Dias antes da enchente de maio/junho, a Justiça suspendeu a inclusão do prédio da extinta Empresa Porto-alegrense de Turismo (Epatur) no leilão que seria realizado em 23 de abril. A alegação é que o prédio não está em completo desuso, uma exigência para alienação de patrimônio público. Hoje, o prédio está ali, com funcionários que vão bater o ponto ou prestar algum serviço – ao que parece não há nada para fazer de rotineiro dentro das atribuições da esfera municipal.
Com uma área de 4.363,54 metros quadrados, localizada na Travessa do Carmo, ao lado do Largo Zumbi dos Palmares, Cidade Baixa, a prefeitura quer se desfazer do local. Na impossibilidade, o local virou abrigo de cães resgatados na enchente. O imóvel foi avaliado em R$ 13 milhões. No passado, a área foi utilizada para apuração dos votos dos jurados nos desfiles das escolas de samba do Carnaval de Porto Alegre.
Estavam no prédio 65 cães ontem (25), vindos principalmente do abrigo do Shopping Iguatemi. Há muito material para os animais, mas as áreas interna e externa estão um “caco”, sujas, cheio de veículos abandonados, além de um antigo ônibus de turismo e vários outros tipos de materiais. Muitas das coisas ali deixadas ainda poderiam ser consertadas e utilizadas. É o tal de descaso com dinheiro público. Mesmo que o leilão tenha sido suspenso, não há razões para jogar tudo aquilo às traças e aos ratos ou deixar o tempo fazer mais estragos por falta de manutenção e conservação. Menos mal que agora os bichinhos estão ali, protegidos, com auxílio de alguns voluntários e de jovens aprendizes.
Quem entrou com ação para impedir o leilão foi a vereadora Karen Santos (PSOL). Ela diz que o local é referência para "o povo negro de Porto Alegre" e vem sendo utilizado como espaço para atos públicos, feiras e eventos populares, manifestações artísticas e culturais. A vereadora argumenta que existe uma mobilização de diversas organizações da sociedade civil para constituir um museu da história no local.
“Trata-se de um ambiente muito representativo para a cidade, por ser historicamente utilizado para atos políticos, reivindicações e construção social, em especial para o povo negro. Queremos que seja preservado, reformado e se torne sede de um museu”, justificou Karen.
A Justiça deu vitória para Karen. O imóvel do Largo da Epatur foi considerado de destinação pública, abrigando diversas atividades culturais, em especial ligadas ao povo negro. A partir deste entendimento, ele proibiu o leilão de abril. Agora, é esperar o que vai acontecer. Com tantos problemas em função das enchentes e alagamentos, a prefeitura vai alegar, como sempre, que não tem recursos para reformas.
Depois que os cães se forem vai continuar sendo consumido, abandonado e virar uma área completamente inutilizável. É o que sempre acontece. Ou teremos uma exceção? Pelo jeito, o tal leilão será realizado uma hora em função das alegações da prefeitura e de novos recursos judiciais. E mais um espigão surgirá pela cidade.
* Jornalista
** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko