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A história esquecida do acidente de Goiânia, ‘a pequena Chernobyl’

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"Os profissionais de saúde cubanos demonstraram mais uma vez o seu profissionalismo, muito apreciado pelos especialistas do gigante sul-americano, mas, sobretudo, demonstraram o grande valor humano, a dedicação e o espírito de solidariedade que os caracteriza, fruto da sua formação revolucionária e do exemplo de Fidel" - Yamil Lage/AFP
Em outubro de 1992, os pacientes retornaram ao Brasil concluído o tratamento recebido em Cuba

Fidel pegou minha filha Natasha e deu-lhe um beijo, percebi quanta gentileza havia em seus olhos... e confiei mais do que nunca.

Em 13 de setembro de 1987, ocorreu o que foi considerado o pior acidente radioativo da história fora de uma instalação nuclear na cidade brasileira de Goiânia, capital do estado de Goiás, no Brasil.

Dois catadores de lixo, em busca de sucata para vender, entraram em um hospital abandonado e encontraram o que lhes pareceu uma máquina estranha, desmontaram-na e carregaram-na em um carrinho de mão. Já em casa, com o auxílio de chaves de fenda, abriram a tampa de chumbo que lacrava o aparelho, na verdade uma máquina de raio X, e retiraram de dentro um cilindro, depois foram até um ferro-velho com a intenção de vendê-lo.

O dono do ferro-velho guardou o aparelho, dias depois, entrou no local onde havia guardado o cilindro e viu que um “lindo brilho azul” emergia da cápsula, achou que era algo sobrenatural e levou para casa.

O homem distribuiu entre familiares e amigos fragmentos do material que estava dentro do objeto, um material fácil de esfarelar, que virou pó, um pó brilhante. Era cloreto de césio enriquecido com o isótopo radioativo césio 137.

Logo, muitas pessoas ficaram doentes. Cerca de uma dezena foi transferida para um dos hospitais de Goiânia. No total, foram examinadas mais de 110 mil pessoas, das quais 249 apresentavam níveis significativos de material radioativo em seus corpos, centenas de pessoas tiveram contaminações leves e tiveram que ficar em abrigos especiais.

Cuba responde

Cinco anos depois do acidente, em uma das atividades paralelas da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, ECO-92, no Rio de Janeiro, – mais conhecida como Cúpula da Terra –, Terezinha Nunes Fabiano, presidente da Associação das Vítimas, recebeu a proposta de Fidel para cuidar dos afetados pela contaminação radioativa.

“Conhecíamos a experiência cubana cuidando das crianças de Chernobyl, muitas pessoas duvidavam porque haviam sofrido tantas decepções, mas quando no Brasil, Fidel segurou minha filha Natasha e lhe deu um beijo, percebi quanta gentileza havia em seus olhos... e ‘confiei mais do que nunca’”, disse então Terezinha Nunes.

Foi na histórica Cúpula da Terra que o Comandante-em-Chefe da Revolução Cubana, Fidel Castro Ruz, pronunciou estas palavras proféticas: “Uma importante espécie biológica corre o risco de desaparecer devido à rápida e progressiva liquidação das suas condições naturais de vida: o homem.”

Dezenas de pessoas afetadas pela radioatividade receberam assistência médica gratuita em conformidade com o protocolo de colaboração científica com o Brasil, assinado por Fidel durante a ECO-92; As vítimas do acidente partilharam o Campo Pioneiro José Martí de Tarará com 116 crianças ucranianas que sofriam as consequências da catástrofe de Chernobyl, com um grupo de crianças equatorianas e com cerca de 200 asmáticos e diabéticos cubanos em tratamento para estas condições.

Em outubro de 1992, os pacientes retornaram ao Brasil concluído o programa de atendimento e tratamento recebido na Ilha. Viajaram acompanhados por uma delegação de especialistas cubanos que informaram às autoridades sanitárias brasileiras as conclusões diagnósticas e recomendações resultantes das sete semanas de exames que haviam sido submetidos.

Os profissionais de saúde cubanos demonstraram mais uma vez o seu profissionalismo, muito apreciado pelos especialistas do gigante sul-americano, mas, sobretudo, demonstraram o grande valor humano, a dedicação e o espírito de solidariedade que os caracteriza, fruto da sua formação revolucionária e do exemplo de Fidel.

Terezinha Nunes, que viajou para Cuba com as três filhas para receber diagnóstico e tratamento, disse ao sair: “Saio com o coração dividido, porque agora tenho duas pátrias, Cuba e Brasil”.

Epílogo de uma tragédia

• Quatro pessoas morreram e 249 pessoas receberam altas taxas de radiação e hoje sofrem de múltiplas doenças, especialmente cancro.

• As pessoas afetadas pela radiação no incidente sofrem discriminação até hoje.

* Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko