Em março de 1964, há 60 anos, um grupo de militares golpistas saiu de Minas Gerais em direção ao estado da Guanabara e deu início a uma ditadura civil-militar que durou 21 anos. Jornais censurados, parlamentares cassados, opositores presos, torturados, desaparecidos ou banidos do país.
:: Marcelo Rubens Paiva conta a morte do pai nas mãos dos torturadores do Regime Militar ::
Caso de Diógenes José Carvalho de Oliveira, que dá nome ao mais novo centro de memória do país, em Porto Alegre, inaugurado em setembro de 2023 com sucesso de público.
No local, não houve a tortura que costuma caracterizar centros de memória, como o Memorial da Resistência, em São Paulo. Lá, ficava o Departamento de Ordem Política e Social (Deops), onde Oliveira esteve preso e foi torturado.
Diógenes de Oliveira, um dos poucos que sabia como encontrar o líder guerrilheiro Carlos Lamarca. Apesar de intensas torturas, nunca revelou o paradeiro de Lamarca, tornando-se uma lenda no meio da esquerda brasileira.
(José Mitchell)
Porém, no sobrado da capital gaúcha na Rua Lopo Gonçalves, onde Diógenes morou durante 35 anos, transitaram ex-guerrilheiros de diversas partes do Brasil que articularam a luta por Memória, Verdade e Justiça. Isso porque Diógenes foi um dos principais guerrilheiros da luta armada brasileira e em torno dele se agrupavam aqueles que sobreviveram ao “combate nas trevas”, como titulou Jacob Gorender.
Treinado em Cuba, onde conheceu Che Guevara, Diógenes foi um dos fundadores da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), em 1968. Entre as principais ações que protagonizou enquanto guerrilheiro urbano, em São Paulo, estão o bombardeio do Quartel General do II Exército e o justiçamento do capitão do exército dos Estados Unidos e agente da CIA, Charles Rodney Chandler. A ação foi realizada após reunião com Carlos Marighella.
Solto em troca do cônsul japonês Nobuo Okuchi, Diógenes resistiu com armas ao golpe no Chile e integrou a cúpula do Ministério do Planejamento da recém-independente Guiné-Bissau (África), onde conheceu a advogada portuguesa Marilinda Marques Fernandes, mãe de seus dois filhos.
Gaúcho, natural de Júlio de Castilhos, após a anistia Diógenes veio residir em Porto Alegre, onde foi secretário de transportes durante a prefeitura de Olívio Dutra (1990). Na Casa que hoje leva seu nome, se transformou em um personagem querido do bairro, a Cidade Baixa, ao longo de mais de três décadas circulando por suas ruas e avenidas.
No dia 28 de outubro de 2022, prestes a completar 80 anos, Diógenes faleceu em decorrência de um câncer. Dois dias depois de sua partida, Lula derrotou Bolsonaro na eleição para o chefe do Executivo, porém o derrotado não aceitou o resultado.
A história se repete, a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa.
(Karl Marx)
Em fevereiro deste ano, o ex-presidente pediu anistia em plena Avenida Paulista pela tentativa do golpe recente, com a justificativa de que no passado o seu campo, a extrema-direita, havia anistiado a esquerda. A confusão entre a violência dos ditadores e a resistência dos que se opunham ao fim da democracia no Brasil segue vigente. Homens como Diógenes até hoje são chamados de terroristas.
Do rio que tudo arrasta se diz violento, mas ninguém diz violentas as margens que o comprimem.
(Bertolt Brecht)
A intolerância por parte da extrema-direita brasileira também continua já que, novamente, tentou acabar com a democracia no Brasil no dia 8 de janeiro de 2023.
Por isso, é de grande importância marcar os 60 anos do golpe civil-militar no Brasil. Não só pela data ser “redonda”, mas pelo contexto que vive o país. Além disso, aqueles que lutaram contra a ditadura estão partindo, a exemplo do Diógenes, e esse é o momento de prestar uma grande homenagem a esses lutadores e reafirmar que a luta por Memória, Verdade e Justiça não vai acabar.
Para o dia, está previsto show com o músico Pedro Munhoz, famoso com a música “Canção da Terra”, tema da novela “Flor do Caribe” da Rede Globo. Os anfitriões Guilherme Oliveira, filho de Diógenes e jornalista, e Ciro Ferreira, músico e sociólogo, articulam também a presença de importantes nomes da política brasileira que foram presos durante a ditadura, como Olívio Dutra e Raul Pont.
Durante o evento, será lançado o calendário de descomemoração do golpe, com a participação de 53 organizações.
Serviço
O que: 60 anos do golpe
Quando: 27.03.2024 (quarta-feira) às 18h
Onde: Casa Diógenes Oliveira (Rua Lopo Gonçalves, 495)
* Filho do Diógenes Oliveira e jornalista
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Marcelo Ferreira