A Sala Redenção, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), recebe a mostra “Documentário e Militância na Ditadura Militar” entre os dias 25 a 28 de março. Com curadoria de Duda Ribeiro, a programação apresenta 11 documentários sobre diferentes movimentos sociais, produzidos na época da ditadura.
:: Descomemoração dos 60 anos do golpe civil-militar no Brasil ::
Todas as sessões, às 16h e às 19h, têm entrada franca e são abertas à comunidade em geral. O cinema da Ufrgs está localizado no campus centro da Universidade, com acesso mais próximo pela Rua Eng. Luiz Englert, 333.
As exibições dos filmes estão organizadas em três eixos temáticos de lutas sociais. O eixo “Reforma Agrária” aborda a luta por terras, enquanto “O Operariado Paulista” reúne filmes que clamam por melhores condições de trabalho. Por fim, “O Indizível” apresenta documentários que abordam diferentes pautas, como as crianças em situação de rua ou a denúncia às torturas e assassinatos da ditadura.
De acordo com programação, a mostra tem como objetivo aprofundar a reflexão sobre as lutas sociais. As projeções são acompanhadas de uma contextualização das obras, além de uma conversa com estudiosos da área de comunicação e cinema.
"Soterrados pelo fluxo incessante do cinema comercial"
A mostra de cinema é fruto da tese de doutorado de Duda Ribeiro, defendida em 2023 no Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCOM) da Ufrgs. Em seu estudo, a pesquisadora aborda as obras audiovisuais brasileiras que atuam como ferramenta de denúncia e de intervenção em conflitos.
De acordo com Duda, durante a ditadura militar iniciada em 1964 foram realizados dezenas de documentários junto aos movimentos sociais ou como ferramentas nas lutas e demandas populares. Contudo foram sufocados pela repressão.
“Eles têm até hoje uma visibilidade muito menor que a imensa beleza e coragem que os compõem. É por serem filmes 'menores', por serem tecnicamente 'simples', que puderam adentrar os sertões, as vielas, as ocupações, escutar os murmúrios dos silenciados e se depararem com urgências e realidades inalcançáveis aos filmes de estúdio”, expõe a curadora.
Segundo observa Duda, por não dependerem da corpulenta parafernália que requer o “grande cinema”, os filmes puderam transitar mais despercebidos, mais horizontalmente, entre o próprio povo. “Ainda hoje esses documentários são soterrados pelo fluxo incessante do cinema comercial que habita as salas de cinema multiplex, e são também, a um só tempo, escanteado pelo crivo dos festivais de cinema que priorizam acima de tudo a 'arte' e o 'novo'”, ressalta.
Pontua que dentre esse cinema “menor”, discreto, que correu às margens do culto aos proclamados grandes autores e gênios, encontram-se silenciosamente algumas das obras de mais alta importância, coragem e beleza do cinema brasileiro. Essa mostra, que ocorre em função dos 60 anos do golpe, e também como fruto de uma pesquisa de doutorado defendida no PPGCOM Ufrgs em 2023, que busca dar visibilidade a alguns desses filmes.
Programação
Sessões Reforma Agrária
25 de março | segunda-feira | 16h – Exibição de “Terra para Rose” + Conversa com Guilherme Almeida
27 de março | quarta-feira | 19h – Exibição de “Terra para Rose” e “Maioria Absoluta” + Conversa com Felipe Xavier Diniz
Terra para Rose (dir. Tetê Moraes | Brasil | 1987 | 88 min)
O filme registra a ocupação de uma fazenda no Rio Grande do Sul e investiga as políticas de reforma agrária no Brasil da Nova República e a atuação do MST. Para isso, aborda a história de Rose, uma das líderes cujo sonho é ter um pedaço de terra.
Maioria Absoluta (dir. Leon Hirszman | Brasil | 1964 | 18 min)
Filmado em som direto, o documentário retrata o cotidiano dos trabalhadores rurais analfabetos do Nordeste que vivem na extrema miséria. O filme ficou proibido no Brasil até 1980, período em que foi exibido fora do Brasil.
Sessões O Indizível
25 de março | segunda-feira | 19h – Exibição de “Cacau”, “Teremos Infância”, “Você também pode dar um presunto legal” e “Fim de Semana” + Conversa com Igor Porto
27 de março | quarta-feira | 16h – Exibição de “Cacau”, “Teremos Infância” e “Você também pode dar um presunto legal” + Conversa com Naara Fontinele
Cacau (dir. Leon Hirszman | Brasil | 1976 | 9 min)
Cantos de Trabalho é uma trilogia de Leon Hirszman, formada por Mutirão, Cacau e Cana-de-açúcar, três documentários de curta-metragem que registram as cantorias dos trabalhadores na zona rural do Nordeste.
Teremos infância (dir. Aloysio Raulino | Brasil | 1974 | 12 min)
Arnulfo Silva, ex-menor abandonado, relata as mazelas de sua infância, período em que foi vítima de todo tipo de sofrimento e humilhação, clamando por maior atenção às crianças de rua.
Você também pode dar um presunto legal (dir. Sérgio Muniz | Brasil | 1973 | 39 min)
Filmado clandestinamente, o documentário faz uma reflexão sobre a atuação do Esquadrão da Morte, sob o comando do delegado Sergio Paranhos Fleury, que serviu de guia e treinamento para a violenta repressão política, com torturas e assassinatos durante a ditadura militar.
Fim de Semana (dir. Renato Tapajós, Ermínia Maricato | Brasil | 1976 | 30 min)
Documenta as condições de vida nessas áreas e os sacrifícios em que se vêem empenhados os trabalhadores que desejam realizar o “sonho da casa própria”: construir, aos poucos, com a ajuda de amigos e parentes, aos fins de semana.
Sessões O Operariado Paulista
26 de março | terça-feira | 19h – Exibição de “Trabalhadoras Metalúrgicas”, “Que Ninguém, Nunca Mais, Ouse Duvidar Da Capacidade De Luta Dos Trabalhadores” e “A Luta Do Povo” + Conversa com Vinícius Andrade de Oliveira
28 de março | quinta-feira |16h – Exibição de “Trabalhadoras Metalúrgicas”, “Que Ninguém, Nunca Mais, Ouse Duvidar Da Capacidade De Luta Dos Trabalhadores” e “A Luta Do Povo” + Conversa com Julia Fagioli
Trabalhadoras metalúrgicas (dir. Renato Tapajós, Olga Futemma | Brasil | 1978 | 17 min)
As condições de trabalho das mulheres empregadas na indústria metalúrgica de São Bernardo do Campo (SP). Com cenas filmadas durante o 1 Congresso da Mulher Metalúrgica de São Bernardo e Diadema, em janeiro de 1978.
Que ninguém, nunca mais, ouse duvidar da capacidade de luta dos trabalhadores (dir. Renato Tapajós | Brasil | 1979 | 35 min)
O documentário aborda a primeira fase da greve dos metalúrgicos do ABCD, em 1979. Foi realizado para ser exibido aos operários durante a trégua entre as duas fases da greve, com o objetivo de mobilizá-los para a segunda fase.
A luta do povo (dir. Renato Tapajós | Brasil | 1980 | 30 min)
O documentário apresenta imagens das assembleias realizadas nas famosas greves de 1979 e 1980 dos metalúrgicos de São Paulo e do ABC paulista. É destaque o Movimento contra a Carestia, que coletou mais de um milhão de assinaturas, sobretudo na cidade de São Paulo, organizando protestos contra o alto custo de vida.
Sessões O Operariado paulista 2
26 de março | terça-feira |16h – Exibição de “Braços Cruzados, Máquinas Paradas”
28 de março | quinta-feira | 19h – Exibição de “Braços Cruzados, Máquinas Paradas” e “Acidente de Trabalho”
Braços cruzados, máquinas paradas (dir. Roberto Gervitz, Sérgio Toledo | Brasil | 1979 | 76 min)
São Paulo, 1978. Três chapas disputam a direção do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, o maior da América Latina, com 300.000 associados, e presidido por um “pelego”, desde o golpe militar de 1964. Em meio às eleições, eclodem as primeiras greves operárias que iriam mudar o país.
Acidente de trabalho (dir. Renato Tapajós | Brasil | 1977 | 19 min)
Sobre o problema dos acidentes de trabalho e a falta de segurança nas indústrias, com depoimento de trabalhadores feridos e dirigentes sindicais.
Edição: Marcelo Ferreira