Rio Grande do Sul

Coluna

Quem espera nunca alcança

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Jovens palestinas nascidas no Brasil participam de ato em apoio à Palestina - Camila Araujo
É preciso ter consciência do impacto de nossa omissão, em tudo há semeadura e elas trarão colheitas

As imagens da guerra veiculadas esta semana não permitem dúvidas: quando os perseguidos se revoltam, e os poderosos ameaçados com aquilo não encontram limitações ao impulso de mostrar do que são capazes, a possibilidade de construção de um futuro saudável em sociedades amistosas se reduz a pó.

Mais do que triste, chega a ser patético ver comentaristas de TV passando de homens sérios e frases como “são animais e vamos tratá-los como tal”, para festejos do dia das crianças, com mulheres alegres descrevendo bem-sucedidas coletas/distribuições do pouco que basta para alimentar alegrias em espaços onde as dificuldades são maiores do que as nossas. Há mérito nisso, com certeza. É algo que deve ser aplaudido, estimulado, ainda que neste formato, onde não se questiona o fato de que o cuidado com TODAS as crianças jamais deveria ficar restrito a determinadas datas.

No entanto, assim o fazemos ser. E convenhamos, com todos os benefícios que carrega, esta forma de fazer o bem não parece exercer contágios, nem tem o poder ou mesmo o objetivo de contribuir para alteração nas trajetórias de vida impostas àquelas crianças que pouco ou nada têm. Ainda assim, elas brilham a ponto de transferir luz para quem com elas contribua. E todos sabemos que – se apoiadas – aquelas crianças poderiam ser a base de um mundo melhor do que o nosso. Neste sentido é triste perceber que há certa semelhança entre o pouco que conseguimos naqueles esforços para alegrar o dia de crianças que desconhecemos e os resultados de combate à seca, que fazemos poupando a água do banho ao mesmo tempo em que elegemos bancadas de apoio ao agronegócio que a contamina e desperdiça.

Mas enfim, nestes dias de contraste entre o que se oferece para crianças discriminadas pela sorte, pelo sangue, pela cor ou pela geografia (coisas que variam de bombons e balas a bombas e mísseis), resta evidente de que pautarmos nossas vidas pelo mérito de algumas ações já não basta. É preciso ter consciência dos impactos de nossas omissões. Do que elas provocam e a respeito de sobre quem recairão suas consequências. Porque em tudo há semeadura e elas trarão colheitas. Assim como gentileza gera gentileza, o sofrimento acalenta o caos.

E penso nisso, neste dia 12 de outubro de 2023. Avança o sinal do pior, na contradição entre o sorriso das crianças, a passividade da maioria e a fúria desembestada de adultos que comandam a erosão vital deste planeta inviabilizado pelo que estamos aceitando como se fosse um caminho para o desenvolvimento.

Sinais do pior, sim. Afinal, o que pode resultar do massacre que a reação de Israel ao que as grandes mídias chamam de “terrorismo”, desatou, senão o pipocar de tragédias em outro patamar e em todos os locais do planeta?

E o que esperar disso, que virá, senão o recrudescimento do fascismo, com mais violências e mais crianças sendo recrutadas, para o ódio e para o massacre?

Para finalizar, recomendo uma olhada e uma escuta atenta para a clareza, lucidez e a coragem desta que, a meu ver, é a mulher mais necessária que minha terra, o Alegrete, já produziu. Me perdoem as demais companheiras alegretenses, mas sei que hão de entender a importância de um fato simples. Fernanda Melchionna ainda está a meio caminho e já fala por 200 mil gaúchos e sabe-se lá quantos outros brasileiros e brasileiras.

Uma música? Bom Conselho do Chico nos alerta, Quem semeia vento colhe Tempestade. Quem espera, nunca alcança.

* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Katia Marko