Entidades representativas dos segmentos da educação gaúcha, acompanhadas da presidenta da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa, deputada Sofia Cavedon (PT), entregaram, na manhã desta quarta-feira (6), ofício à Casa Civil pedindo a retirada do regime de urgência do pacote de alterações na educação estadual.
O documento traz as considerações debatidas em audiência pública sobre o tema na segunda-feira (4), que reuniu entidades, professores, alunos e parlamentares. O governo Eduardo Leite (PSDB), apesar dos convites, não enviou representantes.
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O documento pontua a preocupação com os Projetos de Lei (PLs) e Proposta de Emenda Constitucional (PEC) protocolados pelo governo, que alteram conceitualmente e estruturalmente a Política Educacional do estado. “O envio em regime de urgência de projetos com estas características, no nosso entendimento, não dialoga com uma ação que deveria ser construída de forma democráticas, participativa e respeitando as diferentes organizações que atuam na área educacional”, afirma.
Os PLs e a PEC do governo foram protocolados em regime de urgência e passam a trancar a pauta de votações na Assembleia Legislativa a partir de 12 de dezembro, menos de 10 dias para o recesso de verão. O ofício solicita o fim da urgência para que a Assembleia Legislativa, antes de votar as propostas, promova um processo amplo de discussão, uma “escuta democrática, oportunizando o diálogo, o contraditório”.
Segundo a deputada Sofia Cavedon, o grupo foi recebido pelo chefe de gabinete da Casa Civil. "O governador então está oficiado de que o conjunto das redes de ensino solicita a retirada da urgência e a abertura de diálogo. Se isso não acontecer, fica mais uma vez caracterizado o autoritarismo e a imposição de mudanças na educação que não correspondem ao anseio de quem dela faz direito e de quem a realiza no estado", afirma.
O Pacote da Educação
PEC 299/2023 – modifica os artigos 199, 211, 214, 215 e 216 da Constituição estadual e abre caminho para o processo de municipalização do Ensino Fundamental.
PLC 517/2023 – cria um marco legal para a educação do Estado, estabelecendo uma série de princípios, diretrizes e metas. Não define como será feita sua operacionalização.
PL 518/2023 – modifica a lei 9.672/1992, que trata da composição, do funcionamento e das atribuições do Conselho Estadual de Educação.
PL 519/2023 – altera a gestão nas escolas da rede pública estadual com mudanças na composição do conselho escolar, na autonomia financeira e no processo de seleção para diretores.
PL 520/2023 – institui a política estadual de Educação Profissional e Técnica (EPT), cria uma superintendência e estabelece as formas de oferta de EPT e do Curso Normal.
Municipalização criticada na audiência
Uma das principais críticas diz respeito à intenção, expressa no PL 517/2023, que institui o Marco Legal da Educação, de municipalizar o Ensino Fundamental, por meio do regime de colaboração entre estado e municípios. Para a presidenta do Cpers Sindicato, Helenir Aguiar Schürer, o projeto é a forma encontrada pelo governo para driblar a vontade das comunidades.
“Hoje, só pode municipalizar se a comunidade escolar concordar. E o governo odeia isso”, apontou durante a audiência pública. Ela lembrou que o estado do Mato Grosso está revertendo as municipalizações por causa dos problemas que geraram para as prefeituras.
Mudanças no Conselho Estadual de Educação
As mudanças na composição, funcionamento e atribuições do Conselho Estadual de Educação, previstas no PL 518/2023, também foram atacadas pelos participantes da audiência pública. De acordo com a presidenta do Cpers, a proposta diminui a participação da sociedade e aumenta o número de conselheiros indicados pelo governador.
A presidente do órgão, Fátima Ehlert, defendeu que o projeto nomeie as entidades que terão assento no conselho, não permita a nomeação de CCs para compor o colegiado e garanta a conclusão dos mandatos dos atuais conselheiros em 2026. Além disso, ela propõe a supressão do artigo que diz que a secretária de Educação presidirá as reuniões em que estiver presente.
Gestão democrática
As modificações na Lei da Gestão Democrática do Ensino Público, previstas no PL 519/2023, foram tachadas de retrocessos pela pesquisadora em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs) Maria Beatriz Luce. Para ela, a involução acontece, especialmente, na participação e no controle social.
A também pesquisadora da Ufrgs Mariângela Silveira Bairros disse que o projeto é inconstitucional, pois proíbe que professores sindicalizados sejam diretores de escolas. Explicou ainda que o texto do projeto não se refere à eleição de diretores, mas à indicação, corroborando com o que já vem acontecendo na maior parte das escolas municipais do Brasil e do Rio Grande do Sul. Segundo ela, escolas municipais de 418 municípios gaúchos têm diretores indicados e não mais eleitos.
Fica espanhol
O fim do ensino da Língua Espanhola também gerou reação e a criação do Movimento Fica Espanhol. Uma emenda está sendo articulada entre deputados da oposição e do PDT para garantir a permanência da disciplina na grade curricular. A proposta, segundo levantamento dos participantes da audiência, já contaria com o apoio de 21 deputados.
A audiência também teve a participação de professores, diretores de escolas, estudantes, pesquisadores em educação e representantes de entidades ligadas a educação, além de integrantes do Movimento Pais pela Democracia e do Movimento Trabalhista pela Educação .
Nenhum representante do governo compareceu, sob a alegação de que o tema já havia sido debatido em audiência realizada na semana anterior. O deputado Jeferson Fernandes (PT), que participou de forma virtual, disse que as propostas que chegaram ao Parlamento não surpreendem, pois “seguem a lógica privatista do governo Eduardo Leite, que vende patrimônio e terceiriza o serviço público”.
* Com informações da Agência de Notícias ALRS
Edição: Marcelo Ferreira