É necessária uma política que priorize a participação popular, sobretudo da população periférica
A Gira Negra Gaúcha ao se aproximar do término do ano de 2023, após abordar diferentes assuntos, quer chamar a atenção para a necessidade de radicalizar a participação popular nas instâncias políticas ligadas a área da cultura através de efetivação de ações que garantam maior participação das bases sociais periféricas.
A atual gestão do Paço Municipal vem não por acaso investindo pesado no corte da participação social, tentando enfraquecer organismos sociais de participação autônoma como a Comissão de Cultura, além dos pontos de cultura e ainda os fóruns e plenárias populares. Com isso busca afastar a população das decisões referentes ao destino de recursos advindos da política pública.
Porto Alegre já foi referência internacional quando da implantação do Orçamento Participativo e também da política de Descentralização da Cultura via Administração Popular no final do século XX e anos iniciais do XXI. Ali dentre outras ações houve o fortalecimento do Fumproarte e o surgimento do Festival de Música de Porto Alegre, ação que envolvia as 16 regiões do Orçamento Participativo em eliminatórias sendo que cada vencedor na sua região ia para a finalíssima no Auditório Araújo Viana, ainda gravando uma faixa no CD alusivo. Nesse espaço surgiram ou por ali passaram Xandele, Café Acústico (Leandro Maia, Alexandre Vieira, etc.), Marcelo Kará, Afro Tchê, Kaubi Tavares, Bianca Fachel, Caetano Silveira, Ricardo Pacheco, Bataclã FC, DJ Anderson, etc.
A tentativa de corte na participação popular constitui-se, portanto, em procedimento condenável sendo que a utilização reiterada dessa prática espúria praticada com força nos 4 anos de desgoverno federal, e na sequência quando segue ativa na Capital, tentando desmobilizar mecanismos de participação social nas instâncias decisórias da democracia representativa.
Portanto, é necessária uma política que priorize a participação popular para que possa ser entendida como democracia participativa. Todavia deve-se ter atenção a necessidade de espaços abertos à participação presencial sobretudo da população periférica. Assim pode-se pleitear uma política pública voltada para abarcar experiências culturais periféricas que envolva segmentos historicamente excluídos do acesso à educação e cultura na cidade.
Em oposição a isso, o que presenciamos hoje é a falência de investimentos no tocante a recursos municipais na área da cultura, associada ao sucateamento dos espaços culturais, estágio anterior à privatização.
Relacionado a isso e indo na contramão dos fatos, a gestão municipal na área cultural alardeia "o maior investimento de todos os tempos para a pasta da Cultura". Ao que pode-se corriqueiramente nomear como "fazer graça com chapéu alheio". Na verdade, estão apenas executando recursos do governo federal via Lei Paulo Gustavo e em breve via Lei Aldir Blanc parte 2.
A administração cultural do estado utiliza-se do mesmo artifício sendo necessário olhar para o orçamento do estado e da Capital e ali constatar investimentos irrisórios na área da cultura em termos de recursos financeiros diretos advindos dessas instâncias.
Melodrama ou tragicomédia? Para além do trocadilho com gêneros teatrais, eu que também sou ator de teatro, destaco que a reflexão título dessa coluna a partir da denúncia dessa prática reiterada advinda das administrações culturais da capital e do estado, se faz urgente.
Assim encerramos essa Gira Negra apontando ainda a necessidade imediata de criação de um fundo com participação direta via controle social e que passe necessariamente pela Comissão de Cultura, no caso municipal, a fim de gerir o montante de 2% do orçamento municipal. Tal porcentagem julgamos adequada ser destinada à área cultural em função de sua importância como elemento emancipador das pessoas e capaz de proporcionar efetivamente a participação popular nas ações de governo além de gerar empregos e desenvolvimento econômico.
* André de Jesus, Ator/Ponteiro de Cultura, Locutor, ArteAtivista e Produtor Cultural.
** Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko