Atendendo à solicitação de 85 municípios, o governo federal liberou, no dia 20 de maio, R$ 40 milhões aos abrigos que estão recebendo vítimas das enchentes no Rio Grande do Sul. Essa verba, segundo o governo, é enviada às prefeituras, que são responsáveis por destinar o apoio à manutenção dos espaços de forma emergencial e sem burocracia, incluindo abrigos informais, como os montados por sindicatos e igrejas.
No entanto, lideranças de entidades responsáveis por montar esses abrigos denunciam não terem recebido o apoio financeiro prometido. De acordo com essas organizações, a prefeitura de Porto Alegre não repassou os recursos, deixando abrigos sem os itens essenciais para o funcionamento.
O secretário nacional de Assistência Social, do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), André Quintão, destaca que cabe à prefeitura enviar os dados ao governo federal, incluindo os desses locais. "A prefeitura nos informa a quantidade de pessoas abrigadas, recebe o recurso e depois informa os itens que foram comprados para a prestação de contas", explica.
O repasse de recursos é utilizado para a aquisição de colchões, cobertores, roupas de cama, água, sabão, detergente, utensílios para cozinhar e até estruturas para montagem dos abrigos. O governo federal informou que cada grupo de 50 pessoas acolhidas deveria receber R$ 20 mil diretamente do município.
“Em nenhum momento a prefeitura disse que iria ajudar financeiramente. A gente teve gastos aqui, tivemos que contratar vigilância, contratar frete, comprar insumos, nosso patrimônio depredado de certa maneira, e a prefeitura não se colocou à disposição de ajudar quem estava ajudando a população”, relata o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Porto Alegre (Stimepa), Adriano Filippetto.
Apoio e segurança
Antecipando a iminente elevação das águas, a diretoria do sindicato organizou uma força-tarefa para abrigar os moradores de seis vilas, na região de Farrapos, na Escola Técnica Mesquita. Em poucas horas, o abrigo acolheu cerca de 200 pessoas.
O sindicato reuniu uma equipe de profissionais e voluntários, como médicos, psicólogos, educadores, artistas, assistentes sociais, advogados, entre outros, para fornecer apoio aos desabrigados. Além disso, disponibilizaram um espaço especial para acolher as crianças e atendimento veterinário para os animais que chegavam junto com as famílias. Também foi organizada uma cozinha, onde era preparada toda a alimentação servida no local.
Filippetto relata que o sindicato trabalhou dia e noite e que, desde então, não recebeu apoio financeiro algum, exceto dos voluntários, dos sindicatos parceiros e da comunidade do entorno da escola. Ele enfatiza que a maior dificuldade enfrentada era a administração.
“A prefeitura entrou em contato e disse que ia nos mandar 130 marmitas diariamente, mas a gente já fazia as nossas comidas aqui, então respondi que não precisávamos de marmita naquele momento e, sim, de subsídio, logística e vigilância, mas a prefeitura não respondeu mais nada”, conta.
Para dar continuidade ao atendimento às vítimas, o sindicato decidiu realocar as pessoas abrigadas na Escola Técnica Mesquita para outro espaço. “A gente procurou um abrigo onde as pessoas fossem bem acolhidas, onde a gente pudesse dar continuidade ao atendimento. Colocamos as pessoas no Sesi. Vamos lá todos os dias para levar insumos.” Filippetto conta também ter alugado um micro-ônibus para ajudar as famílias a voltarem para casa. No total, há 410 pessoas abrigadas nesse novo espaço.
Porto Alegre, uma das cidades mais afetadas pelas enchentes, registrou 163 abrigos em funcionamento no pico da catástrofe climática, atendendo 14.632 pessoas. No último relatório da prefeitura, divulgado no fim de maio, 135 locais continuam em operação, abrigando cerca de 9 mil pessoas.
O sindicato questiona a falta de clareza da prefeitura sobre a destinação dos recursos emergenciais: ou não foi feita a solicitação ao governo federal dos recursos necessários para apoiar os abrigos geridos por entidades civis e religiosas; ou não foi feito o repasse da verba enviada.
A situação tem gerado preocupação e incertezas entre as organizações que dependem desses recursos para continuar prestando assistência aos desabrigados. As entidades cobram maior transparência e agilidade no repasse das verbas para que possam oferecer condições dignas aos que perderam suas casas devido às recentes enchentes no estado.
Confira a íntegra da carta do Stimepa:
“Como é de conhecimento público, o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico e Eletrônico da grande Porto Alegre foi um dos primeiros abrigos criados para acolher emergencialmente as famílias da região de Farrapos e Humaitá. Durante o período de 18 dias, 207 pessoas ficaram abrigadas na sede do sindicato, localizada na Av do Forte, 77. Nesse período, todas as demandas básicas, como alimentação, roupas, colchões, cobertores, água e material de higiene, foram atendidas. Inicialmente, esses recursos foram providos pelo próprio sindicato e por doações voluntárias.
Posteriormente, também recebemos apoio direto do governo federal por meio da Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB). No entanto, é importante destacar que, como outros alojamentos, não recebemos nenhum apoio financeiro da Prefeitura de Porto Alegre. Recentemente, participamos de reuniões com agentes do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), nos quais fomos informados sobre o Serviço de Proteção em Calamidades Públicas e Emergências, regulamentado pela Portaria MDS nº 90/2013. Esse serviço prevê recursos para a estruturação de espaços de acolhimento, aquisição de suprimentos e materiais de higiene, contratação de equipes e outras necessidades emergenciais.
Segundo nossas informações, a Prefeitura de Porto Alegre solicitou recursos ao governo federal, por meio do MDS, para custear o alojamento de 16.416 pessoas, tendo recebido para isso R$ 1.974.000,00, ou seja, quase 2 milhões de reais. Chegando ao final do mês de maio, a prefeitura precisaria solicitar novamente ao MDS o repasse para o número atualizado de pessoas abrigadas na cidade. Além disso, a qualquer momento, a prefeitura poderia atualizar os números e demandar complementação de recursos, após realizar um levantamento da real necessidade dos abrigos geridos tanto pela prefeitura quanto por entidades da sociedade civil. Frente a isso, perguntamos: - Qual foi o destino do valor depositado pelo governo federal para alojamento? Por que a prefeitura não apoiou as entidades que organizaram alojamentos, via termo de cooperação de atendimento emergencial das famílias desabrigadas e desalojadas? Por que a prefeitura não atualizou a real demanda e solicitou complementação ao MDS, para abranger a necessidade das entidades? Por fim, por que a prefeitura não renovou a solicitação de repasse do MDS para subsidiar a necessidade de alojamentos das milhares de famílias que ainda estão fora de casa? Agradecemos a atenção e estamos à disposição para esclarecer qualquer dúvida adicional.”
O Brasil de Fato RS procurou a prefeitura de Porto Alegre, mas não houve retorno até a publicação da reportagem. O espaço segue disponível para atualizações.
Edição: Katia Marko