Rio Grande do Sul

ecologia

Ato celebra 25 anos da criação da Secretaria Estadual do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul

Pasta foi criada em julho de 1999 e teve como primeiro secretário Claudio Langone

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Ex-governador Olívio Dutra participou de comemoração dos 25 anos da criação da Secretaria Estadual do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul (SEMA do RS - Divulgação

Importantíssima comemoração da Frente Parlamentar pró-Unidades de Conservação, dos 25 anos da criação da Secretaria Estadual do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul (SEMA do RS), coordenada pelo deputado estadual Jeferson Fernandes, na Assembleia Legislativa do RS, na noite de 5 de agosto, sob a organização da bióloga Andréia Carneiro.

Lá estiveram o então governador Olivio Dutra (1989-2002), o primeiro secretário de meio ambiente, Claudio Langone, o deputado Miguel Rossetto, associações de técnicos da Sema, Fepam, Ibama, entidades ambientalistas, entre outros.

Destacou-se a importância da necessidade de uma secretaria independente e autônoma, o que resultou na separação, na época, da secretaria de Saúde e Meio Ambiente. Langone lembrou da dificuldade desta criação, que implicava em obter garantia política para a sua aprovação na Assembleia Legislativa do RS, e encontrar espaço e estrutura entre as demais pastas, o que não foi nada fácil, segundo o então secretário. O agronegócio, já forte no parlamento gaúcho, e o setor empresarial industrial, também muito influente, além da grande mídia patrocinada por estes setores, eram refratários à ideia de uma pasta de meio ambiente e tinham receio das "travas" que uma pasta desta área poderia representar para o chamado "desenvolvimento" dos seus negócios no Estado.

Nós, do InGá, recordamos o momento de alegria e a grande emoção expressada por ambientalistas, quando do momento da aprovação da Lei que criou a SEMA na Assembleia (29/07/1999).

Langone destacou que estávamos muito à frente de nosso tempo, e que o RS estava inaugurando um processo de incluir a temática ambiental no centro das políticas, inclusive do que é chamado de desenvolvimento sustentável. O Estado gaúcho teve pioneirismos no Pró-Guaíba, no Zoneamento Ambiental do Litoral Norte, na Avaliação Ambiental Integrada de projetos hidrelétricos por bacias, na criação do Conselho Estadual de Meio Ambiente, com votação para sua presidência (perdida em 2009), concurso para guardas-parques, a estruturação do Parque Estadual de Itapuã, entre tantos avanços para a época. O InGá e outras entidades ambientalistas da Apedema reconheceram as melhorias substanciais. Entretanto, também, consideraram a falha ou lacuna na Lei da criação da SEMA-RS, onde foram criados somente 3 cargos, não tendo sido realizados concursos para a adoção de uma necessária estrutura de cargos e salários, em uma secretaria de tanta importância.

Ou seja, em nosso ponto de vista, a SEMA era uma excelente e urgente iniciativa, mas não tinha sido preparada para enfrentar o desafio muito além de seu tempo, retomando a expressão de Cláudio Langone. Passados governos decentes, o "castelo de areia" (SEMA-RS sem estrutura forte de Estado) foi sendo desmoronado por governos neoliberais e de uma direita obscurantista e negacionista como poucas no Brasil.

E assim, infelizmente, a avaliação da SEMA-RS atual, no evento de comemoração de sua criação, foi de grande tristeza, pra não dizer estarrecimento. A partir de 2003, a Secretaria foi sendo enfraquecida, com mudanças anuais de secretários(as), e favorecimentos aos setores econômicos que dominam a política e a economia do RS.

Todavia, no período do governo Tarso Genro (2011 a 2014) houve alguns avanços, interrompendo o enfraquecimento deliberado da SEMA, entre 2003 e 2010. Por exemplo, a Fundação Zoobotânica se fortaleceu, conquistando um plano de cargos e salários A Fepam, a partir da direção de Nilvo Silva, que retornou em 2013, ao cargo que ocupara entre 1999 e 2002, obteve uma importante retomada, como no caso da reestruturação e fortalecimento de seu quadro técnico, desvinculando a possibilidade de que profissionais não concursados, em cargos políticos, pudessem emitir licenças ambientais. Reconhecemos que em 2013 houve a Operação Concutare, traumática para a então gestão da Sema, sendo desvendados vícios de muitos anos na área de licenças para empreendimentos. Mas isso não vinculou o governo da época com as irregularidades focadas em alguns técnicos de um setor, e tampouco retirou os méritos de avanços importantes nos projetos Mata Atlântica, RS Biodiversidade, o Programa Estadual de Produção Orgânica e Agroecológica do RS, e, inclusive, o que ficou de bom do RS Rural, da época do governo Olivio Dutra, que mantinham temas estratégicos para a sociobiodiversidade do Estado.

Lamentavelmente, os governos neoliberais de José Ivo Sartori e Eduardo Leite, superando os retrocessos de Germano Rigotto e Yeda Crucius, destruiram profundamente as políticas ambientais e a independência conquistada pela Sema, em 1999.

Sartori extinguiu a FZB, a FEE, a Cientec, a FEPPS, mantendo o Irga, de interesse do agronegócio, entre outros retrocessos. Na sequência, veio o não cumprimento do Cadastro Ambiental Rural (CAR), o descumprimento da Lei do Código da Vegetação Nativa (Código Florestal) no Pampa, em não reconhecer a Reserva Legal, emitiu decreto que retirava o reconhecimento das listas oficiais de espécies ameaçadas de extinção marinhas, tirou o poder que tinha a FZB tinha para a atualização das Listas de Espécies Ameaçadas de Flora e Fauna, atrasando este proceso até os dias atuais, começou a entregar as áreas do Parque Zoológico e Horto Balduino Rambo para setores empresariais.

O governo de Eduardo Leite, por sua vez, impôs a incorporação e a supremacia da pasta de INFRAESTRUTURA sobre a área de meio ambiente, resgatando a tutela da área ambiental à outra pasta econômica, na criação da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Infraestrutura. Deste modo, desmontou e enfraqueceu, ainda mais, o que sobrou da SEMA, subjugando a área ao interesse das Federações do Agro, da Indústria e de outros setores da economia imediatista, concentradora, associados a um parlamento negacionista das mudanças climáticas, responsável pela calamidade ainda maior das consequências das enchentes. O novo Código Ambiental, aprovado em regime de urgência no final de 2019, foi a maior violação já vista no processo de destruição da legislação ambiental. Foram mudanças em mais de 400 artigos, parágrafos, incisos, para deixar na insegurança ambiental e fortalecer o que argumentam ser segurança jurídica para os negócios. Foram também anulados, pela nova Lei n.15.343, 14 artigos do Código Florestal Estadual de 1992. Volta-se a permitir o corte indiscriminado de figueiras nativas majestosas, pra não impedir empreendimentos.

O Rio Grande do Sul, que sediou o Fórum Social Mundial, na época da verdadeira SEMA, que nasceu em 1999, agora segue mais refém de uma economia de fim de mundo: privatiza a água, a a energia; aumenta os incentivos econômicos e legais às monoculturas de exportação (grão de soja e celulose de eucalipto), que não pagam impostos, nem pelo uso de agrotóxicos; promove a derrubada de lei inédita de 1982, que limitava o uso no RS de agrotóxicos proibidos em seus paises de origem; sufoca a finalização do Zoneamento Ecológico Econômico do Estado, desde 2019, que custou 9 milhões de reais; atrasa a atualização das Listas Oficiais de Flora e Fauna Ameaçadas que deveriam ter sido publicadas já em 2018; submete à ingerências governamental e política na área técnica, e altera trabalho técnico dos funcionários da Fepam, sem suas autorizações, no ZEE do Litoral Norte; praticamente privatiza e elitiza o acesso aos parques estaduais, com maquiagem de concessões; abandona os guardas-parques; desestrutura a autonomia e a independência técnica de seus funcionários que atuam em licenciamento ambiental; traz investimentos predatórios, com capitais concentrados em gigantes parques eólicos previstos para a Laguna dos Patos; reduz a área de APPs, facilitando projetos de irrigação em áreas de significativa importância ecológica; etc.etc.

Em suma, somos testemunhas do agravamento da submissão ilegal, perversa e naturalizada da proteção do meio ambiente equilibrado, assegurado pelo Artigo 225 da Constituição Federal, aos interesses econômicos imediatistas responsáveis, em parte, pelas consequências calamitosas das enchentes e pelo avanço voraz de negócios que causam a degradação ambiental no Estado e no País. Temos pouco tempo para mudar, e não mais votar em políticos que são negacionistas e lenientes à situação pré-colapso ecológico, sem volta, em que estamos entrando.

* Paulo Brack é biólogo, Dr., professor titular do Departamento de Botânica Instituto de Biociências da UFRGS.

** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.


Edição: Vivian Virissimo