A Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul (DPE/RS), por meio dos núcleos de Defesa Ambiental e da Defesa da Igualdade Étnico-Racial, emitiu uma recomendação à Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam), na sexta-feira (12), na qual pede a realização de uma consulta prévia, livre, informada e de boa-fé aos povos indígenas Mbya Guaranis que serão impactados pela possível instalação de um aterro sanitário em Viamão (RS).
A atuação da DPE/RS foi acionada pelo Movimento "Não ao Lixão", que buscou a Ouvidoria-Geral e apresentou um estudos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) - o Relatório Técnico-Científico “A Geologia de Viamão/RS - comprovando a inviabilidade do local para o aterro sanitário.
A mobilização contra o aterro teve início em 2019, e desde então foi permeada por intensas manifestações. A mais recente aconteceu no dia 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente.
O movimento alerta para o risco de contaminação das águas que abastecem a região Metropolitana de Porto Alegre. “A construção do lixão representa uma ameaça direta aos recursos hídricos da região. A área proposta para o aterro sanitário está situada sobre sedimentos instáveis, o que aumenta o risco de vazamentos que poderiam contaminar tanto a água superficial, quanto a subterrânea”, destaca.
Segundo os ambientalistas, isso afetaria diretamente comunidades locais e ecossistemas importantes, como a Área de Proteção Ambiental (APA) do Banhado Grande e o Banhado dos Pachecos.
Projeto anterior foi barrado pela mobilização da população
Em 2020, a tentativa de instalação do depósito de rejeitos foi barrada após mobilização da sociedade, especialmente do Movimento Não ao Lixão, que conseguiu convencer o então prefeito em exercício André Pacheco a revogar a autorização existente. O empreendimento encampado pela empresa Vital/Queiroz receberia rejeitos de aproximadamente 30 cidades. Ficaria localizado nos Distritos do Passo da Areia e Itapuã/Cantagalo, zona rural de Viamão, região de preservação ambiental, com nascentes de água, produção de alimentos orgânicos e territórios indígenas.
Atualmente, o pedido de licenciamento prévio para atividade de aterro sanitário regional está em benefício da Bianchini S/A Indústria Comércio e Agricultura, sob licenciamento único nº 1652/2023, com validade até julho de 2028. A licença autoriza a colocação de resíduos em solo agrícola, tais como lodo da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE), cinza de caldeira e resíduo de varredura.
Impacto sobre comunidade Guarani
“Os povos indígenas possuem a sua existência vinculada à territorialidade. A terra e os recursos naturais são fundamentais à manutenção cultural, social, religiosa, ancestral e até mesmo econômica das comunidades. Assim, qualquer projeto que possa ter impacto em seus territórios deve ser submetido à consulta prévia, livre, informada e de boa-fé, com o objetivo de se chegar a um acordo e conseguir o consentimento acerca das medidas”, ressalta a dirigente do Núcleo Defesa da Igualdade Étnico-Racial, Gizane Mendina Rodrigues.
Conforme reforça a defensora, a consulta é um direito assegurando por convenções internacionais das quais o Brasil é signatário. “No caso em discussão, os indígenas Mbya Guaranis, possíveis atingidos pelo projeto, já possuem um protocolo próprio sobre a forma de realização dessa consulta, o que facilita a sua realização.”
Para o dirigente do Núcleo de Defesa Ambiental, João Carmona, a consulta livre, prévia, informada a populações indígenas é uma garantia legal que as populações indígenas têm quando são atingidas diretamente por empreendimentos desse tipo. “O mais importante, de ponto de vista ambiental, é que os povos indígenas têm um papel crucial a cumprir na preservação ambiental, devido à sua conexão profunda com a flora, com a fauna, com o território, com as águas. Antes de ser um mero cumprimento de uma norma legal, deve ser visto pelos órgãos públicos, pelo poder público, como realmente o cumprimento de um procedimento que visa realmente proteger o meio ambiente.”
Ainda conforme Carmona, o empreendimento em si, com base em toda notícia que se tem, coloca em risco uma zona muito sensível da região e de toda a bacia de uma forma mais ampliada. “Naquele local, pelo que, se sabe, há oito nascentes de cursos d'água. Então aquele empreendimento poderia atingir esses os recursos d'água e o lençol freático, com danos irreparáveis a toda a população”, pontua.
“A DPE-RS cumpre o seu papel de estar ao lado dos segmentos vulnerabilizados - no caso os indígenas - frente ao empreendimento, evitando que ocorra racismo ambiental, o qual acontece quando o passivo de determinadas atividades é suportado de maneira diferenciada, a causar danos a setores discriminados da sociedade”, destaca Rodrigo de Medeiros, Ouvidor-Geral.
A recomendação da DPE-RS dá um prazo de 15 dias para que a Fepam se manifeste sobre a realização da Consulta Prévia. Outros órgãos como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas, o Ministério Público Federal e demais envolvidos também foram comunicados.
Neste link a recomendação na íntegra.
* Com informações do Sul 21
Edição: Marcelo Ferreira