Eleição proporciona algo único: o borbulhar de um exercício dialético
Embora muitos tenham sido levados a acreditar que a eleição é sempre um desperdício de tempo e dinheiro público, penso que este momento proporciona algo único: o borbulhar de um exercício dialético. Sim, sei que posso parecer esperançoso, mas a palavra é a grande aposta da minha vida. Agora, é tempo de dobrar a aposta.
Antes de prosseguir, esclareço resumidamente que a dialética parte de uma ideia base, chamada tese. Em seguida, o interlocutor propõe uma ideia contrária, chamada antítese. Dessa interação surge uma conclusão, chamada síntese, que passa a ser uma nova tese pronta para ser questionada, entrando no espiral infinito da desconstrução e reconstrução do saber. Afinal, não seria do embate de ideias que surgem as transformações discursivas?
O embate discursivo tem sido cada vez mais silenciado. Diante de uma ideia diferente, o botão “deixar de seguir” é a primeira opção. Ninguém mais tem tempo para o debate, o neoliberalismo venceu, e perdemos todos. Cada um por si, imerso em seu mundinho, em sua rede de amigos que são a “imagem e semelhança”. Claro, como não amar o próprio espelho?
E assim, vamos nos alienando numa rígida maneira de ver o mundo. Apenas “eu” detenho a verdade. Tudo que vem na contracorrente é falso, manipulado. Precisamos estar atentos para não cair na armadilha de nos considerarmos mestres, como se fôssemos os detentores do saber total. Quase um saber paternal, que não pode ser contrariado. Afinal, saberes paternos tendem a se consolidar como verdades que dificilmente aceitam e toleram outras interpretações.
O embate de ideias é salutar, desde que não seja conduzido por um discurso colonizador, onde se tenta desconsiderar o saber do outro para impor o nosso. A palavra cria vínculos, traz esperança, nomeia desejos, direciona o olhar para outras perspectivas, desacomoda, possibilita novas formas de ser e existir.
O período eleitoral é o tempo do diálogo, de reconhecer o poder que cada pessoa tem em suas mãos. Não é por acaso que a eleição também é chamada de “festa da democracia”. Nesse dia, todo cidadão tem a oportunidade de transferir seu poder para alguém que o represente, que incorpore seus ideais e que entenda que o exercício político é o melhor instrumento de transformação social.
* Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.
Edição: Vivian Virissimo