Rio Grande do Sul

SÉRIE DE LIVES

Pesquisadores destacam a importância da comunicação de riscos em desastres

Na noite desta quarta-feira (27) foi ao ar o segundo episódio do programa ‘Mudanças Climáticas e Eventos Extremos'

Brasil de Fato | Porto Alegre |
O debate ocorre no momento em que a situação está cada vez mais caótica no Rio Grande do Sul, devido às situações climáticas - Foto: Jorge Leão

Nesta quarta-feira (27), às 19h, foi ao ar o segundo episódio do programa ‘Mudanças Climáticas e Eventos Extremos: Estamos preparados?’, uma produção da rede Brasil de Fato. Com apresentação da jornalista e editora do Brasil de Fato RS Katia Marko e da advogada especialista em desastres e meio ambiente Fernanda Damacena, o programa abordou sobre “Comunicação de riscos em desastres”.

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Os convidados para discutir a temática foram Eloisa Beling Loose, pesquisadora na área de Comunicação e Mudanças Climáticas da Ufrgs; Flávia Aragão, mestre em Defesa e Segurança Civil; e Victor Marchezini, sociólogo e pesquisador no Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden/MCTI).

O debate ocorre no momento em que a situação está cada vez mais caótica no Rio Grande do Sul, devido às situações climáticas. A chuva que vem castigando o estado no mês de setembro segue causando estragos, deixando vários desabrigados e trazendo caos à capital gaúcha devido a alagamentos. A situação no interior do estado também está gravíssima. Um novo ciclone extratropical se formou na costa da região Sul do Brasil na quarta-feira (27), provocando temporais e reforçando a instabilidade do tempo, segundo a MetSul Meteorologia.

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Diante dos acontecimentos, nós precisamos nos preparar para possíveis futuros eventos, para além daqueles que já estão em curso. “É muito importante que a gente discuta a comunicação de riscos e desastres, sobretudo diante do que estamos vivenciando agora”, aponta a pesquisadora Eloisa Beling Loose. “Nós já estamos com um problema instalado que podem decorrer outros riscos associados, um efeito cascata, ou seja, um risco já se tornou um fato concreto que gerou um desastre e estamos vivendo uma série de consequências a respeito disso. Não conseguimos prevenir de todo, estamos mitigando algumas situações com uma série de ações que foram tomadas pela Defesa Civil, pelo Poder Público”, comenta.

Diferenças entre “Comunicação de Crise” e “Comunicação de Riscos em Desastres”

“Nós temos que pensar que temos uma 'comunicação de crise’ é quando já está ocorrendo uma situação emergencial, quando já temos efeitos concretos diante disso e precisamos lidar com essas emergências”, explica a pesquisadora. “Por outro lado, a comunicação de risco seria de algo prévio, quando ainda estamos lutando para prevenir que alguma coisa de fato ocorra. É claro que são processos que se misturam em algum momento, mas é interessante nós identificarmos essas diferenças, pois às vezes apenas lembramos da ‘comunicação de risco’ quando já aconteceu um desastre, quando na verdade deveríamos pensar nisso a longo prazo de maneira prévia.”

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Para a pesquisadora, é crucial levar em conta esses aspectos para se conseguir evitar o máximo possível que essas situações ocorram. “A comunicação de riscos é uma área interdisciplinar que demanda vários estudos, pois é uma área recente. Começamos a ter mais estudos a partir da década de 1980, quando foi observado que muitas informações eram disponibilizadas para a população, informações técnicas com base científica que eram devidamente apuradas, mas não geravam o efeito esperado com o público”, comenta Eloisa. “Precisamos considerar que é um processo de médio e longo prazo, de preferência que seja um processo contínuo, mas que ele seja uma forma de observar essas questões pensando sempre em quais são as vivências, os contextos, as emoções que estão atreladas nas percepções dos públicos que estão diretamente sendo afetados.”

Quem são os responsáveis pelos alertas?

Desde julho de 2011, quando foi criado pelo Decreto Presidencial nº 7.513, o Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais (Cemaden) - órgão vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), adota uma estrutura técnico-científica especializada, desenvolvendo capacidade científica, tecnológica e de inovação para continuamente aperfeiçoar os alertas de desastres naturais. O objetivo principal da Instituição é realizar o monitoramento e emitir alertas de desastres naturais que subsidiem salvaguardar vidas e diminuir a vulnerabilidade social, ambiental e econômica decorrente desses eventos.

“O Cemaden é um órgão que foi criado em razão de uma catástrofe que ocorreu na região serrana do Rio de Janeiro em que mais de mil pessoas faleceram em inundações e deslizamentos, algo que vemos muito no Brasil que é no momento que tem uma catástrofe aparecem os especialistas propondo inúmeras soluções, dentre elas a criação de mais um sistema de alerta”, comenta Victor Marchezini, sociólogo e pesquisador do Cemaden. 

Victor reforça que devemos investir em um bom mapeamento dos sistemas de alerta que já existem e aperfeiçoá-los. “No Brasil não conseguimos avançar na discussão sobre sistemas de alertas e tão pouco sobre como atuar antes para reduzir a chance de ter desastres como este que o Rio Grande do Sul está enfrentando”, aponta. “Os sistemas não estão articulados em um sistema nacional, nós precisamos de parâmetros, tal qual o Sistema Único de Saúde (SUS) ou o Sistema Único de Assistência Social (Suas), para definir protocolos, critérios desses níveis de alerta, principalmente quando você tem bacias hidrográficas  que cobrem mais de um estado”, sugere o pesquisador.

Ainda, afirma que a principal recomendação que hoje é dada aos cidadãos é que procurem uma defesa civil municipal, mas nem todos os municípios possuem tal órgão. “Temos a necessidade de uma cobrança social em relação aos prefeitos e prefeitas para questionar como é o preparo da defesa civil. Na prática, vamos ser bem sinceros, a grande maioria não existe ou ela existe somente no papel e no momento que há uma emergência as primeiras pessoas que vêm responder são os próprios moradores e isso sempre é feito na base do improviso”, comenta.

Comunicação de risco na prática

A Flávia Aragão, mestre em Defesa e Segurança Civil, que atuou como coordenadora da Defesa Civil Municipal de Brumadinho, falou um pouco da sua experiência na prática. “Quando atuei na defesa civil nós enviamos mensagens e informações de riscos via telefone, isso antes das redes sociais, mas surtiram poucos efeitos, pois não compreendíamos a perspectiva dos moradores que recebiam as informações”, comenta. “Começamos a atuar de uma forma mais integrada atuando com outras instituições do município e passamos a fazer uma inserção maior na comunidade. Criamos uma capacitação para os núcleos comunitários, recebíamos o alerta e repassávamos para a comunidade."

Para Flávia, a comunicação de risco não pode ser somente uma informação do perigo, mas sim uma construção de conhecimento sobre fatores que vão trazer significado para essa questão da crise. “Cabe aos comunicadores conhecerem as comunidades, pois cada comunidade vai ter níveis diferentes de atenção, isso vai auxiliar, também, no repasse das informações, porque muitas mensagens muito técnicas para a comunidade podem não surtir efeitos, podem não ser tão compreensíveis, então teremos que fazer uma adaptação”, comenta.

Ainda, citou como exemplo as notas técnicas emitidas pelo Cemaden. “A defesa civil que recebe aquela mensagem, precisa primeiro repassar para os gestores públicos que vão tomar decisões, é um processo de convencimento do risco das situações, não basta apenas repassar, tem que transformar aquela nota técnica em informações pertinentes para aquela comunidade e fazer com que exista uma ação. Essa qualificação é necessária e o mensageiro precisa entender essa importância, principalmente em defesas civis que estão com uma estrutura simples e restritas.”

Os convidados ainda responderam às perguntas enviadas pela audiência. Você pode assistir o programa na íntegra abaixo:

O programa irá ao ar pelo canal do Brasil de Fato RS e Brasil de Fato no Youtube, quinzenalmente, debatendo a cada quarta-feira, às 19h, um novo assunto.


Edição: Katia Marko