Rio Grande do Sul

DIREITOS DA MULHER

Frente Parlamentar contra a Violência Política de Gênero é instalada na Assembleia Legislativa do RS

A iniciativa da deputada Bruna Rodrigues (PCdoB) buscará a estabelecer mecanismos de garantia do direito das mulheres

Brasil de Fato | Porto Alegre |
Iniciativa da deputada Bruna Rodrigues (PCdoB), frente foi instalada nesta quarta-feira (6) - Foto: Celso Bender

A Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul conta agora com a Frente Parlamentar contra a Violência Política de Gênero, por iniciativa da deputada Bruna Rodrigues (PCdoB). Os trabalhos da frente serão voltados a estabelecer mecanismos de garantia do direito de liberdade de expressão e participação política para mulheres candidatas a cargos eletivos ou parlamentares. A instalação ocorreu na quarta-feira (6).

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Desde agosto de 2021, quando foi sancionada a Lei n. 14.192, a violência política de gênero passou a ser crime no Brasil. A desqualificação da mulher na política pela indução à crença de que a mulher não possui competência para a função a que ela está exercendo, ou o questionamento da mulher, seja ela candidata ou com mandato político, sobre a sua vida privada (relacionamentos, sexualidade, maternidade) são exemplos deste tipo de violência.

Para Bruna Rodrigues, a violência política de gênero não nasce com a legislação, ela é um dos fenômenos mais violentos da vida que acompanham as mulheres. “Eu não conheço nenhuma mulher que tenha se encontrado com a luta e que em algum momento da vida não tenha vivido alguma situação de violência política de gênero. E quando a gente fala e intersecciona gênero e raça, essa seara fica ainda mais violenta”, avaliou.

A deputada ainda reforçou que a violência política de gênero é um projeto político, que impede que mulheres como ela possam ocupar espaços de poder na política de forma plena. “Eu ouvi dentro do plenário da Câmara de Vereadores que eu só podia ter tesão por um vereador, por defender de forma firme a retirada dos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras do sistema de transporte. Eu só podia ter tesão por ele. Não contente, um dia depois de ser indiciado ele entra com o processo de agressão contra mim. E eu fui condenada pelo Judiciário gaúcho”, relembrou Bruna sobre a agressão que sofreu por parte do Alexandre Bobadra, ex-vereador de Porto Alegre pelo PL.

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Já a advogada Márcia Soares, diretora executiva da Themis – Gênero, Justiça e Direitos Humanos, relembrou a violência política de gênero sofrida por Dilma Rousseff, em 2015, na época em que era presidente do Brasil. Alguns brasileiros circulavam em carros com adesivos colados na entrada do tanque de gasolina, onde a presidente aparece de pernas abertas, com a entrada do tanque de gasolina ficando entre suas pernas.

“Para mim, isso é muito simbólico, porque a violência política vem sempre associada, de alguma forma, à violência sexual e à violência racial. E tentando trazer essa intersecção, quero dizer para vocês também que todos nós acompanhamos a deputada Maria do Rosário, quando foi agredida, também do ponto de vista da sua condição de gênero e sexual, assim como com a deputada Manuela D'Ávila”, comentou.

Márcia enfatizou que a violência política de gênero acontece dentro dos partidos e não apenas nos parlamentos. “Nós temos um caso presente, um caso muito sério da companheira Ariane Leitão que nós, enquanto Themis, não vamos deixar que se encerre. Este caso para nós nunca, ele não vai se encerrar. Nós, enquanto organização, estamos aqui para dizer a todas as companheiras e companheiros dos partidos que a Themis toma para si essa tarefa de não deixar que esse caso se encerre”, comentou.

Representando o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJ-RS), a juíza Thais Coulau de Barros reforçou que a subrepresentatividade das mulheres, em especial das mulheres negras, representa uma falta de democracia. “Onde não temos representatividade, não temos democracia. É importante que se fale nisso, é importante que se instale essa frente parlamentar, porque dando visibilidade ao tema, trazendo o tema à discussão, é que se combate essas violências”, enfatizou.

Por outro lado, a deputada estadual Laura Sito (PT) destacou o poder simbólico da instalação da frente parlamentar. “Esta casa em quase 200 anos pela primeira vez tem mulheres negras parlamentares nesta casa. Pela primeira vez são eleitas mulheres negras deputadas nesse estado. E nós sentimos diariamente na pele a intersecção do que o patriarcado e o racismo são capazes de nos negar o pertencimento à ocupação dos espaços de poder”, destacou.

A parlamentar também reforçou a importância da articulação política entre mulheres para que se possa, de maneira unitária, combater o patriarcado diariamente. “Isso falo aqui no lançamento dessa frente porque é um ensinamento duro e muitas vezes difícil porque a dinâmica da política, ela é uma dinâmica que nos divide. É uma dinâmica masculina, uma dinâmica que coloca as nossas pautas em segundo plano, que fala dos nossos temas como se eles não fossem temas pertencentes do todo. Nós precisamos estar em um nível de compreensão, de despreendimento e de compreender que a lógica do sistema político é uma lógica que sufoca a nossa existência no espaço da política, para que nós sejamos capazes de contrapor esse espaço, de contrapor essa lógica”, avaliou.


O ato iniciou com uma performance das artistas Tânia Farias e Cris Obelar, que apresentaram um fragmento do Manifesto de uma Mulher de Teatro / Foto: Celso Bender

A cerimônia encerrou com a participação da deputada federal Daiana Santos (PCdoB), enquanto coordenadora do eixo da violência política de gênero na Secretaria da Mulher da Câmara dos Deputados. Ela enfatizou que o órgão tem agido de forma muito contundente nos casos denunciados em seus canais de atendimento.

“A livre participação em espaços onde nós temos delimitada a nossa atuação, ela não pode ser considerada algo que a sociedade relativize. Nós precisamos ter aí uma incidência de forma muito ativa para que tenhamos ainda mais mulheres ocupando esses espaços. Se hoje a nossa representatividade nesses lugares não se dá de forma plena, pode ter certeza que é por conta dessas violências. E a violência política de gênero é algo que precisa ser combatida”, avaliou.

Tipos de violências sofridas pelas mulheres na política

A violência pode ocorrer por meio virtual (com ataques em suas páginas, fake news e deepfakes) e também nas ruas, quando as mulheres que atuam na política são atacadas por eleitores. Elas podem ser vítimas tanto em seus partidos como dentro de casa. As ações se dão de forma gradativa e podem chegar até ao assassinato.

Na condição de candidatas, as mulheres sofrem violência política de gênero, principalmente, por:

  • ameaças à candidata, por palavras, gestos ou outros meios, de lhe causar mal injusto e grave;

  • interrupções frequentes de sua fala em ambientes políticos, impedimento para usar a palavra e realizar clara sinalização de descrédito;

  • desqualificação, ou seja, indução à crença de que a mulher não possui competência para a função a que ela está se candidatando ou para ocupar o espaço público onde se apresenta;

  • violação da sua intimidade, por meio de divulgação de fotos íntimas, dados pessoais ou e-mails, inclusive montagens;

  • difamação da candidata, atribuindo a ela fato que seja ofensivo a sua reputação e a sua honra;

  • desvio de recursos de campanhas das candidaturas femininas para as masculinas.

Já eleitas, as mulheres são vítimas de violência, quando:

  • não são indicadas como titulares em comissões, nem líderes dos seus partidos ou relatoras de projetos importantes;

  • são constantemente interrompidas em seus lugares de fala;

  • são excluídas de debates;

  • são questionadas sobre sua aparência física e forma de vestir;

  • são questionadas sobre suas vidas privadas (relacionamentos, sexualidade, maternidade).

Há também algumas práticas invisíveis:

  • violência emocional por meio de manipulação psicológica, que leva a mulher e todos ao redor a acharem que ela enlouqueceu;

  • quando o homem explica à mulher coisas simples, como se ela não fosse capaz de compreender;

  • a constante interrupção, impedindo a mulher de concluir pensamentos ou frases;

  • quando um homem se apropria da ideia de uma mulher.

Canais para denúncia

Central de Atendimento à Mulher – Ligue 180: registra e encaminha denúncias de violência contra a mulher aos órgãos competentes. O serviço também fornece informações sobre os direitos da mulher, como os locais de atendimento mais próximos e apropriados para cada caso: Casa da Mulher Brasileira, Centros de Referências, Delegacias de Atendimento à Mulher, Defensorias Públicas, Núcleos Integrados de Atendimento às Mulheres, entre outros. A ligação é gratuita e o serviço funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana. O Ligue 180 atende todo o território nacional e também pode ser acessado em outros 16 países.


Edição: Marcelo Ferreira