O Programa Assistir, lançado em 2021 pelo governo Eduardo Leite (PSDB) e que redistribui recursos aos hospitais que prestam serviço pelo Serviço Único de Saúde (SUS) em todo o RS, foi tema de audiência pública na Assembleia Legislativa do RS, nesta segunda-feira (4). A secretária da Saúde, Arita Bergmann, havia confirmado presença mas desistiu da participação, horas antes do início da audiência, frustrando os prefeitos, vereadores e gestores de hospitais, que estão preocupados com um possível colapso do sistema de Saúde em diferentes municípios.
A audiência foi realizada na Comissão de Saúde, proposta pelos deputados Miguel Rossetto (PT), Adão Pretto Filho (PT) e Neri, o Carteiro (PSDB). Justificando a atividade está a promessa do Programa Assistir de proporcionar acréscimo de recursos em 162 dos 218 hospitais que recebem incentivos. Contudo, o Assistir promoveu cortes orçamentários que levaram os hospitais a um quadro caótico.
:: Brasil vai investir na formação de agentes populares da saúde; previsão é de 8 mil formados em 2024 ::
Como exemplo, o Hospital de Canoas recebia R$ 49 milhões por ano e vai receber somente R$ 6 milhões do governo do estado; o Hospital de Pronto Socorro de Porto Alegre (HPS) recebia R$ 35 milhões e passará a receber R$ 10 milhões; o Hospital Restinga e Extremo Sul perderá quase R$ 10 milhões dos R$ 13 milhões que recebe; o Hospital Materno Infantil Presidente Vargas perderá 50% dos recursos estaduais, caindo de R$ 10 milhões para R$ 5 milhões.
:: Após escândalo em escalas de médicos do Samu no governo Leite, secretaria afasta diretor ::
O município de Montenegro já fechou a traumatologia; Viamão, fechou a maternidade, o setor de saúde mental, a obstetrícia e a traumatologia; Taquara fechou a maternidade. Além da população ficar desassistida, os cortes de recursos na Saúde acabaram sobrecarregando o atendimento no SUS.
Ausência da secretária é criticada
O deputado Miguel Rossetto lamentou a ausência da secretária estadual da Saúde, Arita Bergmann, que pela terceira vez acertou a presença e não compareceu. “A secretária foi convidada, sugeriu as datas e nós nos adaptamos a elas. Infelizmente este respeito recíproco não apareceu e isso é grave”, criticou. Segundo ele, a audiência, dá continuidade a outra realizada em 7 de agosto, na qual a secretária também não esteve presente.
Pepe Vargas lembrou que, na audiência antrior, a secretária não pode participar porque, segundo ela, estaria em uma reunião para justamente discutir o Assistir. De lá para cá, ressalta, a situação dos hospitais ficou ainda mais dramática. Não fosse a PEC da transição, observou, seriam R$ 59 bilhões a menos no orçamento da Saúde. pepe chamou a atenção ainda para o fato de que o estado não cumpre a Lei Complementar que determina que invista 12% da receita corrente líquida em saúde.
“Situação muito difícil”
Para Miguel Rossetto, o decreto que instituiu o Assistir estabeleceu duas questões: primeiro a manutenção de um calendário de adequação dos recursos estaduais à rede hospitalar gaúcha assistida por este programa, que estabelece uma continuidade da redução de recursos para hospitais desassistidos. O segundo tema é a constituição de um Grupo de Trabalho técnico para avaliar os resultados obtidos pelo Assistir.
Rossetto lembrou que a Assembleia está entrando no debate orçamentário para 2024, oportunidade para qualificar esse atendimento para o RS. “Se compararmos os orçamentos executados com variação do IPCA, verificaremos que há uma diferença de orçamento real na ordem de quase R$ 500 milhões. Ou seja, se pegarmos como referência o que o estado executou em 2014 e o que está executando em 2023, verificaremos uma defasagem de quase R$ 500 milhões”, afirmou. O deputado disse ainda que considerando os aumentos dos custos hospitalares o déficit chega a R$ 2,3 bilhões.
