De acordo com o relatório intitulado "Rua Cidadã", do Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS), estima-se que mais de 14 mil adultos estejam em situação de rua em todo o estado. Destes, menos de 15% tem acesso a serviços de acolhimento institucional. O diagnóstico realizado pelo Centro de Apoio Operacional dos Direitos Humanos e da Proteção aos Vulneráveis (CAODH) foi divulgado nesta terça-feira (23).
Os dados foram compilados a partir de dados obtidos por meio de formulário eletrônico distribuído pelo MPRS. O levantamento contou com apoio do governo do estado, da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs) e movimentos sociais, como o Coletivo Estadual de Lutas da População em Situação de Rua do RS.
“Cumprindo uma decisão do Supremo Tribunal Federa, na ADPF 976, nós verificamos quantas pessoas em situação de rua existem em cada território, quais são os serviços de acolhimento institucional existentes nos municípios e a capacidade de alimentação dessas pessoas. Para além disso, buscamos todos os dados relativos à implementação das políticas de Saúde e Assistência Social, dos equipamentos públicos de serviços a esse público, como, por exemplo, se o município tem Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP), serviço de abordagem social e consultório na rua”, explica o coordenador do CAODH, Leonardo Menin.
Conforme pontua o coordenador, os questionamentos foram respondidos antes das enchentes de maio deste ano. Então os números tendem a aumentar. "Especialmente nesse momento, termos serviços públicos estruturados e Promotorias de Justiça aparelhadas com dados relativos a esses serviços públicos e essas populações pode auxiliar enormemente na superação da situação de rua, inclusive das pessoas que vierem a enfrentar essa situação em razão da calamidade”, destaca Menin.
Além de servir como levantamento sobre os quantitativos da população em situação de rua no estado e sobre a implementação das políticas públicas para essa população, o material também permite que os promotores de Justiça em cada comarca possam ter acesso a essa realidade no seu território de atuação, pontua o coordenador.
Situação no estado
Dos 496 municípios do RS, 381 responderam ao questionário, feito pela internet, totalizando um total de 14.829 pessoas adultas vivendo em situação de rua. O número que pode ser maior, já que três cidades de médio porte (Esteio, Parobé e Tramandaí) e uma de grande porte (Viamão), não responderam ao questionário.
De acordo com o levantamento, os maiores números se encontram em Capão da Canoa (668), Gravataí (799), Canoas (1.311), Caxias do Sul (1.497), Porto Alegre (2.371) e Pelotas (3.937).
“O levantamento verificou que, de toda a população em situação de rua no estado, nem 15% conta com um serviço de acolhimento institucional, nem mesmo albergues para pernoitar. Além disso, não há prestação sistematizada do direito à alimentação na maioria dos municípios”, expões Menin.
Referente a crianças e adolescentes, o diagnóstico indica que 365 estão em situação de rua, sendo que o maior volume está em Porto Alegre. Ainda, o levantamento apontou que 131 famílias vivem nas ruas, a maioria delas em Porto Alegre (28), Santa Maria (25), Bento Gonçalves (22) e Pelotas (10).
Segundo o relatório, de todas essas pessoas, 34,63% (5.136) foram encontradas de modo sistemático na rua e 35,21% (5.222) são itinerantes. A concentração maior está na região Metropolitana de Porto Alegre. Dos municípios que enviaram as respostas, 286 (que corresponde a 75,06%) informaram não ter nenhuma pessoa em situação de rua.
Acesso a direitos básicos
Com relação ao acesso à alimentação, 81,82% das cidades que têm pessoas em situação de rua ofertam o serviço. Desses, em 49,38% (40) a oferta se dá por meio de organizações da sociedade civil de forma sistemática e em 34,56% (28) assistemática, o que revela a insuficiência da oferta por parte do poder público. Conforme Menin, um mesmo município pode ter informado mais de uma opção. Ainda com relação à segurança alimentar, 48,95% informaram insuficiência.
Dentro dos serviços da alta complexidade de assistência social para atendimento à população em situação de rua nos municípios respondentes, 60,18% (65) não dispõem de abrigo, albergue, casa de passagem ou república.
Dos 30 municípios com mais de 50 pessoas em situação de rua: 46,66% (14) possuem albergue; 23,33% (7), abrigo; 20,0% (6), casa de passagem; 10% (3), república; e 20,0% (6), não dispõem de equipamentos da Alta Complexidade. São eles: Campo Bom, Capão da Canoa, Osório, Sapiranga, Torres, Vacaria.
Existem 2.185 vagas de serviços da alta complexidade, sendo 1 mil em Porto Alegre e o restante em outros 41 municípios. Das 14.829 pessoas em situação de rua, apenas 14,73% (2.185) são atendidas em equipamentos com proteção ao menos noturna (no caso de albergues).
Com relação a serviços da Média Complexidade e da Proteção Social Básica para atendimento à população em situação de rua nos municípios respondentes, 69,62% possuem Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), 51,11% têm Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), 5,92% Centro de Referência Especializado para População em Situação de Rua (Centro POP). Ainda, 22,22% contam com equipes para abordagem social e 5,18 % com equipes volantes no CRAS.
Sobre equipamentos da Política de Saúde nos municípios respondentes, 99,12% contam com Unidades Básicas de Saúde; 7,89% com consultórios de rua; 13,16% com ambulatórios de saúde mental; 35,96% contam com Centros de Atenção Psicossocial – álcool e drogas e 50% com outras modalidades de CAPS.
De acordo com o relatório, apenas 18 cidades indicaram ter Plano Municipal para População em Situação de Rua ou estar em elaboração e sete contam com Comitê Intersetorial para Políticas para População em Situação de Rua.
Considerações
Diante desse diagnóstico, o MPRS afirma ser necessária a elaboração de política ou plano municipal para a população em situação de rua. E que produza um desenho articulado entre a assistência social, saúde, segurança alimentar, trabalho e renda, profissionalização, esporte, cultura, lazer, entre outras áreas, além da constituição dos respectivos comitês intersetoriais.
Também conclui a necessidade de movimentos em direção aos municípios de Esteio, Parobé e Tramandaí, de médio porte, e Viamão, de grande porte, que não responderam ao questionário e, ao terem maior número de habitantes, possivelmente têm pessoas em situação de rua.
Dados disponibilizados pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania em setembro de 2023, no relatório intitulado, “População em situação de rua: diagnóstico com base nos dados e informações disponíveis em registro administrativo e sistemas do Governo Federal', apontou que no estado haviam 10.877 pessoas em situação de rua no RS em 2022.
* Com informações do MPRS
Edição: Marcelo Ferreira