O Rio Grande do Sul vive uma epidemia de dengue desde o início de 2024, de acordo com dados do Painel da Dengue da Secretaria Estadual de Saúde (SES/RS), dos 497 municípios do estado, 466 (93,8%) enfrentam infestação do mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue. Até o momento, houve 8.131 notificações de casos suspeitos da doença. Desse total, 3.840 foram confirmados e 3.458 seguem em investigação, tendo sido descartados 1.876. Foram registradas, também, três mortes por dengue no Rio Grande do Sul.
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Segundo a Secretaria da Saúde (SES), nas primeiras cinco semanas de 2024, o estado teve 18 vezes mais casos notificados e confirmados do que no mesmo período de 2023. Além disso, nos últimos 10 anos, nunca houve uma soma tão alta de casos no início do ano. A macrorregião Norte é a que possui a maior quantidade de casos confirmados. Ao todo, somente em 2024, já são 2.388 pacientes que testaram positivo para a doença, na região. Isso representa quase 65% dos casos do estado.
Fenômenos climáticos como o El Niño e as chuvas intensas que afetaram o Rio Grande do Sul nos últimos meses podem ter contribuído para o aumento do número de casos de dengue. Em resposta à alta de infecções nas últimas semanas, o governo estadual e governos municipais estão intensificando as ações de enfrentamento à doença.
O governador Eduardo Leite está buscando viabilizar, junto ao governo federal, a distribuição de vacinas contra a dengue. Em reunião virtual com a ministra da Saúde, Nísia Trindade, na tarde da quarta-feira passada (7), Leite reforçou o pedido pelo avanço seguro e ágil da estratégia de vacinação contra a doença.
O estado elaborou e vem executando um plano de contingência para combater a proliferação. As ações abrangem vários eixos – como disponibilização de insumos aos municípios; supervisão e apoio em treinamentos e capacitações; e aplicação de estratégias. Estado e municípios possuem competências diferentes no enfrentamento à dengue. As prefeituras são responsáveis pela execução direta das ações, enquanto o Executivo estadual tem a atribuição de monitorar, coordenar, gerir e orientar as iniciativas de combate.
Em Porto Alegre a Vigilância já se preocupa com sistema de saúde
A situação é de alerta na saúde de Porto Alegre em razão dos números da dengue na cidade. Nas cinco primeiras semanas do ano, a Capital tem número de casos e suspeitas equivalentes a 10 vezes a mais na comparação com o mesmo período do ano passado. Com prognóstico ruim, a Vigilância Sanitária admite preocupação também com o sistema de saúde.
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Embora tenha ocorrido uma diminuição nos casos de dengue em nível estadual entre 2022 e 2023, a situação em Porto Alegre apresentou um cenário contrário, com um aumento de 10% de um ano para outro. De acordo com a diretora de Vigilância Sanitária, Evelise Tarouco da Rocha, a expectativa é de um aumento contínuo dos casos, uma tendência já prevista pelo órgão e que se confirma com os primeiros dados de 2024.
Conforme boletim da Secretaria Municipal da Saúde, que considera os registros até a quinta semana epidemiológica – que terminou em 3 de fevereiro –, Porto Alegre já somava 51 casos confirmados da doença e 911 suspeitos. Um ano atrás, esses dados eram de cinco diagnósticos e 95 notificações neste período.
“A gente nunca teve neste período do ano este quantitativo de casos e o nosso índice de infestação está bem alto. Tudo indica que o cenário vai ser bem pior que o do ano passado e o de 2022”, analisou Evelise, que manifestou também preocupação com os cenários regional e nacional. “Os dados já indicam que o cenário vai ser bastante crítico.”
Risco de sobrecarga no sistema de saúde
Com tamanha preocupação, ela já antevê um cenário crítico no sistema de saúde de Porto Alegre, em razão da demanda por atendimentos. “Estamos organizando estrutura que a gente possa acionar em caso de colapso”, adiantou. Para a diretora, isso não significa que cenas como as vistas em hospitais durante a pandemia de covid-19 se repitam, mas o quadro exige adequação do sistema. “A gente acredita que não vai ser neste nível (da pandemia), mas vamos precisar de uma estrutura de saúde que possa atender as pessoas e ter pontos de hidratação”, explicou.
Hidratação, aliás, é fundamental no tratamento à dengue – e possivelmente o desafio aos órgãos de saúde, que deverão dispor de hidratação não apenas oral, mas também da aplicação intravenosa em mais pontos da cidade. Segundo Evelise, o principal perigo da dengue é a desidratação, que nem sempre é perceptível em todos os pacientes diagnosticados. “Precisamos ter estrutura, fazer diagnóstico. E ter pontos de hidratação na cidade, para que a gente possa dar esse suporte”, enfatizou.
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Mas antes do tratamento, claro, a Vigilância ressalta a importância da prevenção, a partir do combate a focos do mosquito, cujas larvas se desenvolvem em água parada. As ovas do Aedes Aegypti podem ficar até um ano inativas até se desenvolverem, por isso também a importância da limpeza constante de locais. Como as fêmeas costumam desovar até quatro vezes por mês, ações semanais de dez minutos podem eliminar possíveis focos.
Regiões mais críticas
Neste momento, o ponto mais crítico de casos fica entre o 4º Distrito e a zona Norte, na divisa entre os bairros Floresta e Auxiliadora. No entanto, ao menos em uma primeira análise, a Vigilância entende que não será necessariamente ali que o foco de dengue em 2024 se concentrará. Sabe-se, contudo, que o mosquito se espalhou para outras áreas da cidade, antes menos afetadas. “Não dá pra dizer que o foco vai ser aqui ou ali. Nos últimos anos, o foco sempre foi na zona Leste. Ainda imaginamos que lá vai ser o pior cenário, mas já neste início de ano, estão aparecendo casos espalhados em regiões que antes não tinha”, afirmou a diretora da Vigilância.
“Nos últimos dois anos tivemos casos em quase todos os bairros. Mas para considerar um surto… mais de 80% dos casos foram na região Leste. Esse ano ainda não sabemos onde vai se concentrar ou se vai ser espalhado mesmo”, comentou Evelise. “Temos infestações em todos os bairros da cidade e estamos tendo circulação de vírus em várias regiões, mas o que vai determinar onde será o maior volume são bairros com maior densidade populacional.”
Situação em São Leopoldo também causa alerta
O prefeito de São Leopoldo, Ary Vanazzi, anunciou, por meio de uma transmissão ao vivo nas redes da Rádio Prefeitura, a criação de uma força-tarefa integrando diversas secretarias no combate ao mosquito Aedes Aegypti, transmissor da dengue, zika vírus e febre Chikungunya. Em seguida, informou que aguarda parecer técnico para decretação de Estado de Emergência. Também será criado um protocolo e um fluxo específico de atendimento para casos suspeitos nas unidades.
Até o momento foram diagnosticados 132 casos na cidade. Outros 63 estão em investigação. Os números de janeiro e fevereiro já superam a soma de todo o ano passado, quando se contabilizou 113 casos da doença. Os bairros mais afetados são Vicentina e São José.
Vanazzi não descarta o decreto de um Estado de Emergência para possibilitar a contratação emergencial de novos agentes. “A Procuradoria-Geral do Município junto com o pessoal técnico da saúde está verificando essa situação que agilizaria nossas ações. Enquanto isso, estamos com carro de som alertando e orientando e vamos intensificar o enfrentamento com uma operação envolvendo as Secretarias de Mobilidade e Serviços Urbanos (Semusp), Orçamento Participativo (Semop), Saúde (Semsad) e Superintendência de Comunicação (Scom), recolher materiais, fiscalizar e mobilizar a comunidade e chamar a população nesse esforço. A colaboração dos moradores é fundamental no cuidado dentro das casas”, reforçou.
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Presente na reunião, o secretário Geral de Governo, Nelson Spolaor, salientou a necessidade do trabalho conjunto entre governo e população. “Vamos ampliar nossas ações de orientação, limpeza e fiscalização, integrando as secretarias e focando nos bairros mais atingidos. Mas tudo isso precisa do apoio da comunidade. Superamos epidemias piores e certamente vamos superar a dengue, com este esforço coletivo.”
Medidas anunciadas
A secretária de Saúde, Andréia Nunes, alertou a população para os cuidados, diante do aumento de casos confirmados. “Estamos organizando uma capacitação com médicos e enfermeiros das Unidades Básicas de Saúde (UBSs), visando um novo protocolo de atendimento que agilize diagnóstico clínico da doença, além de todo o trabalho das equipes nos locais com maior incidência”, destacou.
Na atividade serão abordados assuntos como: Epidemiologia das arboviroses, manejo clínico da dengue e fluxos municipais. A compra de testes rápidos é uma das ações em discussão para um maior controle. Porém, os testes não são 100% eficientes, por isso é necessário que a equipe responsável esteja bem orientada e treinada sobre os possíveis erros (falso negativo).
Também será liberado horas-extras para profissionais ligados ao combate e tratamento da doença. As unidades básicas seguem como referência de atendimento. As UBSs Cohab Feitoria e Brás atendem até as 20 horas. Centro de Saúde Feitoria, Upa Zona Norte e Hospital Centenário ficam abertos 24 horas.
Assistência Social - A Secretaria de Assistência Social (SAS) fará um levantamento das famílias vinculadas ao Bolsa Família para receberem repelentes de forma gratuita. O produto é entregue atualmente em locais com casos confirmados.
Orçamento Participativo – Agentes serão chamados para ajudar na conscientização de lideranças e moradores dos bairros.
Comunicação – Ampliação de horas de carros de som para rodar nos bairros com maior incidência de casos. Novos panfletos serão impressos para orientação de moradores. Materiais informativos estão disponíveis nas redes sociais.
Serviços Urbanos – Junto com a Vigilância Ambiental, a secretaria terá a função de organizar mutirões para recolhimento de materiais e recipientes que acumulam água.
Sintomas e prevenção
Os principais sintomas de uma pessoa infectada com dengue são febre alta (39°C a 40°C), com duração de dois a sete dias; dor retroorbital (atrás dos olhos); dor de cabeça, no corpo e nas articulações; mal-estar geral; náusea, vômito e diarreia; manchas vermelhas na pele, com ou sem coceira.
A SES recomenda medidas de prevenção à proliferação e circulação do Aedes. Entre elas a limpeza e revisão das áreas interna e externa das residências ou apartamentos e eliminação dos objetos com água parada, ações que impedem o mosquito de nascer, cortando o ciclo de vida na fase aquática.
O uso de repelente também é indicado para maior proteção individual contra o Aedes Aegypti.
Cuidados dentro das casas e apartamentos:
- Tampe os tonéis e caixas d’água;
- Mantenha as calhas sempre limpas;
- Deixe garrafas sempre viradas com a boca para baixo;
- Mantenha lixeiras bem tampadas;
- Deixe ralos limpos e com aplicação de tela;
- Limpe semanalmente ou preencha pratos de vasos de plantas com areia;
- Limpe com escova ou bucha os potes de água para animais.
Área externa de casas e condomínios:
- Cubra e realize manutenção periódica de áreas de piscinas;
- A água da piscina deve ser tratada o ano inteiro;
- Limpe ralos e canaletas externas;
- Atenção com bromélias, babosas e outras plantas que podem acumular água;
- Deixe lonas bem esticadas, para evitar formação de poças d’água;
- Guarde os pneus em local coberto ou fure-os para que não acumulem água;
- Não deixe água da chuva acumulada em qualquer lugar.
Edição: Katia Marko