Rio Grande do Sul

Coluna

Que Jorge nos dê força e fé

Imagem de perfil do Colunistaesd
"Abrindo os olhos e alimentando as redes que nos unem, restará claro que não podemos perder esta batalha" - Foto: Leonardo Melgarejo
Precisamos reanimar em nós aquelas forças com potencial para abrir caminhos aparentemente fechados

Nesta semana, o grande a ser relembrado diz respeito ao dia de Jorge, Ogum, o orixá guerreiro que não teme dragões.

Mesmo sem o conhecimento necessário para tratar dos fundamentos que sustentam o que ocorre nesta data, posso me atrever a repetir algo que é óbvio: as festas que homenageiam aquela energia fundamental, e que tendo iniciado dia 23 se estenderão até dia 28 não se resumem àqueles momentos nem aos eventos religiosos a eles associados, que para alguém haverão de parecer restritos a determinados povos e suas crenças.

Para informações mais adequadas a respeito disso, recomendo o Podcast DE FATO com Iyá Vera Soares, bem como aos demais links aqui informados.

Para este texto pretendo me apoiar numa das muitas evidências que emergem daquelas tradições, que nos incluem a todxs porque vêm de uma base generosa que não discrimina aos ignorantes de seus fundamentos.

Ogum, o filho mais velho de Yemanjá, não apenas teria feito as armas e as ferramentas utilizadas pelas demais lideranças espirituais e toda a humanidade, como também teria sido o primeiro a descer do etéreo para a terra, viabilizando aqui a agricultura e outras condições que permitiram a este planeta vir a ser povoado. Em outras palavras, suas vitórias teriam expandido as condições que nos sustentaram até ontem, e que hoje, sob ameaça dos destruidores da vida, nos convocam a reagir.

E este é o tema desta coluna: precisamos entender o que está ocorrendo nos planos físico e espiritual e a partir disso reanimar em nós aquelas forças com potencial para abrir caminhos aparentemente fechados, que nos inspirem ao enfrentamento das desigualdades e dos interesses que as alimentam.

É preciso aceitar o fato de que há uma guerra cultural em andamento. E que ela se define (como no caso do racismo ativo e passivo) a partir do que ocorre naqueles espaços que filtram o que as pessoas conseguem enxergar, e que a partir dali estabelecem os valores subjetivos que orientam suas/nossas decisões.

Vejamos o que está consolidado na opinião pública, a respeito da carestia, da escassez e da produção de alimentos. Nosso povo vivencia a realidade dos preços da comida e ainda assim enaltece um agronegócio de exportação que não apenas drena recursos e subsídios para se manter economicamente viável como ocupa e envenena territórios vocacionados à produção de alimentos e destrói agroecossistemas fundamentais para manutenção da produtividade agrícola. Não percebendo isso, acabamos atribuindo pouco valor ao fato de que aqueles interesses atiçam parlamentares dispostos a colocar seus serviços contra qualquer política de enfrentamento às desigualdades e à degradação ambiental.

Por que isso ocorre? Porque nisso opera o pior de todos os níveis de corrupção. Aquele oposto aos direitos e necessidades humanas universais, aquele alheio aos compromissos com o futuro. O dragão da maldade mitológica, hoje modernizado e disposto a repaginar entre nós o mundo escravagista.

E nosso povo deu a eles o poder de assim agir, através dos parlamentares da bancada ruralista.

Num país que luta para sair das ameaças da fome, do fascismo, da miséria e da discriminação institucionalizadas, a quem representam, em seu domínio de ação, aqueles mais de 300 deputados federais, mais de 40 senadores e milhares de vereadores que se movem com a racionalidade de quem se nutre dos restos da farinha de um mesmo saco? Em nome de quem, e fundamentalmente, contra quem eles estão operando?

E este é o eixo da discussão que definirá nosso futuro a partir destas próximas eleições.

Algo que se mantém fora da vista da sociedade porque assim são mais bem atendidos os mesmos interesses que controlam tanto aqueles legisladores como os formadores de opinião e meios de comunicação dispostos a criar explicações fantasiosas e a ocultar os fatos, de maneira a justificar e manter esta realidade triste.

A luta é contra eles, gente pobre de espírito, covarde e que pode até parecer poderosa, mas que sabe ser escassa em fé e em números.

Abrindo os olhos e alimentando as redes que nos unem, restará claro que não podemos perder esta batalha. Afinal, eles são poucos e por nós, contra eles, agora se erguem tanto o fogo do dragão quanto as armas de Jorge.

Veja o podcast do Brasil de Fato RS com Iyá Vera Soares, autoridade efetiva sobre a questão da força e espiritualidade dos povos de matriz africana.

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko