Rio Grande do Sul

Coluna

As lições das eleições na França

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As ruas são tomadas na França após projeções confirmarem vitória da coligação de esquerda na eleição legislativa neste domingo (7) - Emmanuel Dunand / AFP
Não basta derrotar eleitoralmente a extrema direita, é preciso derrotar, no campo da sociedade

As eleições parlamentares na França, ocorridas neste domingo, dia 7 de julho, deixam algumas oportunidades de interpretação. O que permite avançar em debates essenciais: qual a perspectiva da superação do neoliberalismo? Da conquista de novos direitos fundamentais? Evidentemente que este debate está relacionado a dois aspectos. Quais as perspectivas da extrema direita e qual a perspectiva da esquerda?

A primeira lição: não se podem subestimar os impactos dramáticos para a humanidade, no campo das conquistas civilizatórias. A extrema direita, que se reapresentou com potência aderindo frontalmente à razão neoliberal, continua crescendo política e eleitoralmente no mundo todo. Mesmo não tendo chegado aos governos, as eleições espanhola, portuguesa, britânica, francesa e igualmente para o Parlamento Europeu serviram de oportunidades para a ampliação da influência do reacionarismo. O supremacismo europeu, o combate aos imigrantes, as políticas de mercado e privatização tiveram audiência entre a base dessas sociedades e resultaram em aumento das bancadas parlamentares de extrema direita na Europa.

Segunda lição: política não é um concurso de TV ou reality show, tampouco eleições são um jogo. Trata-se de um processo de luta pela conquista de hegemonia, portanto, de defesa de valores. No caso desta quadra do século XXI, de embate entre valores democráticos e igualitários e valores reacionários e conservadores. Não basta reduzir a ação política ao empreendimento eleitoral. Se a extrema direita percebeu que - e por isso cresce - seu campo de luta é a sociedade e a partir disto busca os resultados eleitorais, não podemos acalentar uma esquerda que reduz seu campo de luta às eleições e a partir disso espera, em vão, que suas ideias repercutam na sociedade.

Terceira lição: o reconhecimento do tipo de disputa e da leitura da conjuntura deve resultar em uma estratégia adequada. A esquerda francesa liderou um processo de construção de frente única com os conservadores de centro para obstruir a chegada da extrema direita ao governo. É preciso entender politicamente a importância dessa estratégia, que a seus termos foi aplicada também no Brasil com a vitória de Lula. A estratégia de frente é sempre fundamental quando se vive uma situação difícil para os trabalhadores, neste caso para o programa de superação do neoliberalismo. Como diz Trotsky, “para aqueles que não compreendem isso, o partido é somente uma associação de propaganda, e não uma organização de ação de massas”.

Quarta lição: para se construir uma grande frente em defesa dos valores da igualdade e derrotar, não somente a extrema direita e todas suas correntes políticas, mas também o neoliberalismo, é preciso construir uma frente de esquerda que se constitua como um polo de direção política programática desta frente ampla. Para que essa frente ampla, se dirigida pelos conservadores, não se resuma a um interregno no avanço da extrema direita e acabe por chocar o ovo da serpente. A construção da Nova Frente Popular, constituída por várias e distintas correntes de esquerda e centro-esquerda francesa, foi essencial para articulação da estratégia que derrotou nestas eleições a extrema direita.

Quinta e derradeira lição: não basta derrotar eleitoralmente a extrema direita, é preciso derrotar, no campo da sociedade, as políticas neoliberais pró-mercado e de eliminação de direitos. Disputar e defender conceitos e valores como solidariedade, igualdade, tolerância, comunidade, cooperação, entre outros, é defender outra visão de mundo que não a da competição e individualismo, que dá base moral ao neoliberalismo e ao segregacionismo. É o neoliberalismo que alimenta a extrema direita e o que dá base para o crescimento desse flagelo que enfrentamos no mundo neste século. Abdicar desta disputa é não enfrentar o que dá causas ao crescimento do reacionarismo.

* Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko