Rio Grande do Sul

Coluna

Aonde nos leva a separatividade?

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Precisamos abraçar e encarar os desafios inerentes na inadiável mudança de percepção - Foto: Ives Mizoguchi
Se sonhamos juntos, se semeamos a consciência carinhosa, podemos apostar na regeneração do planeta

"Verifiquei que a vida persiste e se mantém em meio à destruição; deve, pois haver uma lei mais forte que a da destruição."

Mahatma Gandhi

Durante as fortes chuvas e enchentes que afetaram o RS, li e escutei várias matérias em que se perguntava quem sofre mais, geralmente, com este tipo de catástrofe. Invariavelmente, chegava-se a mesma resposta: as pessoas das classes menos favorecidas. No caso, as populações ribeirinhas, de pescadores, pequenos agricultores, moradores das ilhas e pessoas em situação de vulnerabilidade social.

De fato, milhares de pessoas sofreram e ainda sofrem com o que passou (enquanto lês essa matéria, chove acima da média novamente, sem termos solucionado os mesmos problemas que contribuíram enormemente para o que se deu). O desequilíbrio que causamos como seres humanos explorando o planeta (e uns aos outros de forma vil), não se resolve de um dia para o outro.

E quanto aos outros partícipes deste cenário? Além das pessoas, há outros sujeitos envolvidos: rios, morros, lagos, animais, ecossistemas inteiros!

Consegues senti-los? Sentes o que lhes estamos fazendo?

Tantas criaturas gritando e chorando. Ou acaso um rio que perde seu leito pelo assoreamento durante tanto tempo, e extravasa suas margens, não está rogando por auxílio? Ou, não se resseca a terra e grita absurdamente por suas matas devastadas, queimadas ou transformadas em monocultura ou pasto para gado?

Estes desequilíbrios gerados pelo afã exploratório desmedido sem critério nos transpassam e somam injustiças sem fim em todos os reinos da Natureza. Precisamos abraçar e encarar os desafios inerentes na inadiável mudança de percepção.

Se eu prego contra a vida moderna, artificial, de gozo sensual, e peço a homens e mulheres que voltem à vida simples, (...) eu o faço porque reconheço que, sem um retorno inteligente à simplicidade, nossos descendentes não escaparão de uma descida a um estado abaixo da brutalidade

Mahatma Gandhi, 1924

Se era assim no início do século na jovem Índia no tempo das lutas de não-violência de Gandhi frente à febre colonialista da Grã-Bretanha, que dirá hoje na sociedade complexa em que vivemos. Mais do que nunca necessitamos de um compromisso ativista, vibrante com tudo o que não se deixa ter voz, não podemos passar como se não importassem, como se não existissem.

Precisamos rever nossa escala de valores como humanidade e voltar a colocar a vida como o valor primeiro - a delicada trama da vida.

Como humanidade, e como condição para que a vida possa continuar existindo da forma como a conhecemos, é urgente eleger caminhar em direção à Consciência Unificada, na qual também estão presentes os que não têm água, não têm comida, nem trabalho, nem liberdade, nem são considerados como seres vivos e sensíveis, sujeitos de direitos.

Devemos isso a eles, como uma geração. Se avançamos nesse sentido, liberando esta ferida, essa dor da Consciência Pachamama, talvez possamos tecer um sincrodestino diferente do que está posto por tanta inconsciência e omissão.

Aventuro-me a admitir que é lei fundamental da Natureza, sem exceção, o fato de ela produzir o suficiente para nossas necessidades diárias. Tomasse, cada um, o bastante para si mesmo - não mais -, e não haveria pauperismo neste mundo e não haveria homem que morresse de inanição neste mundo

Mahatma Gandhi, 1933

Nossos erros como sociedade nos dessangram todos, amamos tanto este planeta, esta nave redonda, esta pedrinha viva, que nos dá tanto e nós, crendo-nos separados do Todo, superiores e cheios de razão, defendemos cada um os seus muros, estamos terminando com ela (nossa Casa Comum), hasteando ideologias e interesses mesquinhos que só geram destruição.

Se sonhamos juntos, se semeamos a consciência responsável e carinhosa, podemos apostar na regeneração da vida neste planeta como uma comunidade de amantes da Unidade.

Somos apenas Um: uma comunidade, uma ecologia, um universo, um ser. Se é que há uma verdade digna desse nome, é que formamos um todo com a Verdade, que não estamos separados dela. Todos os seres viventes.

A compreensão desta verdade tem efeitos no sentido de quem somos e do nosso destino, em relação aos demais e com todos os aspectos da vida.

Fica o convite a que nos abramos a sentir o fluxo de amor que corre livre através de toda forma de vida, na unidade detrás das formas.

* Melusina Iriarte, ativista da Nación Pachamama

** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko