Rio Grande do Sul

Análise

Ecofeminismo: estupro e inundação

'O direito das mulheres e a reparação dos ecossistemas remetem a questões de dominação, ao sistema de poder'

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Manifestação em São Paulo contra PL 1904, que propõe equiparar realização de aborto ao crime de homicídio - Paulo Pinto/Agência Brasil

Aprendi com a Natureza a me deixar cortar e voltar sempre inteira. Cecília Meireles.

“As mulheres são uma força da natureza, a força do feminino que também é da Mãe Terra.” Essas palavras resumem as ideias de uma live de Carlos Harmit sobre as manifestações das mulheres em todo Brasil contra o PL do Estuprador, que encaminhei para a amiga Cidara Loguércio. Ela me retornou com as seguintes mensagens reflexivas, percebidas por mim, advindas do coração e da mente.

“Num país fundado no estupro da Mãe Terra e das mulheres, essa pauta de defesa de estuprador não é em vão, né? E quando ele fala da ‘força da natureza’ das mulheres, penso que também está aí o elo, não? Um movimento forte contra a violência sofrida pelas mulheres e que cresça na defesa da Mãe Terra, também violentada.”

Respondo entusiasmada: “Cidara! Estás colocando na roda a alma do ecofeminismo. As mulheres são oprimidas e a natureza agredida, ou seja, são violentadas pela mesma estrutura de poder, oriunda do sistema capitalista-patriarcal, o direito das mulheres e a reparação dos ecossistemas remetem a questões de dominação, ao sistema de poder”.

O movimento feminista surgiu em meados do século 19 reivindicando direitos básicos. A reivindicação pelo direito de eleger e ser eleita, constitui a primeira onda, como referência temos as sufragistas. A questão cultural caracterizou a segunda onda no início do século 20, com a emblemática obra de Simone de Beauvoir, O Segundo Sexo. Em 1974, o termo ecofeminismo aparece no texto “O feminismo ou a morte”, de Françoise D’Eaubonne, concebendo a terceira onda. Somente em 2020 sua obra foi editada pela Le Passager Clandestin, de Paris. Considero que o século 21 acolhe a quarta onda com o movimento mais amplo em reconhecimento à diversidade sexual e de gênero do LGBTQIA+.

Essa força da natureza reúne todos os matizes dos movimentos feminista e ecologista. É uma luta para garantir a supremacia e autonomia de todos os seres e paisagens.

Chamemos atenção através de nossos gritos nas ruas e a Mãe Terra, apresenta sintomas dos maus tratos sofridos, inundando campos e cidades nessa ampla ação política de resistência. 

A ex-Casa do Povo, hoje a maioria do Congresso, e alguns outros níveis de governo, um exemplo é Eduardo Leite e Sebastião Melo, abrigam representantes dessa ganância do capital, que tentam controlar e encarcerar essa potência que vai transformar a sombra em luz.

Em nota técnica, cientistas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) detalham o desmonte da legislação ambiental no estado, afirmando que as mudanças no novo Código Estadual do Meio Ambiente parecem obedecer a três princípios: eliminar, enfraquecer, subverter. Três princípios que são sentidos também nos corpos físico, emocional e mental das mulheres e no nosso Planeta Terra, Planeta Vivo Gaia, a Mãe Terra, que tem como o maior estuprador o setor da mineração.

Busquemos a ampliação da consciência, sensibilidade e força para que nós mulheres nos empenhemos em reverter o quadro de subordinação da natureza, das nossas iguais e de nós mesmas.

* Naia Oliveira é socióloga e ecofeminista.

** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.

Edição: Marcelo Ferreira