Representantes das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) das 18 dioceses que compõem a Regional Sul 3 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) estarão reunidos no Centro de Eventos de São Leopoldo (RS), entre esta sexta-feira (19) e domingo (21), no seu 16º encontro estadual.
A paróquia, que pertencente à diocese de Novo Hamburgo, volta a receber a atividade 43 anos depois de ter sediado o 2º encontro, em 1981. Desta vez a atividade tem como tema “CEBs, migrantes de ontem e de hoje: os desafios de justiça e amizade social” e apresenta como âncora de reflexão a citação de Is 54,2: “Alarga o espaço de tua tenda”.
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“A oportunidade é particularmente significativa porque nesse ano se celebram os 200 anos da imigração alemã no Brasil, iniciada precisamente em São Leopoldo”, lembra o bispo João Francisco Salm, titular da diocese anfitriã, fazendo referência ao texto base do encontro, que desafia: “A profecia não pode morrer, o 16º encontro se ilumina pelo grito da realidade mundial das migrações”.
Para Salm, “a vida em comunidade é dado essencial da experiência cristã. Não menos importante é a comunhão eclesial com os legítimos pastores, hoje tão relativizada e até mesmo agredida por muitos que se dizem católicos”. Sua expectativa é positiva e firme. “Esse evento tão cheio de significados certamente tem tudo para ser uma grande oportunidade da graça do Senhor.”
A esta altura o leitor que não está acostumado com o termo CEBs ou mesmo com os as proposições da matriz mais popular da Igreja Católica e, de modo particular, com aqueles e aquelas que são adeptos da Teologia de Libertação, pode estar se perguntando, afinal o que é uma Comunidade Eclesial de Base?
A resposta, integrante do texto de acolhida, vem do Conselho Episcopal Latino-americano que, reunido em Puebla (México), em 1979, estabeleceu: “A CEB, como comunidade, integra famílias, adultos e jovens em estreito relacionamento interpessoal na fé. Como eclesial, é comunidade de fé, esperança e caridade, celebra a palavra de Deus e se nutre da Eucaristia, ponto culminante dos demais sacramentos; realiza a palavra de Deus na vida, mediante a solidariedade e o compromisso com o mandamento novo do Senhor; torna presente e atuante a missão eclesial e a comunhão visível com os legítimos pastores, através do serviço de coordenadores aprovados. É de base por estar constituída por um pequeno número de membros como forma permanente e como célula da grande comunidade”.
Programação desafia participantes a ver, julgar e agir
A metodologia do “Ver, Julgar e Agir” será guia na programação, na qual estão previstas plenárias, momentos culturais, tendas temáticas, celebração dos mártires, a eleição de compromissos para as CEBs do Rio Grande do Sul e também uma Feira da Economia Solidária.
No primeiro dia (sexta-feira, 19) após a acolhida será realizada a solenidade de abertura e a primeira celebração, bem como a plenária de análise da realidade, demarcando o verbo "ver" na metodologia, propondo a reflexão acerca dos migrantes de ontem e de hoje.
No segundo dia (sábado, 20), quando o verbo "julgar" guia a metodologia e se coloca em evidência a iluminação bíblica através da passagem que desafia “alargar o espaço da tua tenda”, serão realizados grupos de círculos bíblicos, visita às tendas temáticas e à Feira da Economia Solidária, apresentação da síntese dos grupos e assessoria. E segunda celebração do encontro, a tradicional Celebração dos Mártires e Defensores da Vida.
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No terceiro dia (domingo, 21) será realizada mística inter-religiosa e encontros por dioceses, colocando em prática na metodologia o verbo "agir", onde se evidencia a realidade atual dos migrantes deste tempo e os desafios da justiça e da amizade social. Neste dia haverá ainda a partilha dos compromissos, bem como as impressões e provocações do agir e horizontes da missão para as comunidades. O encontro encerra no final do terceiro dia com a leitura da Carta do 16º Encontro Estadual de CEBS do RS e a realização da terceira celebração, a missa de envio.
O padre Ramiro Mincato, assessor diocesano das CEBs na Diocese de Novo Hamburgo, explica que as Comunidades Eclesiais de Base são uma metodologia para trabalhar com o povo. “Nossas realidades diocesanas são terra de missão para a vida das pequenas comunidades. Por exemplo, o que fazer com as vilas, ruas e bairros que não possuem nenhum sinal visível da Igreja Católica? O Método das CEBs é o método missionário para isso”, ressalta em matéria publicada pela assessoria da CNBB.
A comunidade é quem acolhe, o povo é quem protagoniza
O sentido de uma Comunidade Eclesial de Base pode ser visualizado pelo trabalho de dezenas, talvez centenas de pessoas simples que dividem as tarefas e somam a força para coletivamente organizar e construir o 16º Encontro das CEBs do RS. É o que explica a leiga Elza Magalski, que assumiu a tarefa de atuar junto à organização do evento. “Estamos bem animados, recebendo as dioceses, preparamos tudo com muito carinho e alegria, esperamos que seja um encontro muito bonito e proveitoso para as pessoas e para as comunidades.”
No melhor espírito de fraternidade, quase que parafraseando aquele proverbio africano muito utilizado pelos coletivos de economia solidária (que diz que pessoas pequenas, em lugares pequenos, fazendo coisas singelas são capazes de realizar coisas extraordinárias e até mesmo mudar o mundo), Elza sintetiza: “Nós somos as pessoas que estão lá no canto, nas comunidades, nas vilas, nos bairros, nas periferias, somos as pessoas simples, trabalhando para acolher pessoas vindas de tantas dioceses para se reunir num único lugar para celebrar juntos e juntas, para pensar a continuidade da caminhada”.
As CEBs costumam utilizar como elemento de animação a figura de um trem, onde um vagão vai puxando o outro, todos sendo importantes para que o movimento se mantenha de forma contínua e dinâmica. Assim como as pessoas devem umas ir puxando, motivando, desafiando as outras ao passo seguinte, a manter-se em movimento, a ser agentes missionários e transformadores da realidade.
Mas qual seria o combustível da “locomotiva” que faz com que este trem se movimente, mesmo quando a dureza da realidade do mundo parece ser uma barreira difícil de se ultrapassar? “O que impulsiona é a alegria e a fé das pessoas”, responde dona Elza com a sabedoria característica das pessoas simples. “Estávamos ansiosos pela realização de mais um encontro, para nós, para cada pessoa que compõem a equipe que está organizando o encontro, há um sentimento de certeza de que a partir daqui vai se reanimar a caminhada, vai reascender a chama das nossas comunidades”.
Relembrar as raízes da formação para reinterpretar o momento presente
O arcebispo de Porto Alegre e atual presidente da CNBB, Dom Jaime Spengler, enviou uma mensagem de reflexão e motivação para as equipes de organização do encontro e para os mobilizadores das CEBs nas dioceses. Ele relembrou a característica de acolhida que demarca a formação do povo gaúcho e prospectando esse viés como elemento síntese para os novos tempos. “Alargar a tenda é uma experiência que faz parte da cultura do nosso povo. O nosso estado é formado essencialmente por uma tradição de migrantes."
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A reflexão do arcebispo chega aos tempos atuais. "Hoje esse fenômeno continua presente entre nós e as nossas comunidades de base, que tem a característica de serem eclesiais, têm a missão, a tarefa de acolher aqueles que desejam fazer parte da comunidade”. Ao chamar o povo para participar do encontro, Dom Jaime também convoca a participação ativa de cada um e cada uma na construção do novo. “Venham participar conosco deste momento de fé, mas também de construção de novos horizontes.”
A resposta ao chamado de Dom Jaime parece estar sintetizada no último parágrafo do texto dos jovens Iasmin Caroline de Veeck e Janderson Rangel Marx, que faz parte do texto base do encontro. “É preciso saber acolher, amparar e ser a base de apoio dessa ação de mudança e dar espaço para que ela se estabeleça em um solo fértil, crie raízes, brote, cresça e proporcione bons frutos a todos e todas.”
O encontro está apenas começando, mas já fica uma certeza: o trem das CEBs está passando nestes dias por São Leopoldo e vai passar também (se é que já não está passando neste momento) por perto de cada pequeno recanto onde há alguém disposto a ouvir o chamado e colocar-se a caminho.
Edição: Marcelo Ferreira