Uma reunião de trabalho realizada na terça-feira (10) na sede da Secretaria Extraordinária para a Reconstrução do RS, em Porto Alegre, colocou em contato empresários do ramo da energia eólica, técnicos de referência internacional no tema e representantes do governo federal que estão dedicados com a retomada do estado frente a catástrofe climática dos meses de maio e junho.
O potencial de geração do estado já foi constatado em estudos realizados quando foi confeccionado o Atlas Eólico do RS, em 2014. O material estabelece a região da Campanha, nas proximidades da fronteira com o Uruguai, como um território ideal para receber investimentos, tanto na construção de parques de aerogeradores, quanto para a instalação de fábricas de implementos e infraestrutura necessárias para a construção destes parques.
Entre as diversas possibilidades apresentadas pelos empresários ao secretário executivo Maneco Hansen, que representou o ministro Paulo Pimenta no encontro, se projetam investimentos que podem chegar a casa de R$ 16 bilhões. O encontro foi intermediado pelo diretor do Instituto Cultural Padre Josimo, Frei Sérgio Görgen, e está inserido nas ações propostas para a transição energética justa e inclusiva nas quais a organização está inserida.
Documento aponta rumos para o setor eólico no RS
Na carta de intenções apresentada ao governo, os empresários destacam “o elevado Potencial Eólico Gaúcho Onshore, dezenas de Projetos já desenvolvidos e licenciados, outros em processo de licenciamento e a existência, embora com a necessidade de ampliação, de Conexão Elétrica ao Sistema Interligado Nacional – SIN, buscar medidas do Governo Federal que possibilitem a instalação desses Parques Eólicos no estado, atraindo investidores nacionais e estrangeiros, gerando emprego e renda para diversos setores da economia gaúcha, inclusive para centenas de proprietários de terra atingidos, ora por enchentes (como neste momento), ora por secas”.
A solicitação de medidas por parte do governo federal refere-se à ciação de um Fundo Constitucional de Financiamento, similar ao existente para o Nordeste do país, dada a necessidade premente de reconstrução do RS; aplicação do Sinal Locacional; e Leilão Regional de Energia. “Estas medidas, que não terão nenhum impacto negativo no orçamento do país, gerarão, inclusive como já foi manifestado por dois fabricantes de aerogeradores, conforme ocorra demanda local, a instalação da Fábricas de Torres de Concreto na Metade Sul do estado. Também é compromisso buscar empresas gaúchas para a realização das obras civis e elétricas”, apontam os representantes das empresas.
Compreenda os três pontos apresentados
No primeiro tópico foram feitas considerações a respeito do leilão de energia, previsto para dezembro de 2024 (Energia A-4 e A-6), considerando-se a atual crise na indústria eólica brasileira, com fechamento de fábricas em toda a sua cadeia, a dificuldade de comercialização de energia no mercado livre e a grande restrição de conexão ao Sistema Elétrico existente na Região Nordeste junto ao sistema de conexão às regiões centro e sul do país. A este respeito colocam como alternativas a grande disponibilidade de conexão ao Sistema Elétrico no RS, que representa inexistência, na prática, de constrained off (cortes de geração por falta de capacidade de transmissão de energia).
Pontos reivindicados junto ao governo são a realização de um leilão regional de Energia Eólica no RS, aproveitando os leilões programados para este ano, elencando a existência de cerca de 9 GW atualmente já aptos no RS, podendo superar a 10 GW até a data do leilão; a realização de leilão de Energia de Reserva Regional (RS), de modo a programar neste e nos próximos 3 a 4 anos leilões nesta modalidade, dedicados à energia eólica. Esta medida permitiria grandes investimentos na infraestrutura do RS, gerando empregos e ajudando a recuperar a economia do estado.
No segundo tópico tratam a respeito do sinal locacional para a energia eólica no RS. Atualmente a comercialização de energia elétrica no Brasil não considera adequadamente o sinal locacional da usina a ser conectada no sistema elétrico. Essa distorção resulta que a maioria dos projetos de geração necessitam de grandes investimentos em sistemas de transmissão de energia, cujo custo é pago por todos os consumidores.
O sinal locacional adequado resultaria na viabilização da geração com menor custo real aos consumidores. Os representantes do grupo técnico explicaram que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) está tentando corrigir essa distorção, por meio das Resoluções REN 1024/2022 e 1041/2022, resultado de quatro anos de estudos técnicos da agência.
No terceiro tópico pautaram o tema do financiamento para a energia eólica no RS, buscando criar condições de financiamento, pelo BNDES, para os projetos eólicos no estado, comparáveis com as condições oferecidas atualmente no Nordeste, pelo Banco do Nordeste (BNB). A solicitação do grupo é a oferta de taxas de juros competitivas, prazo de financiamento longo (de pelo menos 15 anos), prazos de liberação adequados (pari passu com a obra), e início da liberação em até 4 meses após o pedido, bem como alavancagem maximizada, de pelo menos 60% do investimento.
Posicionamento e compromisso
O representante da Integra Energia, João Nunes Ramis, avaliou o encontro positivamente. Para o gestor, que é conhecido nacionalmente pela criação da maior política pública de inclusão via energia elétrica já realizada no mundo – o programa Luz Para Todos -, a Energia Eólica pode ser um vetor decisivo para a recuperação econômica e social do RS.
“Nós temos no RS ventos extremamente bons, atualmente contamos com tecnologias mais avançadas no setor, temos a possibilidade de contar com torres com alturas maiores, aerogeradores com maior capacidade, podendo captar ventos de maior intensidade e uma capacidade de produção de energia eólica muito maior do que atualmente está instalado”, aponta. Para Ramis as obras e depois a operação de projetos de produção de energia eólica podem ser um fator decisivo a contribuir positivamente para a reconstrução do estado, gerando postos de trabalho e contribuindo com geração de renda para o povo gaúcho”, comenta Ramis.
Já o engenheiro Ronaldo Custódio, outra referência no setor em nível nacional e internacional, que já esteve à frente da Eletrosul e foi idealizador do Atlas Eólico do RS, hoje a frente da Cimy Renováveis, aponta que o encontro foi oportuno e os resultados que se projetam são positivos. “O RS precisa de investimento em infraestrutura e o setor eólico tem projetos prontos para implantar, por outro lado a indústria eólica brasileira precisa de investimento.”
Ele relatou que foram necessários muitos anos de trabalho para a estruturação do setor eólico no país. Mas que a falta de investimentos nos últimos anos já resultou no fechamento de três fábricas de equipamentos, restando apenas duas atuando no mercado nacional. “Deu para sentir a sensibilidade do Ministério em relação ao assunto, no sentido de trazer desenvolvimento ao estado e ajudar a indústria de desenvolvimento de equipamento eólicos a não colapsar.” O tempo, destacou ele, é fator preponderante para ambos e "os encaminhamentos necessários precisam acontecer até o final deste ano".
Representando o ministro Paulo Pimenta, o secretário executivo Maneco Hanssen garantiu que é do interesse do governo federal ampliar o diálogo com o segmento eólico e agradeceu a formulação dos pontos de pautas e propostas apresentadas pelo grupo de gestores e técnicos. Uma nova rodada de conversa poderá ser alinhada a qualquer momento, possivelmente já envolvendo também as equipes do Ministério de Minas e Energia (MME), Ministério do Desenvolvimento Indústria e Comércio (MDIC) e Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Edição: Marcelo Ferreira