Nos últimos dias as cozinhas solidárias que estão garantindo alimentação para atingidos e atingidas das enchentes no RS, bem como de voluntários e voluntárias que estão atuando nos esforços humanitários, recebeu um importante reforço: 6 toneladas de alimentos agroecológicos, produzidos pela base do Movimento dos Pequenos Agricultores e Pequenas Agricultoras (MPA), sem a utilização de venenos agrícolas nem de insumos químicos. Essa doação está inserida dentro da Missão Sementes de Solidariedade: Emergência.
A ação que vem atuando junto a vítimas das ocorrências climáticas extremas desde setembro de 2023 e congrega 16 organizações entre movimentos sociais e sindicais, entidades de classe, institutos, cooperativas camponesas e órgãos vinculados à igreja católica.
"Mesmo tendo significativas perdas em suas unidades de produção em praticamente todo o estado, a base do MPA está demonstrando sua solidariedade ao dividir um pouco do que restou com outros trabalhadores e trabalhadoras que perderam tudo", afirma Viviane Chiarello, dirigente do movimento na região norte do estado. “O que o campesinato faz nessa hora não é caridade, é partilha, estamos dividindo o pouco que temos com aqueles companheiros e companheiras que foram mais atingidos, estamos compartilhando o que sobrou para ajudar nossos irmãos e irmãs a reiniciar”, completa.
Uma tonelada de alimentos foi mobilizada a partir de Seberi e Erval Seco, através da Cooperbio, cooperativa camponesa que organizou a carga e remeteu até a cozinha solidária do bairro Azenha, em Porto Alegre. Alimentos como feijão preto e feijão carioca, arroz e farinha, mandioca, batata doce, chuchu e verduras diversas compuseram parte da carga. Também foram levadas quantidades de frutas como bergamota, laranja, banana e abacate, bem como água potável, leite e banha para a preparação das refeições na estrutura que é mantida pelo Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Sem Teto (MTST) e pelo Movimento dos Atingidos e Atingidas por Barragens (MAB).
“Nossa solidariedade é militante, precisamos atuar nesse primeiro momento para dar todo apoio e suporte para os companheiros e companheiras que estão atuando na linha de frente, fortalecendo os atingidos e atingidas para as ações de reconstrução que virão logo em seguida”, aponta Chiarello.
Agroecologia militante
Eliana Springer, camponesa de Erval Seco, foi uma das produtoras familiares que contribuiu com itens para a entrega. "Nosso município também sofreu com as chuvas, tivemos alagamento na cidade e muitos problemas nas comunidades do interior, boa parte da produção ficou comprometida, mas nós sabemos da importância de dividir o que temos nessa ação tão importante, é hora de todos nos darmos as mãos para reconstruir, reestruturar o nosso estado e as vidas das pessoas."
A camponesa também faz questão de deixar claro o caráter agroecológico dos alimentos que estão sendo enviados para as cozinhas solidárias. "O mesmo alimento que preparamos para nossas famílias são os alimentos que estão sendo enviados para nossos companheiros e companheiras atingidos, os mesmos alimentos que vão para as bancas das feiras estão tendo uma parte separada e enviada para ser compartilhada com todos aqueles e aquelas que estão tendo necessidade de alimentação neste momento."
Outra remessa partiu de um dos primeiros territórios atingidos pela enxurrada com severidade: Santa Cruz do Sul. Em meio ao território que ainda está passando pelas ações de recuperação e reestruturação, foi mobilizada uma carga de cinco toneladas de alimentos pela cooperativa camponesa Cooperfumos. Além de arroz e feijão, esta remessa também levou itens como abóbora comum e kabotiá, batata doce, mandioca, espigas de milho verde, cebola e alho.
De atingidos para atingidos
Essa segunda remessa contempla necessidades da cozinha solidária Origem Camponesa, no Centro de Formação São Francisco de Assis, na cozinha da Comunidade Católica Sagrada Família em Arrio do Meio e também na cozinha da Azenha, que distribui para outras cozinhas solidárias da rede. Novas remessas deverão ser mobilizadas na próxima semana, chegando até outros pontos do estado onde há necessidade do atendimento.
Josuan Schiavon, pequeno agricultor de Encruzilhada do Sul e integrante da coordenação do MPA, explica que as perdas na produção foram grandes, mas que isso não impede o exercício da solidariedade dos camponeses. “Temos convivido com muitas perdas na nossa produção por conta das mudanças climáticas, seja excesso de chuvas, seja pela incidência dos ventos, e agora com a chegada das primeiras geadas”, aponta.
Segundo ele, os plantios já foram realizados de modo atrasado por conta do excesso de chuvas no início do ano. "Agora quando se aproximava o momento das colheitas novamente as águas em excesso prejudicaram, a gente teve muito feijão que não pôde ser colhido e acabou brotando na lavoura, a gente teve muito milho que não conseguiu finalizar o ciclo, e agora as lavouras mais do tarde que estão sofrendo com as primeiras geadas na metade do mês de maio”, explica.
Comer é um ato político
"Assim como ocorreu com os agricultores e agricultoras associados à Cooperbio, aqueles associados à Cooperfumos se reuniram para ajudar aos irmãos, companheiros e amigos que estão na cidade e que perderam tudo", aponta Schiavon.
Da outra ponta do trabalho, na gestão das cozinhas solidárias, vem palavras de gratidão. “Venho agradecer a solidariedade de todos vocês com a contribuição de alimentos para nossas cozinhas solidárias, neste momento tão difícil que estamos passando no nosso estado. Sei da dificuldade de vocês, das perdas que tiveram e da forma como estão dividindo conosco o que restou. Com ações assim nós estamos fortalecendo a solidariedade a toda a população do estado e vocês são muito importantes nessa jornada, com fé na luta venceremos”, afirmou o coordenador da cozinha, Caio Almeida, dirigente do MTST.
Os voluntários que tocam as cozinhas solidárias vinculadas ao MAB e ao MTST e que recebem alimentos do MPA estimam que tenham sido produzidas mais de 20 mil refeições nas primeiras duas semanas de atuação. Os itens enviados pelo MPA através da Missão Sementes de Solidariedade foram muito saudados, uma vez que a maior parte é composta justamente por itens importantes para a preparação das refeições e que estão faltando nos mercados e centros de distribuição localizados na região Metropolitana.
Solidariedade ativa
A “Missão Sementes de Solidariedade: Emergência” recebe doações financeiras via Pix através do CNPJ da Cáritas Brasileira: 33654419/0010-07. Depósitos bancários podem ser enviados para a Conta 55450-2, Agência 1248-3 (Banco do Brasil), também em nome da Cáritas.
Fazem parte da Missão Sementes de Solidariedade o Instituto Cultural Padre Josimo (ICPJ), Comissão Pastoral da Terra (CPT), Diocese de Santa Cruz do Sul, Instituto Koinós, CanoasTec, Ordem Franciscana através do Serviço de Justiça, Paz e Integridade da Criação (JPIC) e do Serviço Franciscano de Solidariedade (Sefras), Sindipetro RS, Grito dos Excluídos e das Excluídas, Instituto Conhecimento Liberta (ICL), Rede de Agroecologia Ecovida, além dos já citados MPA, MAB, Cáritas e as cooperativas camponesas Cooperbio e Cooperfumos.
Edição: Marcelo Ferreira