o conhecimento, a política da extrema direita é interditar a política e assim interditar a governança. O orçamento do país também foi interditado porque tem a responsabilidade fiscal e o Rio Grande do Sul só foi ajudado por conta de uma capacidade do Governo Federal em reunir todos os poderes da República.”

A única garantia é a insegurança

Independente da dinâmica, a enchente de maio registrou 182 mortes, afetando 473 cidades, e deixando mais de 500 mil pessoas desalojadas. Quatro meses após as enchentes, 2.411 pessoas seguem fora de suas casas, espalhadas em 58 abrigos em 28 municípios. A maioria delas na região Metropolitana e Vale do Taquari.

“As prefeituras não se prepararam e não estão preparadas para esses eventos climáticos extremos. No caso do Vale do Taquari, pela dinâmica da natureza. Ali é uma bacia enorme, os cânions são muito íngremes e acumula muita água com violência. As prefeituras não entenderam ainda que muitas daquelas cidades, como Roca Salles, Muçum, precisam ser totalmente deslocadas”, afirma a coordenadora do Movimento dos atingidos por Barragens RS (MAB), Alexania Rossato, ao comentar sobre as enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul, e que em setembro completa um ano. 


Vamos seguir organizados, fortalecendo a organização dos atingidos, fortalecendo o MAB" / Foto: Jorge Leão

Conforme pontua o MAB na região do Vale do Taquari, as últimas três enchentes devastaram comunidades inteiras, deixando mais de 40 mil desabrigados, destruindo mais de 3 mil residências e gerando prejuízos superiores a R$ 500 milhões. Para o movimento essas tragédias têm causado impactos profundos na saúde mental e no bem-estar das comunidades, o que agrava ainda mais a situação de vulnerabilidade no estado. 

"Da enchente de setembro para essa de maio, as prefeituras não aprenderam. As prefeituras do Vale do Taquari não aprenderam a lidar com a situação da enchente. Porque o que a gente viu foi um total despreparo. Pelo menos para a remoção dos pertences das famílias. Muitas famílias ficaram ou até morreram porque ficaram esperando a prefeitura colocar os caminhões para buscar os móveis. De novo a mesma situação, a mesma, o mesmo drama." 

A dirigente explica que a dinâmica da enchente no Vale do Taquari é diferente da observada na região Metropolitana. “Lá no Vale do Taquari a questão da segurança é outra. É criação de sistemas de alerta, de sirene, de régua por conta do rio. De um dia para o outro a água enche e o rio leva tudo por diante, com uma velocidade e violência enormes, destrói tudo. Em dois dias baixa e aí tu vê a destruição. Na região Metropolitana o tipo da enchente é outro, a água entrou nas casas e ficou um mês, 20 dias inundado. Isso causa estragos diferentes.”


Com faixa e cartazes, manifestantes cobraram moradia em ato em Porto Alegre / Foto: Jorge Leão

Políticas Públicas 

Diretor de Habitação do Ministério Extraordinário para Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, Engenheiro Comassetto, pontua que a política de socorro à população e o tema da habitação está construída, e precisa agora ser efetivada, realizada. “Houve primeiro a enchente do ano passado. Da enchente do ano passado, o governo disponibilizou para os municípios diversos projetos. E esses projetos ficaram a cargo das prefeituras realizar as suas obras. A grande maioria delas ainda não foi efetivada, mas os recursos estão disponíveis. Porque quem faz o projeto habitacional local são as prefeituras. E aquelas que não executaram, elas foram incorporadas nas políticas de agora para potencializar.”

Segundo ele, a primeira medida que saiu foi a Compra Assistida. Nessa medida, explica, o Governo Federal comprou e está comprando os imóveis todos prontos para disponibilizar às populações atingidas. Ele comenta que em muitos municípios não houve oferta, como é o caso de Arroio do Meio, de moradias para vender. 

Ele reforça que a porta de entrada para que as famílias adquiram o direito de ter a nova moradia inicia com a prefeitura. “Ela faz o plano de trabalho, manda para a Defesa Civil, a Defesa Civil aprova, coloca no sistema Dataprev, que hierarquiza as pessoas e o tipo de moradia. O Ministério das Cidades dá ok e vai para Caixa Econômica Federal.”

Até o momento foram solicitadas 2.989 moradias no programa Compra Assistida Reconstrução. O município com o maior pedido é Estrela, com 884, seguida de Cruzeiro do Sul, 558. A primeira está em análise pelo Ministério das Cidades e a segunda aguardando chamamento da Caixa.

Segundo Comassetto, há um aceno positivo para que no mês de outubro saia mais uma portaria para que os recursos do Fundo de Desenvolvimento Social para as entidades sociais possa elaborar projeto e contratar. 


 Manifestantes reivindicaram casa e auxílio para recomeçar / Foto: Jorge Leão

Recursos Habitação 

“De uma maneira geral, as políticas públicas e os recursos para todas as habitações que foram destruídas já estão anunciadas, os recursos já estão disponíveis", destaca. 

Como exemplifica Comassetto, saiu uma portaria para aquelas famílias que ganham acima de R$ 4.700,00. Quem ganha acima disso, até R$ 8.000,00 já saiu uma portaria que dá subsídio de R$ 40.000,00 para a família poder financiar a um projeto, financiar uma casa pelo programa Minha Casa, Minha Vida. Bem como saiu uma outra portaria para aquelas famílias que querem reconstruir a casa que já tem o terreno, desde que a prefeitura garanta que lá não é área de risco. Ela pode, então, ter a fundo perdido até R$ 150.000,00 para reconstruir a casa no mesmo local. 

“É importante salientarmos que esse trabalho é em conjunto, União, Estado e os municípios. Quem tem que elaborar o plano, quem tem que executar é o município, através da contratação das empresas. O Governo do Estado também anunciou um decreto que destina mais R$ 20.000,00 para agregar aos programas do Governo Federal, para ajudar na construção das habitações."

Sobre a questão das casas provisórias, o diretor pontua que o Governo Federal tomou a decisão de não fazer casa e nem dar recursos para casas provisórias, porque além delas serem pequenas, elas são ruins de instalar. “Então é melhor organizar e fazer definitivamente, para isso a política e os recursos já foram construídos e estão destinados para tal."


“Nós temos que melhorar a nossa capacidade de governança. O que vimos recentemente é uma perda da capacidade da mesma" / Foto: Fabiana Reinholz

“Tem que continuar a união dos esforços e as comunidades têm que conversar com os prefeitos para que os planos de trabalho e os projetos sejam realizados. E isso precisa ser um processo participativo das comunidades para poder ajudar a construir esta situação, porque nós não estamos construindo só casa, nós temos que reconstruir cidades. Reconstruir cidades tem que ser coletivamente. Não basta uma decisão por decreto ou uma atitude tecnocrática. É uma atitude de construção de cidade, de afirmação de cidadania. E uma família sem endereço é uma família sem cidadania.” 

De acordo com ele, agora o município pode rever os seus planos diretor e abrir novas áreas de expansão urbana com áreas seguras. “Cada município do Vale precisa redesenhar a seu plano diretor para dar condições para que se relocalize essas pessoas que precisam, ou melhor, que não podem mais voltar para o mesmo lugar. As mudanças climáticas e as catástrofes, elas vieram para ficar. E esses episódios serão cada vez mais frequentes e poderão ser cada vez mais. Então não podemos correr o risco e, ao mesmo tempo, como Poder Público deixar que isto se repita.”


“Tem que continuar a união dos esforços e as comunidades têm que conversar com os prefeitos para que os planos de trabalho e os projetos sejam realizados" / Foto: Fabiana Reinholz

Nesse sentido, conclui o diretor, é um plano integrado de todas as secretarias junto com as comunidades. “Nada melhor do que apresentar os novos planos de expansão urbana para as cidades e fazer uma plenária. Aí fazer e apresentar isso. E ir até a população, ouvir opiniões, porque saberes populares com saberes técnicos, quando eles se integram, os resultados são muito melhores.”

Recursos federais 

De acordo com o Executivo federal, além de cada cidade gaúcha individualmente, o Governo Federal destina recursos para todo o estado. Até o momento são R$ 93,7 bilhões para apoiar o enfrentamento à calamidade ocasionado pelas enchentes, sendo R$ 76,2 bilhões para investimentos e R$ 17,5 bilhões de antecipações de benefícios e prorrogação de tributos. “O pagamento da dívida do estado também foi suspenso pelos próximos três anos, totalizando mais de R$ 23 bilhões”. 

Abaixo o total de investimentos e transferências aos municípios do Vale do Taquari:

Arroio do Meio - R$ 188.289.729,81 
Bom Retiro do Sul - R$ 29.770.535,20
Boqueirão do Leão - R$ 7.871.680,10
Canudos do Vale - R$ 6.248.392,27
Capitão - R$ 4.611.030,50
Colinas - R$ 8.927.687,70
Cruzeiro do Sul - R$ 85.637.461,97
Estrela - R$ 187.475.041,48
Fazenda Vila Nova - R$ 2.098.560,93
Forquetinha - R$ 8.216.907,44
Imigrante - R$ 26.900.268,
Itapuca - R$ 2.544.918,92
Lajeado - R$ 462.528.161,15
Marques de Souza - R$ 21.277.487,59
Mato Leitão - R$ 21.277.487,59
Paverama - R$ 9.890.096,80
Poço das Antas - R$ 3.509.117,67
Pouso Novo - R$ 6.244.573,43
Progresso - R$ 8.710.300,43
Santa Clara do Sul - R$ 12.569.722,48
Sério - R$ 2.129.433,58
Tabaí - R$ 3.873.201,16
Taquari - R$ 65.766.519,18
Teutônia - R$ 66.027.844,18
Travesseiro - R$ 9.402.583,17
Venâncio Aires - R$ 298.020.790,96
Westfália - R$ 2.786.927,54


Atingidos do Vale do Taquari participaram da manifestação em Porto Alegre / Foto: Jorge Leão

Governo do Estado 

Já em nível estadual, o principal programa desenvolvido é o Plano Rio Grande, aponta o Executivo estadual. De acordo com o Governo do Estado, o plano já investiu mais de R$ 1,7 bilhão em medidas para mitigar o impacto das chuvas que assolaram o estado em 2023 e 2024. Ele é dividido em três eixos: Emergencial (ações focadas no curto prazo), Reconstrução (médio prazo) e Rio Grande do Sul do Futuro (longo prazo). O status dos projetos podem ser acompanhados pelo site planoriogrande.rs.gov.br

“A sociedade também está representada e participa por meio do Conselho do Plano Rio Grande, com 182 representações do Poder Público, da sociedade civil e das pessoas atingidas pelas enchentes. Já o Comitê Científico de Adaptação e Resiliência Climática é a representação da academia, sendo um órgão colegiado com atribuições consultivas e propositivas”.

Segundo a Secretaria de Habitação e Regularização Fundiária do RS, em 2023 o Governo do Estado construiu 44 moradias provisórias na região do Vale do Taquari, sendo 24 em Arroio do Meio e 20 em Roca Sales. Em 2024 serão 500 sendo:

28 em Cruzeiro do Sul (entrega neste sábado, 14h) e depois receberá mais 50
30 já entregues em Encantado (e receberá mais 50 em breve)
103 em Estrela – as primeiras 27 na primeira quinzena de setembro
48 em Triunfo
40 em Arroio do Meio
39 em Rio Pardo
60 em São Leopoldo
18 em São Jerônimo

Há previsão também para Eldorado do Sul, mas ainda não há terreno apto a receber no município.


As famílias permanecerão nas moradias provisórias até a entrega das casas definitivas / Foto: Theo Tajes

De acordo com a pasta, as famílias permanecerão nas moradias provisórias até a entrega das casas definitivas, quer pelo programa A Casa é Sua - Calamidade do Governo do Estado, quer pelo Minha Casa Minha Vida do Governo Federal.

As do Governo do Estado devem iniciar a construção até a primeira quinzena de outubro, Santa Tereza e Encantado são os terrenos mais adiantados nos trabalhos de preparação da infraestrutura necessária.

“Esse sistema de módulos transportáveis definido pelo Governo do Estado permite que as habitações sejam higienizadas após o uso e armazenadas para atender qualquer outra emergência que venha a surgir. Eles podem ser reaproveitáveis.”

Investimento: 

“De 2023 a 2024, o Estado empenhou R$ 579 milhões em recursos para o enfrentamento a desastres naturais em diversas frentes. Na Lei Orçamentária Anual, apenas para 2024 estão previstos R$ 117 milhões para projetos que contemplem ações de enfrentamento e prevenção de desastres naturais. 

. A título de esclarecimento, os R$ 117 milhões – dados de abril de 2024 – estão contempladas as seguintes ações, diretamente relacionadas a desastres climáticos:

- R$ 2,3 milhões enfrentamento para a área da saúde e recuperação de hospitais
- R$ 31 milhões Irriga Mais RS
- R$ 26,1 milhões projetos de recuperação para pequenos produtores rurais
- R$ 3,3 milhões para recuperação de escolas
- R$ 33,9 milhões para Defesa Civil para repasse aos municípios atingidos, Fundo a Fundo e aparelhamento
- R$ 15,3 milhões Volta por Cima e aluguel social
- R$ 5,2 milhões para revitalização de bacias hidrográficas, monitoramento hidrometeorológico e modernização de sistema de outorga

Ainda segundo o Executivo estadual, o orçamento da Defesa Civil do Rio Grande do Sul aumentou mais de cem vezes em recursos entre 2021 e 2023, indo de R$ 1,8 milhão em 2021 para R$ 10 milhões no período seguinte. Chegou a R$ 118 milhões em 2023 e a R$ 187 milhões em 2024.

O Governo do Estado instituiu também programas de repasse de auxílio financeiro às famílias como o Volta por Cima, Aluguel Social e Auxílio Abrigamento.


Movimento Atingidos por Barragens (MAB) organizou manifestação em Porto Alegre nesta quinta-feira (5) / Foto: Jorge Leão

Pelo Aluguel Social em 2023, foram repassados R$ 2.384.600,00 (pagamento em novembro de 2023 que beneficiou 1.005 famílias), R$ 1.495.200,00 (pagamento realizado este ano, mas referente ao evento de 2023).

Em 2024, o município de Doutor Ricardo recebeu R$ 7.200,00, três famílias beneficiadas, outros seis municípios estão com processos tramitando para pagamento. 

No programa Volta por Cima, em 2023, foram R$ 4.730.600,00, beneficiando 2.060 famílias do Vale do Taquari (atingidos receberam parcela de R$ 700,00 enquanto desabrigados ou desalojados receberam R$ 2,5 mil).

Outro repasse financeiro foi do PIX SOS Rio Grande do Sul, que em 2023 distribuiu R$ 5.517.500 para 2.327 donos de pequenos negócios em nove municípios do Vale do Taquari: Arroio do Meio, Colinas, Cruzeiro do Sul, Encantado, Estrela, Lajeado, Muçum, Roca Sales e Santa Teresa.

Agora na Expointer foi assinada a destinação de R$ 12 milhões como complemento para a construção de 600 moradias rurais aos produtores atingidos pela enchente de 2023 na região.

Aceleração na reconstrução

A principal reivindicação do MAB, no contexto atual, é a aceleração da reconstrução das moradias destruídas, ressalta Alexania. De acordo com a Confederação Nacional de Municípios (CNM), os danos e os prejuízos causados pelas chuvas no estado ultrapassam os R$ 12,8 bilhões, sendo que mais de 112,3 mil casas foram danificadas e ou destruídas, contabilizando R$ 4,7 bilhões em prejuízos somente no setor habitacional. 

“Os atingidos precisam não apenas de unidades habitacionais, mas de reassentamentos com moradias novas, adequadas e seguras, espaços comunitários e estruturas coletivas como escolas, hospitais e creches. No caso das casas danificadas, o MAB defende que o Governo Federal autorize que os próprios moradores reformem suas residências com apoio financeiro do governo, sem interferência de construtoras”, enfatiza o movimento. 


Atingidos do Vale do Taquari, Porto Alegre, Alto Uruguai, Canoas e Alta Fronteira saíram às ruas reivindicando moradia segura e levantando cartazes em defesa ao meio ambiente e de denúncia / Foto: Jorge Leão

Segundo comenta Alexania, o movimento abriu uma mesa de negociação com o Governo Federal. “A gente quer que o Governo do Estado se responsabilize com as pautas dos atingidos que o MAB vai apresentar. Temos críticas à postura do Governo Leite com relação à conduta ambiental, os cortes de verba, aquela proposta de construção de barragens em Área de Preservação Permanente (APP). Tem uma série de coisas aí, restrição orçamentária, pra esse tema das mudanças climáticas. A gente acha que o Governo do Estado tem responsabilidade sobre isso. E tem responsabilidade na reconstrução”, afirma.


Os atingidos saíram da conversa com o compromisso de compor um grupo de trabalho / Foto: Divulgação

MAB é recebido pelo Governo do Estado

Nesta quinta-feira (5) o MAB ocupou as ruas do centro de Porto Alegre denunciando as diversas situações dos bairros alagados e a falta de garantia dos direitos dos atingidos, como os recursos financeiros e moradia segura. Durante o dia, os representantes das diferentes regiões do estado participaram de uma reunião com os secretários da Habitação, Desenvolvimento Social, Justiça e Cidadania e Direitos Humanos e a secretária de Meio Ambiente e Infraestrutura. 

O encontro foi para pautar os problemas com o recebimento do Auxílio-PIX, a demora no reassentamento das famílias atingidas e ausência de segurança das barragens da Lomba do Sabão, que com as grandes pancadas de chuva oferece mais perigo aos moradores da Lomba do Pinheiro. 

Na ocasião o secretário de Desenvolvimento Social, Beto Fantinel, admitiu que as políticas emergenciais ficaram por vezes inacessíveis pela falta de critérios para o processo de avaliação e inscrição. "O PIX por ser um recurso que veio de arrecadação ficou confuso, ficou por conta dos municípios."

Além de reivindicar o pagamento do PIX para as famílias que não receberam, o Movimento dos Atingidos também pede por mais parcelas dos auxílios. Na avaliação do próprio secretário, o governo gaúcho não tem capacidade para isto. "O certo era o governo ter condições de ajudar todas as famílias, mas não temos. Foram R$ 250 milhões, só nessa última enchente, que nós não estávamos esperando", diz o secretário.

Os atingidos saíram da conversa com o compromisso de compor um grupo de trabalho em cada uma das secretarias. No final das contas, a reunião de duas horas serviu para abrir as portas ao Movimento, que até aquele dia não havia sido recebido diretamente pelo governo estadual.

* Reportagem realizada em parceria entre o Brasil de Fato e o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)


Edição: Katia Marko