Entidades sindicais que representam empresas e trabalhadores que atuam em serviços terceirizados acordaram formar uma mesa de negociação para construir um pacto de boas práticas, que assegurem trabalho decente e redução da concorrência desleal. Os alicerces para isto foram estabelecidos com a mediação da Superintendência do Ministério do Trabalho e Emprego do Rio Grande do Sul, em duas reuniões realizadas na última quinta e sexta-feira (26 e 27) com dezenas de representações patronais e laborais.
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Estudo apresentado pela Federação dos Trabalhadores em Empresas de Asseio e Conservação (Feeac) aponta que o estado do RS tem mais de R$ 20 milhões envolvidos em ações judiciais com terceirizadas. Em dois casos citados com processos na Justiça do Trabalho, apenas uma empresa tem 545 processos e a outra 871. Embora os maiores volumes estejam na Capital, há judicializações em dezenas de municípios.
Cerca de 40% dos processos que tramitam no Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região se referem a pendências laborais relativas à terceirização.
“Estamos construindo um documento conjunto com compromissos para aumentar o rigor nas práticas no ambiente terceirizado e assegurar trabalho decente e maior segurança para empreendedores responsáveis. Vamos buscar apoio de órgãos públicos para formalizar propostas de consenso que tenham força capaz de gerar mudanças na lei se necessário”, sintetizou o superintendente do MTE no RS, Claudir Nespolo, que conduziu as reuniões setoriais.
Sindicatos patronais apontam sugestões
Na reunião da quinta-feira estiveram presentes representantes do Sindicato Asseio e Conservação do Estado do Rio Grande do Sul (Sindasseio), Sindicato Nacional das Empresas Prestadoras de Serviços e Instaladoras de Sistemas e Redes de TV por Assinatura, Cabo, MMDS, DTH e Telecomunicações (Sinstal) e Sindicato das Empresas de Segurança Privada do Estado do Rio Grande do Sul (Sindesp).
Entre os pontos destacados pelos participantes estão legislações desatualizadas, comissões de licitação despreparadas e ausência de critérios claros tem trazido insegurança jurídica aos empresários.
Todos manifestaram a importância deste movimento conjunto para assegurar que empresas idôneas possam investir e operar com mais segurança nas contratações. “É uma pauta de interesse de toda a sociedade e estamos aqui para colaborar”, declarou a presidente do Sindasseio, Adriana Melo.
Os representantes dos trabalhadores destacaram a existencia de um conjunto de brechas e imprecisões legais que dão margem a questionamentos judiciais. Além disso geram enormes passivos, prejudicando tanto empreendedores, poder público como trabalhadores.
“Estamos acompanhando esse diálogo social entre empregadores, trabalhadores e entidades que regulam e governam o mundo do trabalho, para elevar o patamar das relações nesse ambiente. O mercado de trabalho tende à crescente terceirização e esse processo sem critérios leva à degradação das condições de trabalho, emprego e remuneração”, analisa a economista do Dieese, Lúcia Garcia. Especialista no mundo do trabalho, ela acompanhou o encontro como observadora do Instituto do Trabalho e Transformação Social (ITTS).
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De acordo com Lúcia, sobre a sociedade recai um custo elevadíssimo em termos de judicialização e perda de qualidade do serviço público. “Precisamos encontrar um novo espaço de regulação das relações sociais e de trabalho e aqui estão sendo construídas de maneira negociada”, completa a especialista.
Fechar portas para práticas abusivas
Segundo destacou Claudir Nespolo, há empenho em construir um consenso entre empregadores e trabalhadores para coibir a concorrência desleal e assegurar trabalho decente no ambiente das terceirizações, tanto no serviço público como nas contratações privada. Para ele, construir regras coletivas garante maior cuidado na hora de contratar.
“Ao avançar na legislação do trabalho terceirizado se fecham as portas de práticas abusivas que degradam os direitos dos trabalhadores”, registra o superintendente do MTE.
A pauta para um pacto que corrija práticas prejudiciais ao empreendedorismo e ao trabalho proposta pelo MTE já encontrou apoio de instituições como o Tribunal Regional do Trabalho, o Tribunal de Contas do Estado e Governo do Estado, através da Secretaria de Estado do Planejamento, Gestão e Inovação, confirmou Claudir Nespolo. Ele adiantou que tem reuniões agendadas com os presidentes da Famurs e da Associação Brasileira dos Municípios para abordar a pauta que tem afligido os gestores públicos.
As más práticas de empresas terceirizadas no serviço público têm resultado em duplo pagamento, onerando os cofres públicos e gerando enormes passivos nas três esferas de governo.
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Regulamentação
Na reunião de sexta-feira estiveram presentes representantes de dez entidades de trabalhadores ligados à Feeac, Senergisul, Sindibancários, Semapi, Sintec, Sinttel, Fitratelpi, Sintratel e Federação dos Sapateiros do RS, além de técnicos e auditores do MTE e observadores do Instituto do Trabalho e Transformação Social (ITTS).
O movimento "Trabalho Terceirizado – Diálogo Tripartite: concorrência desleal e não pagamento de direitos. Como aumentar os procedimentos preventivos?” iniciou em setembro e terá novas reuniões com agentes públicos para compor os termos do acordo.
Regulamentação foi o pedido comum dos segmentos. Condições de trabalho degradantes, assédio moral, atraso e não pagamento de salários, 13º, férias, e vales transporte e refeição, além de jornadas extenuantes, compõem a rotina dos trabalhadores terceirizados, tanto no setor público como no privado. As empresas desaparecem e não tem de quem cobrar. Há consenso de que apenas o aumento da fiscalização não dá conta das variáveis que precisam ser aprimoradas.
“Temos vários problemas no setor com empresas que fogem sem pagar as verbas trabalhistas. Trouxemos um conjunto de sugestões para regulamentar boas práticas nos serviços terceirizados”, pontuou a assessora da Feeac, Flávia Moura da Silva.
O vice-presidente da Feeac, Cândido da Roza, apresentou um estudo com diagnóstico do segmento que opera com 1.364 empresas ativas no RS no segmento de limpeza, portaria e jardinagem, abrangendo cerca de 70 mil trabalhadoras e trabalhadores diretos e envolvendo 240 mil pessoas entre participantes e impactados.
Menor preço, maior custo
Nas licitações públicas, o critério do menor preço aplicado sem avaliações e normas detalhadas é apontado como um dos grandes problemas, impedindo que empresas qualificadas vençam processos licitatórios. Para mitigar os problemas, empresas e trabalhadores querem os agentes públicos na mesa de negociação.
“Não há um estatuto federal para garantir direitos mínimos e critérios de contratação nas três esferas de governo”, resumiu Adroaldo Costa, da Senergisul. “O grande fraudador é o poder público que é cúmplice de ilegalidades e precisa ser responsabilizado”, completou.
Os representantes reivindicam o acompanhamento de processos licitatórios para evitar problemas, que têm se tornado recorrentes nas gestões públicas, gerando enormes passivos e interrupção na prestação de serviços.
“As inúmeras reclamatórias nas quais o Estado figura como corresponsável, decorrentes de contratos públicos com evidências de dumping social, oneram o custo de execução dos serviços e comprovam a tese de que a simples contratação por menor preço não garante o menor custo de execução dos serviços”, apontou o vice-presidente da Feeac.
Relação cínica
Para a observadora do ITTS, Lúcia Garcia, é urgente aprimorar os critérios de contratação que sejam capazes de responder às necessidades sociais.
“Ao considerar apenas a externalização de responsabilidades e a contenção imediata dos orçamentos governamentais, os administradores públicos encaminham processos de terceirização orientados pelo cinismo, pois já sabem que as planilhas de custos apresentadas pelas empresas que vencem licitações são inexequíveis – sequer cobrem o que elas alegam que gastarão”, analisa.
A especialista em trabalho observa que não há margem para a recompensa econômica empresarial justa pela prestação do serviço, nem para pagar bem os trabalhadores. “Se constitui uma relação cínica que não gera o serviço de qualidade para a cidadania e prejudica os trabalhadores”, completa a economista.
*Com informações da Assessoria de imprensa do ITTS.
Edição: Marcelo Ferreira