O Comitê Olímpico Internacional deve banir de vez o regime de apartheid israelense das competições
A maioria dos atletas palestinos não estará nas Olimpíadas. Quatrocentos atletas, treinadores e oficiais desportivos foram mortos em Gaza desde outubro de 2023. Oito atletas irão representar a Palestina esse ano, competindo em atletismo, natação, tiro com arco, taekwondo, judô e boxe.
Símbolos da resistência, no momento mais sombrio da história da Palestina, que há mais de sete décadas vive sobre um regime brutal de apartheid e colonização sionista. Regime que pratica limpeza étnica desde 1948 nos territórios palestinos, roubando terras e recursos naturais, matando e expulsando seu povo originário, cercando, controlando e impedindo seu retorno.
No entanto, diante do apartheid mais longo e considerado o mais cruel, inclusive pelos sul africanos que vivenciaram de perto um regime de apartheid, e do maior e mais intenso genocídio, único televisionado, não há sanções a “Israel” e nem banimento das Olimpíadas até o momento.
Essa semana assistimos aos vídeos da saída de Moazzaz Abiyat das masmorras israelenses. O campeão de fisiculturismo, nativo de Belém na Cisjordânia, foi sequestrado em outubro de 2023 pelo exército israelense e trancafiado na prisão do Deserto do Negev. Um homem atlético, antes sem nenhum problema de saúde saiu do confinamento após nove meses frágil, doente e com sérias limitações de locomoção, após passar por severas torturas e restrições alimentares.
Itamar Ben Gvir, ministro de Segurança de Israel, pisoteou seu corpo pessoalmente. A ocupação militar israelense tem atacado todo movimento esportivo palestino, seja prendendo e torturando atletas, assassinando, restringindo seus movimentos ou destruindo a infraestrutura desportiva.
Noventa por cento das instalações esportivas em Gaza foram destruídas nos últimos 9 meses, três clubes equestres, um campo de beisebol, vários centros de artes marciais, o estádio construído pelas Nações Unidas para desenvolvimento de esportes em Beit Hanoum, um estádio de futebol ao lado do Hospital Indonésio e o escritório do Comitê Olímpico Palestino.
Imagens filmadas por um repórter israelense, em dezembro de 2023, de um campo de futebol de Gaza transformado em campo de concentração viralizaram. Centenas de homens, mulheres e crianças com as mãos amarradas nas costas e vestidos somente com roupas de baixo aparecem no vídeo. Imagens dos soldados israelenses, acompanhados por tanques e apontando suas armas para as centenas de reféns palestinos que foram arrastados a força de suas casas, de escolas que abrigaram famílias e de campos de refugiados.
Dentre as vítimas fatais no esporte estava Nagham Abu Samra, uma das atletas na fila para participar das Olimpíadas, que ganhou a faixa preta em karatê. Montou um centro esportivo em Gaza e completou bacharelado e mestrado em Educação Física na Universidade Al-Aqsa, que foi completamente destruída pelos bombardeios.
Nagham teve sua perna direita amputada e ferimentos na cabeça, por um ataque israelense, no qual também perdeu sua irmã, e depois de alguns dias faleceu devido a gravidade dos ferimentos. Uma atleta inspiração para as jovens palestinas, que apesar de todos os esforços das equipes médicas que a atenderam não sobreviveu por conta do bloqueio imposto a Gaza.
Os hospitais e toda a infraestrutura médica tem sido atacada por drones, jatos e soldados que sitiam e destroem suas instalações. A autorização para atravessar para o Egito e conseguir atendimento chegou tardiamente após sua morte.
Da mesma forma, o corredor de longa distância Majed Abu Marahael, primeiro palestino a competir em jogos olímpicos, em Atlanta 1996, morreu de insuficiência renal por falta de equipamentos e por não conseguir autorização para atravessar a fronteira e receber o tratamento no Egito.
Ataques aéreos israelenses mataram dois jogadores de futebol de praia palestinos, Hassan Abu Zaitar e Ibraheem Qaseeaa, bem como um jogador de basquete, Basem al-Nabaheen, de Bureij, centro de Gaza, onde outra estrela do futebol, Nazzer al-Nashash também estava entre as vítimas. Outras vítimas do genocídio são o treinador de futebol olímpico palestino Hani Masdar e o goleiro do Shabat Khan Yunis Footbal Club, Shadi Abu Al-Araj, morto no massacre de Al-Mawasi nesse último final de semana.
Os ataques aos esportistas não começaram em outubro de 2023. De longa data “Israel” vem impondo restrições à liberdade de circulação dos palestinos, incluindo atletas, principalmente entre a Cisjordânia e Gaza. Atletas palestinos vem por décadas sofrendo interrogatórios em postos de controle israelenses ao viajarem para competições internacionais. Mesmo para treinarem em diferentes regiões palestinas. Muitos jogadores palestinos de futebol tiveram suas carreiras interrompidas por conta de ferimentos causados por disparos das forças de ocupação israelenses, que comprometeram gravemente sua capacidade de prosseguir com as práticas esportivas. Em 2012, por exemplo, “Israel” demoliu um centro comunitário em Silwan, que atendia dois grupos de futebol e 300 crianças.
Em um relatório da Human Rights Watch, foi constatada a existência de quase uma dezena de clubes esportivos que funcionam em territórios de assentamentos ilegais, formados a partir do roubo das terras palestinas na região da Cisjordânia. Alguns desses clubes financiados pelo orçamento público israelense para promover empregos e lazer aos colonos israelenses, ao mesmo tempo que negam o acesso de quadras ou estruturas para a população palestina local, simplesmente pelo fato de serem palestinas.
Movimentos e organizações civis palestinas e militantes pró Palestina espalhados pelo mundo vêm pressionando por sanções ao Regime de Apartheid Israelense. Em 2015, movimentos de solidariedade ao povo palestino em todo o mundo se organizaram para pressionar a FIFA a proibir a participação de “Israel” em competições internacionais devido ao seu regime de apartheid imposto por décadas aos palestinos. A exemplo do que ocorreu em relação ao regime de apartheid na África do Sul, que foi banida dos jogos olímpicos de 1964 a 1992 por conta da pressão do movimento de boicote internacional, que por sua vez, somente caiu por conta da solidariedade internacional em torno dos boicotes, desinvestimentos e sanções que forçaram os Estados a cumprir com suas obrigações e parar de abastecer um regime segregacionista e supremacista. Regime de apartheid que foi derrubado antes de chegar na fase de genocídio como agora assistimos acontecer com o povo palestino.
Enquanto o time de futebol israelense se classificava para as Olimpíadas, o técnico da seleção de futebol Palestina era morto em ataques aéreos do exército israelense. Enquanto jogadores israelenses participavam de competições europeias no Champions League ou Europa League, as estruturas dos times palestinos eram destruídas por ataques aéreos ou transformadas em campos de concentração como o Estádio Yarmouk em Gaza.
De acordo com estimativas da revista científica britânica The Lancet, o número de mortes em Gaza ultrapassa 186 mil e representa 7,9% da sua população total, tornando esse genocídio “o crime do século”. Dessa forma, ao não agirem os estadistas colocam as instituições de justiça internacional em descrédito. Afinal, por qual razão as leis internacionais têm sido aplicadas seletivamente? Por que a “Israel” é permitido fazer tudo, inclusive praticar genocídio televisionado? O Comitê Olímpico Internacional deve corrigir seu curso imediatamente e banir de vez o regime de apartheid israelense das competições. Ou estará escancaradamente passando pano no genocídio infligido ao povo palestino e nas suas violações à humanidade.
* Claudia Santos, da Frente Gaúcha de Solidariedade ao Povo Palestino.
** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko