Somos todos responsáveis e precisamos combater a desigualdade e seus promotores
Sem dúvida o grande evento da semana é a volta do Brasil ao cenário mundial. Enquanto o ex-my-love dos golpistas se entoca no hospital para escapar de perguntas, seu vice emudece na esteira da tragédia ambiental gaúcha, seus ministros tremem de medo da polícia e os grandes magnatas da tecnologia moderna avisam que se preparam para abandonar o planeta, Lula vai à luta lembrando que não há honra em quem se limita a fugir dos problemas.
Por incrível que pareça, ao afrontar preconceitos consolidados, nosso presidente foi aplaudido sete vezes em discurso histórico que proferiu na 78º Assembleia Geral da ONU e que no futuro – e se ele for escutado pelos povos, haverá futuro – será estudado em todos os idiomas. Lula ainda teve que arrumar espaço na agenda para atender a mais de 50 pedidos de reuniões com lideranças internacionais, e se permitiu ajudar o presidente dos Estados Unidos da América do Norte, oferecendo-lhe apoio que será decisivo para as disputas eleitorais daquele país.
Vejam bem: ainda estamos nos arrastando para a saída do desvario golpista, que desintegrou indústrias, queimou biomas, desmoralizou as instituições públicas, e Lula em meio ano não apenas está reanimando nosso povo como obteve compromissos do presidente dos USA ilustrados em apoio à reestruturação das agências internacionais, do sindicalismo, do combate à fome e ao refreamento da “uberização” generalizada do trabalho humano. E isso não apenas aqui, lá e acolá, mas em todo o planeta.
Sabemos, porque experimentamos na carne a maldade contida naqueles processos de escravização moderna, que alteram normas de convívio e transferem aos populares a solução e o ônus direto de solucionar problemas coletivos que deram base à constituição do próprio Estado. É óbvio, mas estava oculto o fato de que problemas relacionados à Saúde, Educação, Trabalho, Assistência Social, bem como às crises ambientais, não podem ser enfrentados/resolvidos sem o apoio de instituições públicas responsáveis. E também é claro que aquelas instâncias se corrompem sem o acompanhamento da cidadania, que por sua vez tende a desaparecer com a pulverização da voz dos trabalhadores.
A união exige organização e a representação perde rumo e sentido, sem processos de articulação sindical e fortalecimento de mecanismos associativos, setoriais, orientados por projeto de emancipação humana. Por isso, sem cuidados e com desrespeito para com as diferenças/peculiaridades que caracterizam cada grupo e cada nação, vem prevalecendo a lei do mais forte, do mais arrogante, do melhor armado dentre os canalhas.
Verdade, entendemos isso por experiência e ameaças reais. E sabemos da dificuldade e do papel de Lula para a incipiente retomada da ainda instável democracia em nosso país. Mas sabemos a importância de ir além e por isso, foi estimulante e espetacular perceber que Lula recoloca o Brasil em patamar de onde não deveria ter saído e com isso, por altivez e densidade de caráter, obteve de Biden concordância para com sua perspectiva, que alcança a necessidade de reforma na própria ONU. Lula expõem a questão do respeito aos mais fracos, ao trabalho honesto e às diferenças naturais como eixo para a construção de alianças (coisa que todos entendem, porque se aprende em casa), e que ele estende a conceitos tão amplos como a multipolaridade geopolítica e a importante emergência dos BRICS.
Esperamos, a partir disso, que todas as forças não capturadas pelo espírito de Tânatos apoiem reformas, urgentes, em processos de educação e organização coletiva, em âmbito familiar, municipal, regional e internacional. Por quê? Porque acreditamos na força da consciência e da participação popular. Mesmo aqueles que não ajudarem possuem familiares que se beneficiarão da mudança de rumo, que virá com o engajamento popular.
Sem isso, não haverá instância de negociação respeitada, em todos os níveis. Sem isso, na escala global passaremos das pandemias para as guerras e, sob pressão de secas e inundações virão a fome e as invasões desesperadas de migrantes de todo o tipo. A opção neste caso, mantendo o ritmo que estamos presenciando, indica o inevitável avanço de uma espécie de “globalização” ecofascista, onde agregações de grupos de vândalos armados extremamente belicosos, ampliará a violência e todas as formas de discriminação. Fascismo, Xenofobia, Racismo e sabe-se lá que outras doenças psicossociais emergirão do colapso da globalização capitalista que, sob controle dos interesses de mercados predatórios e fundamentalmente extrativistas, nos trouxe ao caos que presenciamos.
Lula alertou a nós e ao mundo quanto a isso.
Em sua síntese: somos todos responsáveis e precisamos combater a desigualdade e seus promotores.
O rompimento que não pode mais ser ocultado, de todas as estruturas apoiadas em direitos humanos e internacionais desmoralizados se prende ao fato de que – com nossa permissão, omissão e apatia – a injustiça já supera os limites do insustentável. Isso foi além e se expressa em formas de desigualdade obscena, que avançam envergonhando o espírito humano e inviabilizando a vida em todas suas formas.
Para sair deste inferno precisamos de lideranças aferradas à reconstrução da civilidade, mirando outros horizontes civilizatórios. E este é o caminho proposto pelo Brasil, que está de volta.
Muito ainda haveria a dizer sobre isso, mas para um resumo resta afirmar que cabe a cada um de nós olhar em volta, e fazer opções. Queremos apoiar bestas golpistas, desqualificadas, corruptas, mentirosas? Estamos percebendo quem se mobiliza em defesa de dimensões que são do interesse coletivo e aceitamos que grupos generosos operem sem nossa ajuda? Ou entendemos que a crise atual é multidimensional, se expressa na dimensão ambiental e exige o envolvimento de todos, em escala global que inicia no pequeno espaço onde cada um de nós apoia os pés, todo o dia, passo a passo?
Como lembrete, o MST já distribuiu mais de 30 mil refeições aos flagelados gaúchos.
Uma música? Que tal esta?
* Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Edição: Katia Marko