Ética na política, mística e política, para um outro mundo possível, mais que urgente e necessário
À Matilde Cecchin, militante das melhores causas e sonhadora do cuidado com a Casa Comum
As palavras proféticas do Papa Francisco nas suas Encíclicas, em especial na ´Fratelli Tutti´, são referência da Boa Nova, de política com ética e mística e de uma Sociedade do Bem Viver: “Fazer política inspirada no Evangelho a partir do povo em movimento pode se tornar uma maneira poderosa de sanar nossas frágeis democracias e de abrir espaço para reinventar nossas instâncias representativas de origem popular.”
O Projeto Encantar a Política, por iniciativa da CNBB, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, e do CNLB, Conselho Nacional de Leigos do Brasil, surgiu em 2020 em meio ao cenário de emergência durante a pandemia da covid, com agonia, retrocessos e um ´povo triste e abatido´, nas palavras de Sônia Gomes de Oliveira, presidente do CNLB. A partir daí, representantes de diversas organizações da Igreja católica construíram o Caderno Encantar a Política, uma publicação com cinco capítulos, que discute conceitos como Ética da Política, Amor cristão, o Cuidado com a Casa Comum e um Capítulo dedicado ao debate sobre Eleições e Democracia, a partir dos ensinamentos do Papa Francisco.
O nº 8 da revista Casa Comum, de 2024, sob responsabilidade do Sefras, Serviço Franciscano de Solidariedade, e com apoio da Editora Paulus, tem como tema Reencantar a Política: Pela Mobilização das Urnas e das Ruas. Fábio Paes, coordenador da Revista, escreve no Editorial, com o título Democracia e o Pão Nosso de Cada Dia: “Assim, a revista assume o compromisso de trazer o contexto histórico e, também, pistas práticas de mobilização para o processo eleitoral de 2024 de forma crítica, comprometida e mobilizadora na família, na vizinhança, na comunidade, na escola, na empresa, na igreja, nas praças e em qualquer espaço do dia a dia. É preciso ocuparmo-nos da política como exercício de uma sociedade fraterna, que cuida e defende todos os seres, inclusive os não humanos. Para isso, temos a possibilidade, como sujeitos e coletivos, de encantar a política, com novas ações de mobilização e com indicações de representações que sejam mais sensíveis às dores da terra e dos mais pobres.”
A partir do Projeto Encantar a Política, e tendo em vista a conjuntura brasileira e a realização de eleições municipais em 2024, surgiu o apoio de novos parceiros, como o Movimento Fé e Política, o Núcleo de Estudos Sócio-políticos da PUC-Minas, a proposta do Mutirão pela Democracia. Este Mutirão faz processos de formação, organiza reflexões e quer ajudar a mobilizar pastorais, movimentos sociais e populares e todas as mulheres e homens de boa vontade dispostos a ajudar a Encantar a Política e a construir uma Sociedade do Bem Viver.
Quais são alguns elementos do contexto que tornam a eleição municipal de 2024 especial?
1. O ultraneoliberalismo reinante no Brasil e no mundo. 2. A volta do neofascismo e da direita no Brasil nos últimos anos, e em países como a França e países latino-americanos, colocando em risco a democracia. 3. A paz em cheque no mundo, com ameaças de uma terceira guerra mundial, que poderá ser nuclear. 4. A desigualdade econômica e social em crescimento no Brasil e no mundo. 5. A violência no Brasil, especialmente contra jovens, mulheres e população LGBTQIA+. 6. As mudanças climáticas, não só com as chuvas, tragédia e caos no Rio Grande do Sul, mas a seca no Pantanal, na Amazônia, o calor nos EUA e na Europa, em todo planeta Terra. 7. O mundo atravessa uma crise civilizatória, que ameaça seu futuro, que coloca em risco os direitos, em especial da classe trabalhadora e dos mais pobres entre os pobres, a paz e a democracia.
As eleições municipais de 2024 poderão, ou melhor, deverão ser um espaço e oportunidade de ouro para discutir um projeto democrático de sociedade e uma proposta de desenvolvimento inclusiva. Alguns temas são centrais: saúde, depois da pandemia, da dengue e tudo mais, a questão climática, a segurança pública com direitos e cidadania.
O Papa Francisco escreve na Fratelli Tutti: “E poderá o mundo funcionar sem política? Poderá encontrar um caminho eficaz para a fraternidade universal e a paz social sem uma boa política? (nº 176) ‘Precisamos duma política que pense com visão ampla e leve por diante uma reformulação integral, abrangendo num diálogo interdisciplinar, capaz de reformar as instituições, coordená-las e ditá-las de boas orientações, que permitam superar pressões e inércias viciosas (nº 177). Trata-se de avançar para uma ordem social e política cuja alma seja a caridade social. Convido uma vez mais a revalorizar a política, que é uma sublime vocação, é uma das formas preciosas de caridade, porque busca o bem comum (180). A partir do ´amor social´, é possível avançar para uma civilização do amor a que todos nós podemos ser chamados. Com o seu dinamismo universal, a caridade pode construir um mundo novo. O amor social é uma ´força social capaz de suscitar novas vias para enfrentar os problemas do mundo de hoje e renovar profundamente, desde o interior, as estruturas, organizações sociais, ordenamentos jurídicos” (nº 183).
“Alguém ajuda um idoso a atravessar um rio, e isso é caridade primorosa; mas o político constrói-lhe uma ponte, e isto também é caridade. É caridade se alguém ajuda outra pessoa fornecendo-lhe comida, mas o político cria-lhe um emprego, exercendo uma forma sublime de caridade que enobrece a sua ação política” (nº 186).
“Na política, há lugar também para amar com ternura. A ternura é o caminho que percorreram os homens e as mulheres mais corajosos e fortes. No meio da atividade política, os mais pequeninos, frágeis e pobres devem enternecer-nos: eles têm o direito de arrebatar a nossa alma, o nosso coração. Sim, eles são nossos irmãos e, como tais, devemos amá-los e tratá-los” (nº 194, Fratelli Tutti).
Um Mutirão pela Democracia é a proposta e a ação em 2024, com ética na política, mística e política, para um outro mundo possível, mais que urgente e necessário, na garantia e construção de direitos, paz, soberania, igualdade, numa sociedade do Bem Viver.
* Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko