Programado para acontecer nesta sexta-feira (8), o ato do Dia Internacional da Mulher em Porto Alegre será transferido devido ao tempo chuvoso. A nova data escolhida para a mobilização unitária nas ruas da capital gaúcha é a próxima quinta-feira (14), dia em que completam seis anos do assassinato da vereadora carioca Marielle Franco.
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“Não queremos flores, queremos nossos direitos efetivados. As mobilizações do 8 de Março são fruto das lutas históricas das mulheres contra as desigualdades geradas pelo patriarcado. Desde o campo do trabalho e contra as inúmeras formas de violências sofridas tanto no público quanto no privado. Todo ano nessa data nos articulamos e mobilizamos. Mas nossas lutas ocorrem durante o ano todo. Não basta somente refletir, é preciso agir para que mudanças ocorram. A vida das mulheres importa e é isso que a gente vem demonstrar”, ressalta a psicóloga e integrante do Levante Feminista contra o Feminicídio Thais Pereira.
Para a promotora legal popular e presidenta da Associação das Promotoras Legais do RS, Fabiane Lara dos Santos, que é uma sobrevivente de feminicídio, a mobilização do 8M é importante por ser marcador de reflexão e de organização sobre todas as lutas das mulheres no âmbito social, cultural e político. “É um mês de luta que dá início a caminhada dos 365 dias de resistência”, afirma.
“Acho que o sonho da vida de toda feminista é que um dia a gente possa falar, no 8 de Março, só das nossas conquistas e não mais de violência. Queremos viver sem violência, um mundo de paz, um mundo de equidade, um mundo de oportunidades iguais para todas nós. Sabemos que está longe desse dia chegar, mas seguimos na luta”, complementa a presidenta do Conselho Estadual do Direito da Mulher (CEDM), Fabiane Dutra.
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Sobrevivente de feminicídio, Carol Santos, do Movimento Feminista Inclusivas e integrante do Levante Feminista, ressalta que as mulheres gaúchas, ativistas, lideranças, trabalhadoras e mães estão sofrendo com o abandono das políticas públicas para as mulheres, o que impacta diretamente nas suas vidas. “O 8M é mais um grito de todas as mulheres gaúchas contra todos os retrocessos e vidas silenciadas nós últimos anos. Juntas estaremos unidas para reafirmar nossas lutas por igualdade e direitos. Nenhuma mulher pode ficar para trás.”
Ações realizadas em Porto Alegre
Apesar da chuva, algumas ações se mantiveram, como da Themis, que nesta manhã realizou atendimentos jurídicos na Estação Mercado da Trensurb, com a 8ª edição da Estação Themis - Pela garantia dos direitos das mulheres. Além de contar com a presença de advogadas da organização, outros parceiros estiveram presentes, como Defensoria Pública do Estado (DPE) e Associação Gaúcha dos Advogados Trabalhistas (Agetra). A ação é realizada em parceria com a Trensurb.
“Estamos em uma zona central da cidade onde circulam muitas mulheres, com todos os marcadores sociais. É preciso que elas tenham a garantia do conhecimento sobre os seus direitos porque isso também é uma forma de prevenção de violência. Está orientação jurídica ela se faz muito importante principalmente porque a gente tem uma pesquisa recente que mostra que apenas 20% das mulheres brasileiras conhecem a Lei Maria da Penha. Precisamos fazer ações como essa que empoderem as mulheres e informe sobre seus direitos”, expõe a coordenadora da Área de Enfrentamento às Violências da Themis, Rafaela Capora.
Também se manteve a Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra 2024, que iniciou na capital gaúcha na manhã desta sexta-feira com uma agenda com o superintendente regional do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no RS, Nelson Grasseli. Uma delegação das mulheres assentadas e acampadas repassaram a pauta de reivindicações do movimento.
Assentamento emergencial para as cerca de 800 famílias acampadas, cestas básicas para as famílias acampadas no RS, cronograma de vistoria de áreas para futuros assentamentos, Pronaf Mulher, inclusão dos pagamentos e vencimentos de programas como Fomento Mulheres em processos de anistia de dívidas dentro da justificativa de Emergência climática no RS foram alguns dos temas tratados.
Na avaliação da comissão, mais do que nunca é preciso fortalecer o Incra, exigindo do governo federal orçamento para a superintendência estadual. “A nossa pauta já está amarelada e a resposta que tivemos é que na medida do possível algumas coisas estão andando, mas que falta orçamento e servidores para o Incra trabalhar como deveria.”
As ações programadas pelo movimento para acontecer durante à tarde também foram transferidas devido ao tempo chuvoso.
Violência de gênero e desigualdade no trabalho
Nesta quinta-feira (7) o Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgou os números do feminicídio no Brasil em 2023. De acordo com o levantamento, 1.463 mulheres foram vítimas de feminicídio no país, uma taxa de 1,4 mulheres mortas para cada grupo de 100 mil. Os dados revelam um crescimento de 1,6% quando comparado ao mesmo período do ano anterior, e ainda o maior número já registrado desde a tipificação da lei.
Faltando um ano para completar sua primeira década de atuação, a Lei 13.104/2015 considera feminicídio quando o assassinato envolve violência doméstica e familiar, menosprezo ou discriminação à condição de mulher da vítima. O termo foi cunhado em 1976 pela socióloga sul-africana Diana Russell, que sentiu a necessidade de diferenciar o homicídio de mulheres em razão do gênero.
No Brasil, a lei do feminicídio foi sancionada em março de 2015, contudo somente a partir de 2016 passou passaram a ser disponibilizados os indicadores para o período de janeiro a dezembro de cada ano. Conforme ressalta o levantamento do fórum, mesmo considerando a subnotificação de casos nos primeiros anos de vigência da legislação, ao menos 10.655 mulheres foram vítimas de feminicídio entre 2015 e 2023.
No RS, dados oficiais do Observatório de Violência Doméstica da Secretaria Estadual da Segurança Pública (SSP) apontam que, no ano passado, foram registradas 87 mortes de mulheres classificadas como feminicídio. Já de acordo com o levantamento do Lupa Feminista, foram registrados 102 óbitos.
“Mais que números, as vítimas da violência são mulheres que tiveram suas vidas extirpadas pelo machismo, pela legitimidade social da violência e pela omissão dos que deveriam protegê-las. Mais de 3,5 mil mulheres são vítimas de crimes violentos ao ano no Brasil. Um terço pelas mãos de homens que consideraram donos de suas vidas. O que resulta de um feminicídio é o silenciamento definitivo de uma mulher. Tristeza, luto, saudade. Mas para nós elas são inesquecíveis. Por isso vamos homenageá-las e lembrar à sociedade de que nenhuma mulher pode ser assassinada por razão de gênero ou discriminação”, destacam as organizadoras do Lupa Feminista.
Violências para além do feminicídio
Para além do femincídio, ápice da violência da gênero, a 10ª edição da Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher, realizada pelo Instituto DataSenado, aponta que, em 2023, 409,5 mil mulheres foram vítimas dos crimes de ameaça (291.098), lesão corporal (148.923) e homicídio (3.365). Em 492 casos, a violência aconteceu em casa. O levantamento é uma parceria com o Observatório da Mulher contra a Violência do Senado Federal, Instituto Avon e Gênero e Número.
Uma das razões que pode ajudar a explicar essa violência, de acordo como militantes e pesquisadoras das causas de gênero, é o machismo. O que é confirmado na pesquisa, que mostra que a percepção feminina majoritária é a de que o Brasil é um país muito machista. Comparando a média nacional (62%) com a de cada unidade federativa, percebe-se que há variações nos índices obtidos em nove delas. Entre aquelas em que o patamar é maior que o nacional estão Rio de Janeiro (73%), Pernambuco (72%), Ceará (68%) e Distrito Federal (69%).
Entre os estados que apresentam índices menores que a média nacional estão Amazonas (55%), Rio Grande do Sul (55%), Rondônia (54%), Santa Catarina (53%) e Roraima (50%). Para as demais unidades federativas, a percepção de que o Brasil é um país muito machista tem valores equivalentes aos encontrados na pesquisa nacional.
No mercado de trabalho
No quarto trimestre de 2023, 66,286 milhões pessoas estavam fora da força de trabalho e, dessas, 42,839 milhões eram mulheres, o que corresponde a 64,6% do total. Entre o quarto trimestre de 2022 e o de 2023, houve aumento de 358 mil mulheres e 26 mil homens fora da força de trabalho, um indicador da dificuldade de inserção e permanência que elas enfrentam no mercado de trabalho. É o que aponta a pesquisa Mulheres no mercado de trabalho: desafios e desigualdades constantes, do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
O rendimento médio mensal das mulheres (R$ 2.562) no quarto trimestre de 2023 foi 22,3% menor do que o recebido pelos homens (R$ 3.323). Entre todas as ocupadas, 39,9% recebiam no máximo um salário mínimo e, entre as negras, metade ganhava até esse valor (49,4%), enquanto essa proporção era de 29,1% entre as não negras e de 29,8% entre os homens. Já entre aqueles que terminaram o ensino superior, elas ganhavam, em média, R$ 4.701, 35,5% a menos do que eles (R$ 7.283).
Edição: Marcelo Ferreira