O Conselho Municipal de Saúde de Porto Alegre (CMS/POA) aprovou, em votação realizada no dia 4 de julho, uma série de medidas para suspender o andamento do projeto do governo Sebastião Melo (MDB) que pretende construir nova sede para o Hospital Materno Infantil Presidente Vargas (HMIPV) e repassa-lo à iniciativa privada. Para a entidade, o projeto que contraria as deliberações dos conselheiros ameaça de terceirização total o único hospital municipal especializado em maternidade e infância com estrutura 100% pública.
Entre as medidas aprovadas pelo CMS/POA está a solicitação para suspender a execução do andamento do projeto de lei aprovado pela Câmara Municipal em 24 de junho que autoriza o poder Executivo a contratar operação de crédito com o Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo SUL (BRDE), até o valor de R$ 300 milhões, para a construção do novo prédio do HMIPV. Também a suspensão dos efeitos administrativos decorrentes do projeto de lei no âmbito do SUS municipal.
Segundo a entidade, também será informado aos órgãos de controle sobre o descumprimento, por parte do município, da decisão judicial de 2017 que determina à Prefeitura de Porto Alegre que inclua previamente o CMS nas deliberações sobre novos contratos, convênios e projetos que venha a incidir no âmbito do SUS municipal.
O Conselho, que faz o controle social do SUS na capital gaúcha, informa ainda que cobrará do secretário de Saúde, Fernando Ritter, por via administrativa, justificativa com estudo técnico que comprove necessidade da mudança e construção do hospital.
“Para o controle social do SUS, que lutou pela conquista do Presidente Vargas, é preciso que o governo apresente uma análise técnica que comprove a necessidade para a saúde pública de Porto Alegre de contratar empréstimo para a construção de uma nova sede para o Hospital. Além disso, que o estudo apresente os motivos que levaram o Município a querer repassar o Hospital para um ‘Parceiro Público Privado’. Caso contrário, o governo Melo evidencia que pretende apenas dar seguimento a um projeto neoliberal de terceirização irrestrita dos serviços e de entrega dos equipamentos públicos para a iniciativa privada, se exonerando cada vez mais da responsabilidade sanitária com a cidade”, afirma o CMS em nota.
A entidade afirma que teve conhecimento do projeto através de notícia na mídia, em fevereiro de 2024. Na ocasião, a prefeitura divulgou o plano do novo hospital, que pretende construir na avenida Érico Veríssimo, o modelo de terceirização que será estabelecido e a proposta de investimento financeiro.
“Chama atenção o investimento de recursos financeiros volumosos no projeto de construção do novo prédio onde o hospital seria instalado. Levando em conta o atual cenário de emergência em saúde, após a situação de calamidade pública, existem demandas prioritárias como o investimento na Rede de Atenção Básica e na Rede de Atenção Psicossocial, que foram as prioridades deliberadas na Conferência de Saúde de 2023”, prossegue.
Segundo o CMS, o governo não cumpre, com este projeto e com as demais terceirizações na Saúde, as deliberações votadas pela sociedade nas Conferências Municipais. Na mais recente, a nona edição realizada em 2023, entre as deliberações figurou o "fim das terceirizações e privatizações no SUS como mecanismo para a garantia do comando único na gestão do SUS para a efetivação dos princípios de universalidade, integralidade e equidade, por meio de contratação de servidoras/es públicos, com relação de trabalho estável, possibilitando condições para a construção de vínculos de atenção e cuidado com a comunidade, fundamental para a efetividade do Controle Social".
O que diz a Secretaria Municipal de Saúde
Ao Brasil de Fato RS, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) disse que o projeto não trata de terceirização, mas da “modernização do HMIPV”. Afirma que o hospital continua sob administração municipal. “Apenas repassamos a bata cinza, que são os 50 contratos parceirizados. As atividades fins continuam com os profissionais do HMIPV e SMS, sob a tutela da prefeitura”, explica.
A parceria no modelo de concessão administrativa, conforme prossegue a nota do município, “contempla obra civil (projeto, licenciamento e construção), investimento e implantação da infraestrutura, equipamentos mobiliários clínicos e administrativos e fornecimento de serviços de apoio à assistência à saúde (por exemplo, recepção, portaria, lavanderia, limpeza, alimentação e nutrição)”.
A SMS defende que o futuro hospital terá aumento na sua complexidade, com 28 novos leitos e ampliação de 97% em sua área total, passando de 16.500 metros quadrados para 35.000 metros quadrados. Que a implantação de novos leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI), salas cirúrgicas e implementação de cirurgia robótica vão proporcionar maior eficiência.
“Os serviços serão mantidos com a economia de R$ 2 milhões mensais com contraprestação conforme licitação, de R$ 12 milhões para cerca de R$ 10 milhões, melhorando os processos de trabalho por meio da parceria”, afirma.
O município, diz a secretaria, deverá aplicar R$ 300 milhões até 2026, por meio de financiamento, na construção do prédio e na compra de equipamentos, com aporte inicial do parceiro privado será de R$ 148 milhões. Esse investimento privado será pago pela prefeitura dentro contraprestação mensal, “que neste caso é composta pelo custo operacional (opex) mais o pagamento do financiamento, totalizando R$ 10,2 milhões”. O Investimento total, em 20 anos, será de R$ 605 milhões.
Ainda conforme a nota, além da realização de audiência pública, para desenvolver o projeto da PPP, representantes da Secretaria Municipal de Parcerias (SMP), da SMS e do HMIPV buscaram experiências consolidadas e visitaram outros hospitais. Também foi analisado o modelo da primeira experiência de parceirização na área da saúde pública no Brasil, do Hospital do Subúrbio, em Salvador (BA).
Com relação à votação do Conselho Municipal de Saúde, que determinou a suspensão de todo o processo, a SMS não se manifestou.
Edição: Katia Marko