Rio Grande do Sul

Direito à moradia

Após ocupação do Palácio Piratini, MLB será recebido pelo governador na próxima semana

Durante a manifestação, BM impediu ônibus do movimento de deixar as mediações alegando agressão a policial da reserva 

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Brigada Militar foi acionada durante ação no Palácio Piratini das famílias que foram despejadas da Ocupação Sarah Domingues - Foto: Rafa Dotti

Em mais uma ação por garantia de moradia no estado, o Movimento de Luta em Bairros Vilas e Favelas (MLB) ocupou, nesta segunda-feira (24), o saguão do Palácio Piratini. Ação aconteceu depois de uma reunião com a Secretaria de Habitação e Regularização Fundiário (Sehab) não ter apresentado solução para as famílias despejadas da Ocupação Sarah Domingues. O movimento conseguiu se encontrar brevemente com o governador Eduardo Leite (PSDB), que se comprometeu a agendar um encontro para a próxima segunda-feira (1º), às 14h, para ver uma solução.

Na ocasião o governador teria garantido a integridade dos manifestantes. Quando as famílias se dirigiam aos ônibus, foram impedidas de deixar local pela Brigada Militar (BM), que alegou que um dos coordenadores do movimento, Luciano Schafer, teria agredido um policial militar da reserva que atua na segurança do Palácio Piratini, e que o mesmo teria perdido um dente. 

A BM teria tentado fazer a prisão em flagrante. “Trata-se de uma lesão corporal grave com a perda de definitiva de um membro”, disse o major Riccardi, do 9º Batalhão de Polícia Militar, à imprensa.

O movimento ressalta que não houve agressão e sim que Luciano teria sido mordido pelo brigadiano em questão. “Não houve confronto, a gente entrou e o cara da segurança quis empurrar a gente", afirmou Priscila Voigt, integrante da coordenação do MLB. 


Com a intermediação dos deputados estaduais Miguel Rossetto (PT) e Matheus Gomes (PSOL), o impasse entre BM e movimento foi resolvido / Foto: Rafa Dotti

O impasse durou mais de uma hora e foi resolvido com a intermediação dos deputados estaduais Miguel Rossetto (PT) e Matheus Gomes (PSOL). Durante as negociações, advogados do MLB reivindicaram que as imagens das câmeras do Palácio Piratini sejam disponibilizadas.

Conforme explicou o Matheus Gomes, a atuação dele juntamente com Rossetto aconteceu para que o acordo entre governador Eduardo Leite e o MLB fosse garantido pela Brigada Militar. 

“O governador afirmou dentro do Palácio Piratini que haveria uma reunião na segunda-feira que vem, atendendo a reivindicação do movimento por moradia e também garantiu que eles sairiam de lá sem qualquer tentativa de criminalização. A Brigada Militar atuou no sentido contrário. Então tanto eu como o deputado Rossetto intervimos para garantir o cumprimento do acordo político que foi estabelecido anteriormente”, disse.

O integrante do MLB e o policial militar da reserva prestaram depoimento no Palácio da Polícia na noite desta segunda-feira. Luciano foi conduzido pelos parlamentares. 

“Queremos moradia, as pessoas estão sem casa há dois meses”

Cerca de 100 famílias, a maioria oriunda de bairros da Capital atingidos pelas enchentes, como Sarandi e Humaita, e da cidade de Eldorado do Sul, ocuparam no dia 15 de junho o antigo prédio da Fundação Estadual de Proteção Ambiental Henrique Luis Roessler (Fepam), no Centro Histórico de Porto Alegre, abandonado há mais de 10 anos. No dia seguinte, a ocupação articulada pelo MLB foi surpreendida por uma ação da Brigada Militar que desocupou o prédio. Durante a ação, segundo relatos de pessoas que estavam no local, foram registrados episódios de agressão cometidos por agentes policiais. 

Em nota, a Brigada Militar afirmou que foi acionada para intermediar a retirada de ocupantes de um prédio público estadual, localizado na avenida Júlio de Castilhos, em razão do perigo à segurança das pessoas na edificação. Ainda segundo a nota, o prédio já havia sido interditado por apresentar risco de queda de marquises - por conta da chuva que chegou ao estado, as famílias se abrigaram embaixo da mesma marquise durante a remoção. 

Essa foi a quarta ocupação de imóveis na Capital desde as enchentes que tomaram conta do estado no início de maio, atingindo mais de 160 mil moradores na Capital. 

Segundo Priscila, no dia seguinte ao despejo, o movimento se mobilizou e pressionou o governo para uma solução para as famílias. A pressão surtiu efeito e uma agenda foi marcada na tarde desta segunda com a Secretaria de Habitação e Regularização Fundiário (Sehab), conduzida pelo secretário adjunto Roger Vasconcellos, no Centro Administrativo de Contingência.. 


Após resolução famílias puderam sair do local / Foto: Rafa Dotti

"Nos deu uma resposta que não tem prédio nenhum"

De acordo com a militante, o secretário teria se comprometido a apresentar uma lista de móveis e terrenos que poderiam ser doados para a construção de moradias pelo Minha Casa Minha Vida Entidades. Contudo, na reunião realizada antes do MLB ocupar o Palácio Piratini, o retorno foi diferente.

“Nos deu uma resposta que não tem prédio nenhum, não tem terreno, todos que tem estão em processo de permuta. O que ouvimos era que esse prédio da Fepam vai entrar, provavelmente, em um processo de retrofi (reivindicção do movimento). Perguntamos se ele vai entrar nesse processo, porque ele não pode ser cedido ao movimento, e nós entrarmos com o projeto habitacional, e ele disse que não era uma decisão que cabia a ele. Dissemos então vamos conversar com quem manda”, conta.

Foi quando o movimento foi ocupar o Palácio. O encontro com o governador no saguão não durou 15 minutos. Ao movimento, Leite afirmou que o prédio da Fepam está comprometido devido a um incêndio e que não podia deixar ninguém ficar lá com essas condições. "Já determinei que aquele prédio seja trabalhado na lógica de habitação de interesse social. É o caminho que a gente tem que adotar para aquele prédio e outras unidades”, afirmou. 

 
Segundo a plataforma Mapa de Imóveis desenvolvida pelo governo do estado, o Executivo estadual possui ao todo 12.433 imóveis (8.165 na zona urbana), destes 3.100 estão sem destinação e 75 à venda. 

De acordo com o Observatório das Metrópoles e o Censo de 2022, de 686.414 domicílios particulares permanentes em 2022 na capital gaúcha, 558.151 estavam ocupados, 101.013 vagos e 27.250 eram de uso ocasional.

Movimentos de luta por moradia reivindicam que os prédios ociosos da capital gaúcha sirvam de moradia digna para a população de baixa renda, em detrimento de propostas do poder público como cidades provisórias, aluguel social e construção de novas residências para combater o déficit habitacional, agravado pela catástrofe climática que se abateu sobre o Rio Grande do Sul.

Quando o governador saiu do Palácio, as famílias o interpelaram cobrando uma solução. “É um absurdo que dois meses [depois da enchente] ainda estejamos sem casa e não tem uma moradia construída”, afirmou uma das manifestantes. Em reposta Leite disse que "é muito mais complexo do que se imagina".

De acordo com Priscila, muitas das famílias da ocupação estão abrigadas em casa de familiares.

 
Pela rede social do MLB, Luciano fez um balanço do dia e afirmou que ocupação saiu vitoriosa. “Vamos seguir mobilizando e seguindo a nossa luta."

 
Situação exige "sensibilidade às propostas dos movimentos sociais"

Para o deputado Matheus Gomes, a questão da moradia exige uma sensibilidade dos governos à proposição feita não só pelo MLB, mas também pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e outras organizações, de que prédios públicos desocupados sejam revitalizados e incluídos nas negociações com o governo federal, para servirem como moradia popular a quem perdeu tudo nas enchentes. "É uma saída inteligente que pode significar o início de uma reforma urbana democrática que traga a periferia para a região central e consiga, através da moradia, combater desigualdade econômica e social como um todo”, ressalta.

O episódio aconteceu no dia que o governador apresentou na Assembleia Legislativa o Plano de Reconstrução do Estado. “Enquanto Leite colocar a Brigada Militar como interlocutora para a crise da moradia, o que acontece é só violência. É preciso que o governo do estado libere recursos do Fundo de Reconstrução para moradias nas cidades. É isso que estamos defendendo”, afirma o deputado Rosseto. 

A proposta em relação ao Fundo de Reconstrução é encaminhada pela bancada da Federação Brasil da Esperança (PT/PCdoB). Entre os pontos defendidos está a destinação de recursos ao Sistema Estadual da Habitação de Interesse Social – SEHIS (Lei 16.138/2024) - renda mensal bruta por família de até cinco salários mínimos; regularização fundiária; construção; aquisição; reforma; ampliação; repasse de recursos aos municípios; habitação temporária.

De acordo com o último balanço da Defesa Civil, divulgado na tarde desta segunda-feira (24), o RS tem até o momento 388.781 pessoas desalojadas. Na atual atualização não consta o número de pessoas em abrigos. Até o dia 14 havia 10.793 pessoas acolhidas. O estado registra 178 óbitos e 34 pessoas desaparecidas por conta das cheias.. 

O Brasil de Fato RS entrou em contato com o governo do estado e pediu a confirmação do destino do prédio da Fepam, assim como o levantamento de outros prédios ociosos e sua possível destinação para uso de interesse social. 

Sobre o ocorrido, em nota enviada nesta quarta-feira (26), após a publicação da matéria, o governo do estado faz o seguinte esclarecimento: 

Um grupo de manifestantes do Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB) esteve no saguão do Palácio Piratini por volta das 17h15 desta segunda-feira (24/6). 

Os manifestantes forçaram a entrada após um dos líderes do movimento ter agredido com um soco na boca um tenente da Brigada Militar que estava na portaria. O tenente, de 68 anos, teve um dente arrancado pela agressão. Nenhum manifestante sofreu qualquer agressão.

O governador Eduardo Leite, que naquele momento seguia para embarque para Brasília, retornou e conversou com os manifestantes no saguão. Foi agendada uma reunião com o governador para a próxima segunda-feira, às 14h, para ouvir as demandas do movimento.

Cabe lembrar que o mesmo grupo havia sido recebido mais cedo pela Secretaria de Habitação e Regularização Fundiária (Sehab), no Centro Administrativo de Contingência. No encontro, havia sido esclarecido o trâmite para que o movimento possa buscar adesão aos programas habitacionais do Estado.

O governo do Estado lamenta a atitude violenta do grupo, mas mantém firme o propósito do diálogo em busca de soluções de moradia digna para quem precisa.

Em relação a questão dos prédios ociosos, o governo através das secretarias Planejamento, Governança e Gestão e  Habitação e Regularização Fundiária emitiu a seguinte nota:

O Estado vem desenvolvendo ações que possam contribuir com o tema , abrangendo as possibilidades no âmbito das políticas e programas estaduais. A política de gestão de ativos, prevista na Lei 15.764/21 está dentro desse escopo, em que a pasta responsável tem desenvolvido estudos para a melhor destinação dos imóveis estaduais. A partir da ocorrência das enchentes, o Estado intensificou suas políticas para habitação.     
                                                                                                                                                                                                                                               

Habitação- Enchentes                                                                                                                                                                                                                 A Casa É Sua – Calamidades (casas definitivas)
R$ 46 milhões
O programa A Casa É Sua – Calamidades prevê a construção de casas com 44 metros quadrados de área total, divididos em dois dormitórios, sala/cozinha conjugadas, um banheiro e área de serviço externa. O prazo de entrega é de 120 dias. 

O recurso do programa está disponível, a autorização para a ordem de início de construção das casas definitivas já foi dada e os convênios com os oito municípios da Etapa 1 estão assinados. As prefeituras dos oito municípios já selecionados definem os beneficiários, entre os que tiveram as casas totalmente destruídas, com prioridade para as famílias em vulnerabilidade social, e indicam os terrenos para as moradias. A Secretaria de Habitação e Regularização Fundiária divulgará um cronograma de colocação das casas, e a empresa responsável pela produção já iniciou os trabalhos.

Está aberto o prazo para que municípios com decreto de calamidade homologado pelo Estado se inscrevam na nova etapa do programa A Casa é Sua – Calamidade. As inscrições vão até 28 de junho e podem ser feitas por meio de um formulário digital disponível na página da Sehab.

Anúncio 23/5 - Casas definitivas
300 por recurso do Estado (R$ 41,8 milhões)
200 por doação de iniciativa privada - Inova
15 por doação da empresa vencedora da licitação (KMB)
38 por recursos do Ministério Público

Anúncio 11/6 - Casas definitivas
32 por recurso do Estado (R$ 4,2 milhões) em Venâncio Aires

Inicio dos trabalhos
Na quinta-feira (13/06) começou o trabalho de preparação do terrenos em Santa Tereza, que receberá 24 casas definitivas do programa A Casa é Sua - Calamidade. Entrega em 120 dias após o preparo do terreno.
Na sexta-feira (14/6) começou o preparo dos terrenos em municípios do Vale do Taquari. Muçum, que receberá 56 casas definitivas, Roca Sales, que terá 35 moradias e Arroio do Meio, para as 38 com recursos do MP e mais 5 das doações recebidas.

Casas provisórias
R$ 66,7 milhões
A medida prevê a instalação de 500 unidades habitacionais de construção modular em chassi metálico, no prazo de 30 dias a contar da liberação do terreno pelas prefeituras. As unidades medem 27 metros quadrados, compostos por um dormitório, sala e cozinha conjugadas e banheiro. Os módulos são entregues já com mobiliário feito sob medida e eletrodomésticos (fogão e geladeira). Essa medida já integra o Plano Estadual de Habitação de Interesse Social, como política permanente para atuação em casos de emergências, calamidades e desastres.

Anúncio 7/6 - Casas provisórias
500 módulos - R$ 66,7 milhões 
250 para Eldorado do Sul
100 para Região Metropolitana de Porto Alegre*
150 para o Vale do Taquari* 

*Municípios a serem definidos em breve, a depender da manifestação de interesse dos municípios de acordo com a disponibilidade de terrenos.

Centros de Acolhimento Humanitário (CHAs)
Solução transitória entre os abrigos onde as pessoas estão atualmente, que são na verdade alojamentos provisórios, e as residências definitivas dos programas habitacionais já anunciados. O governo já assinou a formalização com os municípios de Porto Alegre (três e Canoas (dois), onde serão construídos cinco centros:

Porto Alegre - cerca de 2 mil pessoas
- Centro Humanístico Vida, Zona Norte - preparação de terreno já finalizada. Na segunda-feira (17/6) iniciou a montagem da base das estruturas habitacionais. A Prefeitura está realizando serviços de infraestrutura (energia, água e esgoto).
- Estacionamento do Porto Seco, Zona Norte - em fase de finalização de layout da estrutura e organização da forma de acolhimento, que será articulada com a Prefeitura de Porto Alegre.
- Centro de Eventos Ervino Besson, no bairro Vila Nova, Zona Sul - realizado levantamento do terreno, avaliação de condições e de necessidades para infraestrutura. Aguardando outras definições da Prefeitura quanto às estruturas do município no local.

Canoas - cerca de 1.700 pessoas
- Terreno na avenida Guilherme Schell, próximo à Refap. No local, serão montadas unidades habitacionais cedidas pela Agência da Organização das Nações Unidas para Refugiados (Acnur) - 208 casas provisórias - montagem das unidades prevista para iniciar na terça-feira (18/6). Estão sendo montadas desde a sexta-feira (14/6) as estruturas internas, por empresa contratada pela Fecomércio, no pavilhão anexo ao terreno. Entre elas, fraldário, espaço kids e lavanderia. Além disso, segue ocorrendo preparação de parte do terreno para instalação de redes de esgoto e água.
- ⁠Centro Olímpico Municipal (COM) -  Iniciada na segunda-feira (17/6) a instalação para base das estruturas e, também, a drenagem no terreno. Já a Prefeitura está trabalhando na disponibilização de água e esgoto.

Os cinco espaços poderão abrigar até 3,7 mil pessoas. O custeio das estruturas e da gestão dos espaços, que será feita pela Agência da Organização das Nações Unidas para Migração (OIM), será financiado pelo Sistema Fecomércio/Sesc/Senac.

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HABITAÇÃO- PERMANENTE
Programa permanente desde 2022- casas definitivas-
A CASA É SUA – MUNICÍPIO- * nesta modalidade os municípios entram com a contrapartida de 30%.
FASE 1- 2022_-479 unidades habitacionais
investimento: R$ 36,4- milhões
Contrapartida: R$ 10,9 milhões
Municípios- Canoas e Pelotas
FASE 2- 2023-  1.035 Unidades habitacionais
Investimento R$ 82,5 milhões    
Contrapartida: R$ 39,2 milhões
Municípios- 22
FASE 3- 2024- 250 unidades
Municipios-15-
Investimento -R$ 20 milhões
Contrapartida: R$ 11 milhões

TOTAL INVESTIMENTO COM A CONTRAPARTIDA DOS MUNICIPIOS SOMANDO AS 3 FASES DO PROGRAMA 
R$ 241,9 milhões

* Com informações do Sul 21


 
 

 

 

Edição: Marcelo Ferreira