A prefeitura de Porto Alegre informou em nota, na quarta-feira (3), que não vai renovar o contrato com a Pousada Garoa para acolhimento de pessoas em situação de rua. O anúncio foi feito horas após o relatório das visitas às pousadas que identificou diversos problemas ter sido divulgado pela Zero Hora. Além disso, o conteúdo de documentos relativos a vistorias anteriores, divulgados pela Matinal, apontam que fiscais da prefeitura já tinham relatado péssimas condições, antes do incêndio na unidade da Av. Farrapos que vitimou 11 pessoas.
A pousada atingida pelas chamas era umas das conveniadas com a prefeitura de Porto Alegre e não tinha alvará e nem Plano de Prevenção e Proteção Contra Incêndios (PPCI). A rede recebeu mais de R$ 5,8 milhões entre 2023 e 2024 dos cofres públicos pelo serviço. Ao mesmo tempo, desde 2021, as más condições têm sido alvo de denúncias por parte do deputado Matheus Gomes (PSOL), na época vereador da Capital.
No final de abril, após o incêndio, o então secretário de Desenvolvimento Social Léo Voigt disse desconhecer as más condições da pousada e ela estava “totalmente regular”. Pouco tempo depois, ele pediu exoneração do cargo. A informação do desconhecimento pela prefeitura até o recebimento do relatório atual foi reafirmada nesta quarta-feira (3) à Zero Hora, que divulgou detalhes e fotos das inspeções realizadas entre 29 de abril e 3 de maio.
À Zero Hora, o secretário de Desenvolvimento Social, Jorge Heleno Brasil, disse que a não identificação dos problemas antes do incêndio ocorrer está sendo apurada em procedimento sumário, que não foi concluído por causa da enchente. Segundo ele, será verificado se o trabalho ocorria como deveria. Destacou ainda ainda a dificuldade da adesão da população de rua aos serviços oferecidos pela Fundação de Assistência Social (Fasc).
Já o ex-secretário Voigt disse que foi uma surpresa “que várias unidades deveriam ser alvo de readequações e algumas, inclusive, interditadas por risco diante de um incêndio”. Ele não recomenda a descontinuidade do serviço, que considera importante. Em vez disso, defende um Termo de Ajustamento de Conduta à PMPA e a empresa Garoa.
Sem as míminas consições sanitárias e de segurança
Segundo a nota da prefeitura, as vistorias realizadas entre 29 de abril e 3 de maio identificaram problemas estruturais, de higiene e de segurança na maior parte das 23 unidades da rede de pousadas.
“Quartos sem janela, pouca iluminação e com falta de circulação de ar. Corredores sem a largura exigida, escadarias fora dos padrões prejudicando o acesso às portas de saída no caso de emergências. Muita infiltração. Problemas estruturais e elétricos graves. Ambientes sujos, presença de insetos, principalmente baratas. Cozinhas em estado precário, com excesso de gordura e sujeira, fiação elétrica exposta, tomadas expostas, com fogões velhos e em bancadas de madeira. Teto de isopor”, resume a reportagem da Zero Hora sobre a situação apresentada no relatório.
A prefeitura disse ainda que antes do incêndio de abril, equipes da Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc) já haviam começado a transferência das pessoas para outras unidades, como abrigos, casas de passagem, albergues e Centros Pop, de modo a reduzir a ocupação em pousadas.
Das 308 pessoas que estavam sendo abrigadas na Garoa após o incêndio, conforme o Executivo municipal, 66 seguem acolhidas. Mas o contrato não será renovado e essas pessoas serão transferidas para casas de passagem nos próximos meses.
Entre as recomendações, prossegue a nota, está a elaboração de legislação municipal que regulamente as condições mínimas sanitárias e de higiene para pensões/alojamentos, além de alterar o enquadramento da atividade citada de risco I (leve ou irrelevante) para II (risco médio) ou III (risco alto), exigindo assim vistoria para o licenciamento sanitário, hoje inexistente.
Relatórios anteriores já apontavam problemas
Reportagem da Matinal aponta que a prefeitura já sabia do risco de incêndio na pousada da Garoa na Av. Farrapos. O alerta partiu de uma servidora da Fasc que encaminhou o relato à direção da fundação em maio de 2023.
Apesar do risco de incêndio identificado, a equipe escreveu que o local era “adequado à realidade que se propõe, sendo que a organização e capricho dos usuários são fatores que fazem a diferença na rotina diária”.
Os emails que registram a situação, aos quais a Matinal teve acesso, foram enviados a vários servidores da Fasc. Porém, apesar de conhecer as más condições, a prefeitura publicou, em dezembro de 2023, um termo aditivo para mais um ano de contrato.
A Matinal informa que questionou a Fasc a respeitro dos relatórios enviados pelos fiscais, mas não teve resposta até o fechamento da reportagem.
* Com informações da Zero Hora, da Matinal e da prefeitura de Porto Alegre.
Edição: Marcelo Ferreira