Rio Grande do Sul

ECONOMIA DE CUIDADOS

‘Nós precisamos começar a mudar as raízes do problema’, afirma ministra das Mulheres

Tema da economia de cuidados se transformou em assunto vital nas discussões dos fóruns internacionais

Brasil de Fato | Genebra |
Na visita da ministra das Mulheres a Genebra, o Brasil de Fato perguntou com exclusividade sobre a questão dos cuidados e as mulheres - Foto: Jose Cruz/Agência Brasil

Governos, organizações internacionais, sociedade civil entre tantos outros atores vêm discutindo sobre o importante papel do trabalho de cuidado não remunerado representa nas economias e nas sociedades mundiais. O Relatório “Desigualdade S.A, como o poder corporativo divide nosso mundo e a necessidade de uma nova era de ação pública”, da Oxfam, estima que as mulheres subsidiem a economia em 10,8 trilhões de dólares anuais.

O cuidado de crianças, idosos, pessoas com doenças crônicas ou deficiências de diferentes graus e aspectos realizados basicamente por mulheres representam um investimento de esforços, tempo e recursos na realização deste trabalho que normalmente é realizado pela mesma pessoa da família que faz o trabalho doméstico diário.

Este trabalho é o responsável por mover as economias das cidades o que na maioria das vezes não é entendido pela própria sociedade que considera como natural a sobrecarga enfrentada pelas mulheres, que acumulam as atividades profissionais com o trabalho de cuidado e afazeres domésticos.

Desde 2023 o governo brasileiro vem trabalhando na elaboração de um plano de ações, buscando promover os cuidados a quem precisa e neste sentido aderiu em fevereiro deste ano à Aliança Global pelos Cuidados, iniciativa do Instituto Nacional das Mulheres do México (Inmujeres) em parceria com a ONU Mulheres.

Na visita da ministra das Mulheres a Genebra, o Brasil de Fato perguntou com exclusividade sobre a questão dos cuidados e as mulheres. 

“A gente está fazendo essa discussão sobre a política nacional de cuidados agora. Ela é coordenada pelo MDS e pelo Ministério das Mulheres. Por exemplo, como é que você discute ter uma política de cuidados que dê conta de garantir que as mulheres não sejam as únicas responsáveis. Eu tenho puxado um debate para dentro do governo e o presidente Lula tem me ajudado muito, que é a discussão sobre a política do cuidado, mas também a divisão sexual do trabalho. Não é só você ter serviços.

A gente quer ter lavanderias comunitárias, restaurantes comunitários que fiquem abertos mais tempo. A gente quer estabelecer espaços onde as mulheres possam estar, que elas possam ir lá se cuidar, estudar, dançar, ter o seu momento de cuidado. Como é que você faz isso? Discutindo a divisão sexual, porque a gente está aumentando, por exemplo, a escola de tempo integral. Mas a escola de tempo integral é no período da escola. Você tem a creche. Cinco horas você tem que pegar o filho na creche. A gente já viu aqui, tem que sair para pegar o filho. Pode estar falando com Deus, mas não tem jeito. Isso não ajuda na ascensão profissional, porque o marido não ajuda a pegar o filho na escola, nem na creche, não ajuda nos deveres dentro de casa.

Então, o chefe pergunta para ela, olha, tem um cargo de chefia, você quer ficar? Ela vai pensar, vou ter que sair sete meia, oito horas, tenho que fechar o caixa, amanhã tenho que chegar cedo. Quem vai pegar meu filho na creche? Quem vai cuidar da minha sogra, da minha mãe, quando ela ficar doente? Resultado, chega e diz assim, não, passa para outra e vai o homem, que tem menos competência. Ou você discute as duas coisas em conjunto, ou não vamos dar conta de resolver a política de cuidados para as mulheres, que é garantir quem cuida das mulheres.

Esse é o debate que nós estamos fazendo. Então, é um processo, que é aquilo que eu falei no início, na questão de enfrentar as raízes do problema. E eu tenho dito para o presidente Lula, e ele concorda, e às vezes é ele que me diz, ou a gente aproveita esse momento, esse espaço, e começa a fazer a discussão profunda do que tem que mudar no país, na questão das mulheres e de gênero, ou não vamos dar conta sequer de deixar nada para depois. Nós precisamos começar a mudar as raízes do problema.

O ódio contra as mulheres e a desigualdade estão colocadas, inclusive na política de cuidado, no papel e no estereótipo que é colocado para as mulheres. E aí você não vai ter mulheres nas exatas, você não vai ter mulheres na NASA, você não vai ter mulheres na matemática, elas vão tudo para a área das humanas. Mas não é porque elas não têm capacidade, é porque desde meninas já são treinadas, muitas vezes deixam a escola para serem mães, mas criança não é mãe. Então, esse desafio dentro da política de cuidados para nós é muito importante, e nós queremos travar.

Na América Latina, a gente foi conhecer as manzanas na Colômbia, eu estou indo para o Chile, quero conhecer a experiência do Chile, em julho tem uma conferência no México, eu vou e quero conhecer a experiência do México, porque o que é bom, eu quero aproveitar, e o que não é, eu quero avançar no debate, pelo menos político, no Brasil, para que a gente possa implantar uma política nacional que dê conta realmente de garantir que as mulheres não tenham tanto tempo com o cuidado. Agora, eu também acho que a gente tem que discutir a não remuneração. Eu não concordo em você pagar um salário para a mãe ficar dentro de casa cuidando quando isso é responsabilidade do Estado e da família.” 

Interessante observar como o tema da economia de cuidados se transformou em assunto vital nas discussões dos fóruns internacionais, podemos citar como exemplo disto que na próxima 112ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho (CIT), da Organização Internacional do Trabalho (OIT), de 3 a 14 de junho, em Genebra, na Suíça, consta da agenda deste ano a economia do cuidado.


Edição: Katia Marko