A Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul (DPE/RS) ajuizou uma ação, na tarde desta segunda-feira (29), solicitando a indisponibilidade dos bens e bloqueio de contas bancárias da Pousada Garoa e de seu proprietário. Entre os bens, incluem-se imóveis, automóveis e contas bancárias da Pousada e particulares do proprietário. A ação foi assinada pelos Núcleos de Defesa dos Direitos Humanos (NUDDH), de Defesa Agrária e Moradia (Nudeam) e de Defesa do Consumidor e de Tutelas Coletivas (Nudecontu).
A indisponibilidade não retira do patrimônio dos réus a propriedade ou posse dos bens, mas restringe a sua disponibilidade, visando a eficácia do provimento final da ação, que é a indenização às vítimas.
Na madrugada do dia 26 de abril, um incêndio na Pousada Garoa, em Porto Alegre, vitimou dez pessoas e deixou outras 15 feridas. Foi o maior incêndio, em número de mortes, desde 1976, em Porto Alegre. O local era conveniado com a Prefeitura, por meio da Fundação de Assistência Social e Cidadania (FASC), desde 2020, para acolher pessoas em situação de vulnerabilidade social. A pousada funcionava também via aluguel social e atendia pessoas sem qualquer vínculo com a Prefeitura que procuravam moradia a baixo custo.
No mesmo dia a Defensoria foi ao local, a fim de averiguar a situação das vítimas, dos familiares e de outros moradores do local e das proximidades e instaurou expediente para apuração de danos coletivos e violações de direitos humanos.
Na tarde daquela sexta, também promoveu reunião, em sua sede, que contou com a participação de vítimas, familiares, pessoas em situação de rua, parlamentares e lideranças de alguns movimentos sociais, entre eles Movimento Nacional da População de Rua, Movimento Nacional de Luta pela Moradia (MNLM), Centro POP e Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).
No encontro, a instituição levantou informações acerca do funcionamento das Pousadas Garoa e outras conveniadas com a Prefeitura de Porto Alegre, onde preliminarmente fora constatado a precariedade das instalações e a falta de Alvará de Funcionamento e de Plano de Proteção contra Incêndio (PPCI) especificamente no local do incêndio.
:: Pousada que pegou fogo em Porto Alegre tinha autorização da prefeitura para atuar sem alvará ::
Segundo relatos ouvidos na reunião, muitas pessoas preferem viver nas ruas a ir para as pousadas Garoa, que seriam insalubres, não teriam controle de quem está hospedado ou em visita, e que manteriam os ocupantes presos com cadeado à noite.
“O fato, isoladamente, já geraria grande luto, perda e comoção, em proporção global, mas foi agravada pelas informações, oriundas de fontes oficiais, de que o estabelecimento, com concordância e/ou passividade de seus sócios e da municipalidade, não tinha condições de prestação do serviço, razão pela qual o evento não se constitui em um acidente, mas sim em uma tragédia que, embora anunciada, escapou dos deveres legais dos prestadores e dos órgãos de fiscalização”, mencionam os núcleos na ação.
“Busca-se o resguardo patrimonial, a fim de garantir efetividade indenizatória a essas pessoas, que sofrem de grande vulnerabilidade social e ainda se veem vitimadas ao buscarem minimamente ter sua moradia, ainda que provisória”, afirmou o dirigente do Nudeam, Renato Muñoz de Oliveira Santos.
De acordo com a DPE, sendo considerada uma relação de consumo, tanto a Pousada Garoa, como a Prefeitura, devem responder solidariamente pela reparação dos danos.
Na manhã desta segunda-feira (29), a DPE/RS recebeu o secretário municipal de Desenvolvimento Social, Léo Voigt, para levantar mais informações sobre o convênio do Município com a rede Garoa e entender como se deu a contratação do serviço e como será o acompanhamento e fiscalização do caso a partir do incidente ocorrido no dia 26.
Instituições vistoriam unidades da Garoa
A Comissão de Cidadania e Direitos Humanos da Assembleia Legislativa (CCDH/ALRS), através da deputada Laura Sito e o deputado Matheus Gomes, esteve na manhã desta terça-feira (30) realizando visita técnica junto à Defensoria Pública, a Ouvidoria da DPE, o Conselho Estadual de Direitos Humanos e os vereadores Jonas Reis e Giovani Culau, em unidades da Pousada Garoa em Porto Alegre.
Presidenta da Comissão de Direitos Humanos, Laura Sito comenta que encontrou ainda em funcionamento unidades sem ventilação, sem condições de limpeza, com divisórias de madeira, fiações improvisadas e todos os extintores de incêndio sem condições de uso e com prazos de validade vencidos.
“É inadmissível que a prefeitura ainda mantenha este serviço desta maneira em que o tratamento dado ao povo vulnerável de nossa cidade seja desumano. É necessário que as pessoas que estão nestas unidades sejam imediatamente realocadas em locais dignos e seguros”, ressalta a parlamentar.
Na semana passada a Comissão já notificou o TCE e MPRS e agora o relatório da vistoria será entregue, reforçando as evidências das irregularidades apontadas.
Matheus Gomes entregou à Defensoria Pública dossiê de denúncias
Ainda na segunda-feira (29), em reunião realizada na sede da Defensoria Pública do Rio Grande do Sul, o deputado estadual Matheus Gomes (PSOL) entregou um dossiê de denúncias sobre a rede de pousadas Garoa.
O deputado foi recebido pela assessoria do Defensor Público-Geral e pelo Ouvidor-Geral da Defensoria Pública, Rodrigo de Medeiros Silva. Segundo ele, a reunião foi importante para compreender os caminhos que a Defensoria pretende seguir na investigação do incêndio que ocorreu na sexta-feira passada.
Durante a conversa, o deputado ressaltou os esforços que fez durante o mandato de vereador em Porto Alegre para denunciar a rede de pousadas e a importância da elaboração de um dossiê dos fatos dos últimos anos, além da colaboração da Defensoria Pública.
“É preciso garantir uma investigação rigorosa e apurar as responsabilidades de todos envolvidos, principalmente da Prefeitura e da Fasc, que negligenciaram as denúncias que apresentamos há dois anos. A população em situação de rua não é só um número, são pessoas como nós, têm nome, sobrenome e merecem dignidade, respeito e direitos. Infelizmente, esse é o resultado da política de terceirização precária promovida pelas últimas gestões municipais, pois nitidamente essa empresa não tem condição de garantir o desenvolvimento de uma política pública”, destacou o parlamentar.
Nesta sexta-feira (3), o Conselho Estadual de Direitos Humanos (CEDH/RS), o Centro de Referência em Direitos Humanos (CRDH/DPERS), Ouvidoria-Geral da DPE-RS e CCDH/ALRS, realizam uma oitiva conjunta sobre o incêndio na Pousada Garoa, às 14h, na Sala Adão Pretto da ALRS.
* Com informações da Assessoria de imprensa da DPE/RS e da CCDH/ALRS.
Edição: Katia Marko