O engenheiro especialista em Planejamento Energético e Ambiental e ex-diretor do DEP (Departamento de Esgotos Pluviais), Vicente Rauber, sustenta todas as afirmações que vem fazendo desde o período da enchente.
Ele relembra que tão logo a inundação generalizada foi ocorrendo em Porto Alegre, no início de maio, um grupo de 48 profissionais – ex-dirigentes do saneamento e áreas vinculadas, professores e pesquisadores – sentiu-se completamente indignado com o que via, comportas externas vazando, casas de bombas também com as comportas vazando, as águas do Guaíba invadindo pelas próprias canalizações, fazendo chafarizes nas bocas-de-lobo. Conta que o grupo dos 48 especialistas ficou mais indignado ainda quando viu que os defeitos não estavam sendo sanados com mergulhadores, profissionais especializados que trabalham sob águas, usualmente atuantes nas atividades do saneamento a qualquer tempo.
O ex-diretor do DEP recorda que foi feita uma “Manifestação aos porto-alegrenses”, realizando um diagnóstico da situação e apresentando propostas emergenciais, com a cidade ainda inundada, e propostas para após as águas baixarem. A manifestação teve ampla repercussão nacional e internacional, num primeiro momento, e depois em nível local.
“A reação dos dirigentes da Prefeitura e do DMAE, na época, foi atacar a nível pessoal e com fakes os signatários do manifesto”, garante Rauber.
Numa tentativa de “um grande lance de marketing” foi trazida uma ampla delegação holandesa que, após avaliar a situação, anunciou preliminarmente: “É necessário recuperar a integridade do sistema, fazer o monitoramento de seus níveis de integridade. Analisar vazões e ventos, com alertas para a população”, repete agora.
- Ou seja, nada diferente do que nossa manifestação, engenheiros do DMAE e especialistas em pesquisas hidráulicas já haviam alertado. Frise-se: ‘recuperar a integridade’ é fazer a manutenção que deixou de ser feita.
Rauber conta que o protelamento na divulgação do relatório final dos holandeses para daqui a dois meses – parcialmente foi divulgado no dia 19 de agosto – não foi uma decisão correta em função do clima eleitoral. “Mas tudo mudou e agora foi divulgado mostrando a amplitude da tragédia e com aval a determinadas alegações da prefeitura”.
Para ele, o relatório aborda centralmente três pontos: “a baixa altura dos diques do Sarandi e as deficiências nas Casas de Bombas, que foram construídas num nível mais baixo”.
Na entrevista do dia 19, afirma Rauber, a palavra manutenção esteve proibida. A versão apresentada é a de “que existem problemas estruturais decorrentes da construção do Sistema de Proteção contra Inundações”.
Se assim realmente consta do relatório, Rauber diz que é necessário perguntar qual fonte de informação foi dada à delegação holandesa. Erro de projeto deve ser verificado no projeto original. Ou seria necessário revisar a documentação técnica do DNOS (Departamento Nacional de Obras e Saneamento) que estava arquivada no DEP, essencial para o exercício das atividades. Era usada, segundo ele, cotidianamente nos trabalhos do DEP e foi base da publicação ‘Prevenir é o melhor remédio”. Certamente esta documentação não foi apresentada à delegação holandesa, conforme Rauber. Anteriormente um dirigente do DMAE já havia informado que esta documentação não existia. Ou esta documentação está “escondida” ou foi realmente perdida, o que é gravíssimo, e os responsáveis por transferir o DEP ao DMAE precisam responder por isto, diz Rauber.
Ele cita a degradação dos diques do Sarandi, as deficiências das casas de bombas, a fragilidade das comportas. “Dinheiro não faltou, o que faltou foi bom senso.” A extinção do DEP também tem muito a ver, segundo Rauber, na falência do sistema anticheias. O engenheiro conclui que “não há erro estrutural de projeto no Sistema de Proteção contra Inundações de Porto Alegre. Há sim uma gestão irresponsável que propositadamente destrói estruturas públicas essenciais e não cumpre com seus compromissos públicos.”
Edição: Katia Marko