Pretto cobrou a responsabilidade das autoridades do Executivo. “O que está nas mãos do governador é o sangue da população gaúcha”, denunciou. “Eu escutei de alguns prefeitos, que só não estão aqui hoje porque são da base do governo, que eles também estão extremamente descontentes com a situação. Eu me somo aqui aos diretores dos hospitais, que estão numa situação muito difícil, com as instituições. Nós vamos pressionar o governo, de maneira muito responsável, para rever o Programa Assistir”.
Na avaliação da deputada Stela Farias, o programa não é transparente e tem critérios subjetivos, além de ter retirado recursos de hospitais da região Metropolitana que atendem média e alta complexidade e cobre quase 40% do total da população gaúcha. "Os prefeitos não foram ouvidos. O Assistir não deu certo, ele piorou e retirou o atendimento”, afirmou.
Posição da Secretaria da Saúde
A diretora técnica da Secretaria Estadual de Saúde, Lisiane Fagundes, apresentou dados técnicos para justificar os pontos levantados. Argumentou que a mudança nos repasses foi motivada pela falta de transparência na forma de distribuição de recursos, ausência de critérios técnicos para a definição de incentivos, dificuldade de monitoramento da aplicação do recurso aportado, falta de equidade na distribuição de recursos e hospitais incentivados com a entrega de serviços aquém da remuneração.
Segundo ela, 48,54% dos recursos estaduais eram repassados a 7,66% dos hospitais que atendem o SUS. “Temos hoje 301 hospitais. Os recursos estavam alocados em 21 hospitais, muitos da região Metropolitana (de Porto Alegre)”. A metodologia do Assistir, segundo a diretora, está embasada no “tipo de serviço, na unidade de incentivo hospitalar, no peso e na unidade de referência”, o que permitiria a atualização a qualquer momento.
Prefeitos cobram auditoria e diálogo
O prefeito de Canoas, Jairo Jorge (PSD), lembrou que até 2009 os gestores municipais da região Metropolitana compravam ambulâncias e mandavam os pacientes para Porto Alegre. Somente depois que o então governador Tarso Genro e o secretário da Saúde, Ciro Simoni, criaram uma rede de proteção na região, abriram leitos, com transparência e com compromisso de uma política de Estado, o problema se resolveu.
Jairo Jorge questionou o corte orçamentário que segundo ele vai fechar o Hospital Universitário e o Hospital de Pronto-Socorro de Canoas. O prefeito de Canoas cobrou auditoria nos números do Programa Assistir.
O prefeito de Nova Santa Rita, Rodrigo Batistella (PT), contou que o município não possui estrutura própria de Saúde e é atendido por Porto Alegre e Montenegro. Desde 2021, segundo o prefeito, a Associação dos Municípios da Região Metropolitana de Porto Alegre (Grampal) vem tentado discutir os critérios técnicos, as perdas e readequações do Programa Assistir. Para ele não foram considerados os contratos que já existiam.
Batistella pediu a suspensão da retirada de valores dos hospitais da região Metropolitana. O prefeito criticou a falta de diálogo com os representantes da Secretaria Estadual da Saúde.
Qualificação do serviço hospitalar
O deputado Miguel Rossetto, nos encaminhamentos da audiência pública, cobrou a constituição do Grupo de Trabalho para qualificar o sistema de saúde hospitalar na região Metropolitana, que já está previsto há mais de dois meses e não se efetivou. “Nós estamos aqui defendendo todos os instrumentos de qualificação de oferta de um sistema de serviço hospitalar para todo o povo gaúcho.”
Rossetto defendeu ainda que a Assembleia Legislativa não assine o Plano Plurianual, diante da redução dos recursos estaduais para o sistema hospitalar do Rio Grande do Sul. “Nós estamos falando em R$ 500 milhões/ano de recursos do estado do RS estão sendo retirados. Será que somente com a eficiência desses recursos reduzidos, nós atenderemos a demanda da população gaúcha?”, questionou.
* Com informações da Bancada do PT na ALRS
Edição: Marcelo Ferreira