A Comissão Temporária Externa do Senado Federal, que acompanha a crise no Rio Grande do Sul, presidida pelo senador Paulo Paim (PT), realizou, nessa quinta-feira (20), a segunda diligência no estado. Depois de visitar áreas atingidas em Roca Salles, os parlamentares promoveram uma audiência pública em Encantado.
Além de Paim, compuseram a delegação os seguintes senadores: Ireneu Orth (Progressistas-RS), vice-presidente da comissão; Leila Barros (PDT-DF); Jorge Kajuru (PSB-GO); Hamilton Mourão (Republicanos-RS), relator da comissão; Luis Carlos Heinze (Progressistas-RS), senador licenciado; e a suplente de senadora Cleonice Back (PT).
Depois de aterrisar na Base Aérea de Canoas, o grupo se dirigiu a Roca Salles, entrando em contato com os cenários de destruição que ainda imperam ao longo do caminho entre a região metropolitana de Porto Alegre e o Vale do Taquari. Em Roca Salles, as atenções se voltaram especialmente para a situação a que estão submetidos pequenos agricultores.
Eles visitaram, por exemplo, uma propriedade com mais de 130 anos de sucessão familiar que foi totalmente arrasada. "Nós perdemos tudo o que tinhamos aqui, precisamos começar do zero, por isso só temos um pedido a fazer: que os governos nos ajudem a pagar o que estamos devendo", solicitou Lurenço Canepelle, responsável pela unidade produtiva na qual trabalha com a esposa, os pais e dois filhos pequenos.
No final da agenda, o senador Paim conversou rapidamente com a reportagem do Brasil de Fato RS e garantiu: "Defendemos a união dos poderes para que a ajuda necessária na reconstrução do estado chegue o mais rápido possível. Estamos levando muitos pedidos e empenharemos nosso máximo esforço para atender as expectativas que as pessoas depositaram em nós. O nosso compromisso é resgatar a dignidade das pessoas".
Audiência
Durante a audiência pública, os senadores ouviram pedidos de prefeitos, vereadores, representantes de segmentos da agricultura, comércio e indústria, representantes dos movimentos sociais e, claro, dos atingidos pelas cheias. Paim voltou a citar a lista de projetos de lei que o colegiado defende que sejam aprovados urgentemente para ajudar no socorro ao Rio Grande do Sul.
Chamou atenção o relato da moradora Márcia Eloísa Fleck, da cidade de Roca Salles, que contou aos parlamentares como perdeu a casa em que morava durante um deslizamento de terra, depois teve que passar por diferentes estruturas de abrigo, sofrendo, inclusive, ameaças em alguns dos locais.
"A única coisa que eu queria pedir é que me ajudassem a ter uma casinha para morar, botar minhas coisas dentro, colocar minha filha junto comigo, meu esposo. Para organizar nossas coisinhas que hoje estão amontadas embaixo de um chiqueiro", pediu. Sensibilizado com o caso de Márcia, que agora está morando de favor com parentes, o senador Kajuru comprometeu-se a destinar, de modo pessoal, o valor necessário para a construção de uma casa nova para aquela família.
O senador Ireneu Orth defendeu a criação de uma Zona Franca ao longo do Rio Taquari, com desconto de tributos por 30 anos para indústrias e outros empreendimentos. Ele disse que apresentará um projeto de lei nesse sentido.
A senadora Leila, que preside a Comissão de Meio Ambiente (CMA) e lidera a Bancada Feminina do Senado, disse que os impactos negativos das mudanças climáticas já são uma realidade não só no Brasil, mas no mundo. Ela ressaltou a importância da prevenção para o enfrentamento de calamidades, como as queimadas no Pantanal e as secas na região Norte.
Hamilton Mourão disse que as enchentes causaram impactos sociais, econômicos e psicológicos negativos no estado, nos municípios, nas empresas e na população gaúcha. Ele disse que o estado e os municípios gaúchos precisam ser compensados pela perda arrecadatória causada pela tragédia.
Prevenção a tragédias
O prefeito de Encantado, Jonas Calvi, disse ser necessário mais investimentos na prevenção às enchentes, como dragagem, limpeza e desassoreamento dos rios da região. Ele pediu apoio dos senadores para a criação na cidade de um Centro de Resiliência Climática para prevenção e enfrentamento das consequências das mudanças climáticas em toda a região do Vale do Taquari. Também pediu mais ajuda dos governos federal e estadual em relação às empresas gaúchas e agradeceu a presença da comissão. "Vocês estão colocando os pés no barro, na lama, sentindo nossa dificuldade", disse.
O vereador da cidade de Estrela Júlio Salecker representou o Comitê da Bacia Hidrográfica Taquari-Antas. Ele informou que o estado do Rio Grande do Sul está atrasado há mais de dez anos na implantação do Plano da Bacia Hidrográfica do Taquari-Antas. Salecker pediu a ajuda do Senado para que o estado finalize os planos de ação das bacias hidrográficas e implante uma agência de região hidrográfica. Segundo ele, o plano prevê dragagem de rios, construção de barragens para regularização de vazão em cabeceiras, proteção de matas ciliares e de melhorias da defesa civil, com planos de alerta e de evacuação, por exemplo.
"Se nós tivéssemos executado as ações do plano da bacia Taquari-Antas, que foi entregue ao estado em 2012, e não virou plano de ação, não virou plano executivo, nós não íamos ter evitado a chuva que caiu aqui mas, com certeza, nós íamos ter danos bem menores do que tivemos, tanto em perdas de vidas humanas e de animais, como em perda de patrimônio privado e patrimônio público", lamentou o vereador.
Anistia de dívidas
Já o vereador de Encantado Luciano Moresco, coordenador do Conselho de Desenvolvimento do Vale do Taquari, disse que a entidade está cobrando do Poder Público medidas emergenciais, como a prorrogação do pagamento de tributos e mais agilidade na liberação de apoio financeiro federal às cidades.
"Os recursos financeiros precisam jorrar sobre o Vale do Taquari e outras regiões do estado igualmente afetadas, em um volume que permita que isso não deixe a região minguando", propôs. Moresco pediu mais apoio do estado e da União para que as empresas da região não entrem em situação de falência, para a reconstrução de pontes e estradas, para a dragagem de rios e para pressionar municípios a criarem planos de enfrentamento de crises e catástrofes.
O representante do Fórum das Entidades Populares do Campo, Miqueli Sturbelle Schiavon, chamou a atenção para o endividamento dos agricultores familiares e pediu a anistia das dívidas das famílias que perderam casas e produções. Ele disse a chamada agricultura familiar e camponesa foram as mais atingidas pelas enchentes e, "como sempre, entre estes, os mais pobres é que estão em situação de maior vulnerabilidade".
Schiavon lembrou que os camponeses têm o hábito de preservar a natureza e trabalham em harmonia com o meio ambiente, estando hoje submetidos a uma situação de injustiça climática. "Essas pessoas estão sendo atingidos por um fenômeno que não é causado pela sua ação e sim pela ação de outros, esses outros que devem sim ser responsabilizados". Por fim, criticou o negacionismo e creditou às ações de desinformação a responsabilidade pelo agravamento de situações como a que está vivendo o povo gaúcho. "O que houve aqui no Vale do Taquari é fruto do aquecimento global. A gente não pode mais tolerar negacionismo, a gente precisa cuidar do meio ambiente."
Retomada
Cristiano Laster, da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado (Emater-RS), informou que mais de 20 mil propriedades rurais foram atingidas pelas enchentes, sendo que três mil delas foram completamente devastadas. Ele disse que milhares de famílias precisam de ajuda para conseguirem retomar suas produções agrícolas e pecuárias.
Já o secretário do Desenvolvimento Urbano e Metropolitano do estado do Rio Grande do Sul, Carlos Rafael Mallmann, pediu apoio do Senado para a ampliação dos recursos federais de ajuda ao estado, principalmente dentro do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), como estudos técnicos para a contenção das cheias no Vale do Taquari e o programa de contenção das cheias nas regiões metropolitanas.
Também participaram da audiência pública Marcos Bastiani, ex-presidente da Associação de Vereadores do Vale do Taquari; o deputado estadual Pepe Vargas; Angelo Fontana, da Câmara de Indústria, Comércio e Serviços do Vale do Taquari; o engenheiro civil Róger de Oliveira; e o vice-presidente da Cooperativa Regional de Desenvolvimento Teutônia, Daniel Luis Sechi.
*Com informações da Agência Senado.
Edição: Marcelo Ferreira