Naquele tempo, a solidariedade carregava possibilidades de sementes e frutos
Dia cheio de tarefas, um tanto de vinho e precisando escrever a coluna sem ter um foco, divaguei geral e acabei preso a isso.
Salve o Criador, João Bosco escreveu e musicou.
A música falava da gente. De estar no paraíso com a consciência de poder ser o pó que renova a terra, ou muito mais do que isso.
E lembrei... quem era jovem, e ouvia, estendia a mão.
Naquele tempo a solidariedade carregava possibilidades de sementes e frutos, apontando caminhos onde sempre parecia haver algo por florescer. Em tudo, e de tudo, emergiam promessas que geravam parcerias, confiança e impulsos de saltar no escuro, nadar no rio, pegar a estrada.
Mas de repente, já não era mais assim.
Vieram as cercas, as regras e o medo das surpresas.
Era o controle, trazendo o empenho por dominar aquilo que em nós teimava viajar. Era a ânsia de ter, que chegava, transformando, dominando o que pensávamos poder ser.
Conexões foram sendo trocadas por produtos.
Coisas, lotes, lixos, mercadorias amarradas a um mesmo padrão de medida. Regra única para qualquer conteúdo, nos fazendo menores.
E aqui estamos. Isolados, alheios à morte das crianças na faixa de Gaza, à aprovação do pacote do veneno, à derrubada do veto ao Marco Temporal, à tragédia ambiental, à ascensão do fascismo.
A empatia, a intuição, a solidariedade, o amor, as forças orientadas pela beleza, tudo aquilo que fomos, que não podia ser definido, que não podia ser pesado ou medido, agora não passam de cicatrizes?
Em algum lugar, em outro tempo, mas jamais como antes, escutando aquela música me pergunto onde está você, agora?
E, por fim, não deixe de assistir o último Programa Arte, Ciência e Ética num Brasil de Fato de 2023, com o jornalista Altamiro Borges (Miro):
* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko