O direito de antena esbarra nos interesses econômicos dos grandes conglomerados da comunicação
Pensar hoje a conjuntura social brasileira exige que se reflita sobre o papel da comunicação e nisso propor alternativas progressistas diante da acirrada disputa de narrativas com o grande capital em que o uso de fake News é parte desse processo, assim como a presença significativa de concessões de rádio e TV em mãos de setores do agronegócio e de igrejas neopentecostais.
O rádio por sua vez merece atenção especial, pois é um veículo de grande aderência junto às populações pobres e periféricas, bem como no interior do Brasil que, na maior parte das vezes, não tem acesso à internet móvel e paga.
O capitalismo se evidencia ainda mais na comunicação assim como na cultura procurando dominar o simbólico sendo, portanto, urgente e necessário estabelecer estratégias de enfrentamento ao preconceito e intolerância.
Há bem pouco tempo atrás pronunciou-se assim o ministro das Comunicações: "As rádios comunitárias fazem um serviço importantíssimo para facilitar o acesso à informação e serviços pelas comunidades locais", lembrou Juscelino Filho.
Importante passo para avançarmos nessa área será via Plano Nacional de Outorgas (PNO) para radiodifusão comunitária e a expectativa é "ter pelo menos uma rádio comunitária em cada município do país”, segundo a secretaria de Radiodifusão Pública, Comunitária e Estatal do MCom. Deve ser publicado, em breve, o próximo Plano Nacional de Outorgas (PNO) para radiodifusão comunitária. Nesse documento consta o histórico abaixo, importante contextualização para compreensão da realidade atual referente a comunicação comunitária no Brasil:
“O Serviço de Radiodifusão Comunitária, criado pela lei nº 9.612, de 19 de fevereiro de 1998, destina-se, conforme previsão do art. 3º da lei, a (a) dar oportunidade à difusão de ideias, elementos de cultura, tradições e hábitos sociais da comunidade; (b) oferecer mecanismos à formação e integração da comunidade, estimulando o lazer, a cultura e o convívio social; (c) prestar serviços de utilidade pública, integrando-se aos serviços de defesa civil, sempre que necessário; (d) contribuir para o aperfeiçoamento profissional nas áreas de atuação dos jornalistas e radialistas, de conformidade com a legislação profissional vigente; e (e) permitir a capacitação dos cidadãos no exercício do direito de expressão da forma mais acessível possível. Até 15 de novembro de 2023 foram concedidas 5.064 outorgas para o serviço de Radiodifusão Comunitária, sendo que 4.066 municípios são cobertos por pelo menos uma emissora.”
Parece bom, mas é preciso avançar muito ainda para que as rádios comunitárias possam cumprir o papel que lhes cabe no processo de desenvolvimento deste país. Um decreto de 1998, o 2.615, precisa ser revogado, conforme a agenda da Associação Brasileira de Rádios Comunitárias. Esse decreto colocou amarras que não estavam na legislação aprovada, como a restrição da potência para o alcance de um quilômetro e a proibição de publicidade. Eis aí uma faceta concreta da disputa do grande capital na comunicação que se materializa na criminalização das práticas de comunicação comunitária.
Já um avanço que merece ser mencionado é uma portaria da Secretaria de Comunicação que vai permitir às rádios comunitárias captar apoio cultural do Governo Federal. É um começo, pois faltam ainda que Estados e Municípios também incluam as comunitárias nas receitas das propagandas de ações dos seus governos.
As rádios são concessão pública e as comunitárias, especialmente, devem ter o reconhecimento do seu trabalho de base, pois podem garantir o direito à comunicação, que pode dar acesso a outros direitos humanos e assim contribuir para a construção de uma sociedade democrática de fato.
Atualmente é fato que o direito de antena esbarra nos interesses econômicos dos grandes conglomerados da comunicação, nas mãos de algumas famílias, e sua influência no Congresso Nacional. Assim, fortalecer as rádios comunitárias é fortalecer uma instância que tem organização nacional com capilaridade como a Abraço.
Por hora a Gira Negra Gaúcha alinha-se ao entendimento de que é indispensável o fortalecimento da Radiodifusão Pública, através da expansão do serviço de radiodifusão comunitária.
* André de Jesus, Ator/Ponteiro de Cultura, Locutor, ArteAtivista e Produtor Cultural.
** Richard Serraria, poeta/cancionista e tocador de Sopapo, Dr. Estudos Literários Ufrgs.
*** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko